quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Escravatura e Descobrimentos: prioridades e proporções

O debate sobre a escravatura e os Descobrimentos portugueses voltou a ganhar destaque. O texto de João Gouveia Monteiro no Observador (*) lembra uma evidência que, paradoxalmente, muitos preferem esquecer: tanto a escravatura como a epopeia marítima fazem parte da nossa História. A questão não é a de apagar ou esconder um dos lados, mas sim a de manter a devida proporção e sentido histórico.
A ideologia woke tem insistido em transformar a escravatura na chave interpretativa total da nossa memória coletiva, obscurecendo os Descobrimentos e reduzindo-os a uma “matança”. Tal postura revela ignorância histórica e um presentismo moralista, incapaz de compreender contextos e de aplicar a regra básica da comparação histórica.
Portugal teve, sim, um papel decisivo no tráfico transatlântico de escravos, mas esse capítulo não resume, nem pode simbolizar, o conjunto da expansão ultramarina. O génio náutico, científico e cultural dos Descobrimentos foi muito mais vasto e tem um peso incomparável na história mundial. Para um historiador, a escravatura é um tema sério de investigação; mas para a memória coletiva de um povo, não pode sobrepor-se à epopeia marítima que ligou os continentes e mudou o mundo.

A História deve ser estudada com rigor e sem emotivismos desproporcionados. A escravatura merece registo, lembrança e crítica, mas não pode, nem deve, esmagar o papel civilizacional e universalista que Portugal desempenhou nos séculos XV e XVI. É essa medida que nos permite evitar o exagero militante e respeitar a complexidade da nossa memória histórica.
(* (https://observador.pt/opiniao/os-emotivos-em-lagos-ou-em-qualquer-outra-parte/))