terça-feira, 15 de setembro de 2015

O PS tem um problema com os media

depois queixem-se…
Para o Partido Socialista, debater é “atacar”. Debater é “maltratar”. Debater é “provocar”.
Quem o diz é Ascenso Simões: ao ser confrontado com a possibilidade de o regressado Prós & Contras vir a debater a questão da partidarização da justiça, o ex-director da campanha de António Costa afirmou que, se a RTP não mudasse o tema programado para a noite de ontem, ele seria obrigado a concluir que “a RTP fez uma opção partidária, que nestas eleições optou por atacar o PS, maltratar os seus militantes e provocar os seus votantes”.
Não foi o único. 
João Galamba: “O director de informação da RTP, Paulo Dentinho, só tem uma alternativa: demitir-se.”
José Lello: “A RTP está ao serviço da campanha do PSD/CDS.”
Edite Estrela: “É uma piada de mau gosto.”
Isabel Moreira: “A RTP é prostituída e o director de informação vai continuar em funções?”
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Este coro de antigos e actuais socráticos não fala assim por acaso: é precisamente este o género de relacionamento com a comunicação social que foram cultivando ao longo dos anos, e só temos de lhes agradecer por fazerem o favor de nos lembrar disso em véspera de eleições.
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O próprio António Costa já demonstrou em mais do que uma ocasião que convive mal com um certo tipo de
perguntas. Ainda na semana passada, ao ser entrevistado na RTP por Vítor Gonçalves, Costa teve uma atitude indescritível, tendo em conta o passado recente do PS, e dele próprio, nesta matéria. Confrontado com uma pergunta incisiva, inteligente e perfeitamente razoável – “dê-me dois ou três exemplos de diferenças substanciais entre a proposta política do PS em 2015 e a do PS em 2011” –, Costa respondeu a Vítor Gonçalves: “Eu estou a perceber que está aqui um bocado como porta-voz do Dr. Passos Coelho.”
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Talvez não fosse má ideia o PS incluir John Stuart Mill e o clássico On Liberty no currículo das suas universidades de Verão: silenciar uma opinião constitui um roubo à humanidade.

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O Prós & Contras limitou-se a propor à discussão uma questão levantada por Paulo Rangel. O medo que tantos socialistas revelam em debatê-la é, só por si, sintomático da consciência pesada que o PS tem no domínio da partidarização da justiça. Só mesmo isso pode explicar que se confunda um debate, onde haverá várias opiniões
em confronto, com um ataque ao PS e um frete ao Governo.

ps: vai um longo tempo em que, leccionando Ciência Politica num Curso de Comunicação Social, indiquei na “bibliografia” o On Lyberty and Other Writings de John Stuart Mill.
Confesso que na altura tive receio que os discentes o achassem desactualizado (1859).
É bom saber que alguns ainda se lembram.
(o titulo da versão portuguesa “A Liberdade” é uma estúpida tradução livre de “On Liberty” – Na Liberdade.)

já com 50 anos! E agora...

à laia de resumo para criar o apetite de o ler na integra:

«Até hoje, em todas as reformas que foram feitas, o princípio foi não tocar nas reformas em pagamento. Nos anos da troika o Governo tentou fazê-lo, mas o Tribunal Constitucional nunca deixou. Como vai ser no futuro?

Só a título quase anedótico e para que entendamos o que nos prometem certos políticos. Em 2001, o ministro de então, Paulo Pedroso, escrevia no Público que “com estas medidas e usando o Fundo de Reserva, não haverá défice do subsistema previdencial antes de 2035 – quando em 1998 se previa que ele ocorresse em 2013”. Em 2007 o seu colega de partido Vieira da Silva fez nova reforma, esta sim mais a sério, e mesmo assim o défice em 2013 do sistema previdencial foi de 1,4 mil milhões de euros…

“a reforma Vieira da Silva, uma reforma do PS, já prevê o aumento gradual da idade da reforma em função da evolução da esperança de vida, e esta continua a subir. A não existir uma hecatombe nos sistemas de saúde, lá para 2035 a esperança de vida dos portugueses já não deverá andar longe da que, automaticamente e via “factorde sustentabilidade”, colocará a idade da reforma muito perto 70 anos.”

“consequência de uma reforma socialista, a de Paulo Pedroso em 2001, confirmada em 2007 quando se reformar, a sua reforma será proporcionalmente menor do que a que hoje recebem os que se estão a reformar ou já se reformaram.”

Medina Carreira afirmou que o debate público sobre as pensões "é uma trafulhice" uma vez que ninguém explica aos pensionistas atuais e futuros o que vai acontecer e que é ainda importante saber “o que é que este governo pensa e o que é que o PS pensa” sobre o sistema.
“O PS diz que vai manter as pensões em pagamento. Eu não sei o que é isto”, afirmou Medina Carreira, acrescentando que o objetivo do programa programa dos socialistas é "convencer os portugueses de que isto é assim porque mais do que isso não é possível neste momento".»


É neste quadro geral que devíamos estar a discutir o “plafonamento horizontal” proposto pela coligação e o dito “plafonamento vertical” proposto pelo PS. Ambos retirariam dinheiro ao sistema previdencial no curto prazo, se bem que de forma diferente, sendo que ambos prometem devolvê-lo mais tarde. Por isso estas propostas exigem uma análise prudente e não a demagogia que tem dominado o debate público. (por José Manuel Fernandes, 58 anos, no Observador)

sábado, 12 de setembro de 2015

a figura central...

Dia 4 de Outubro, os líderes partidários que vão a votos são Passos Coelho e António Costa mas a figura central é Sócrates.
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José Sócrates aplaudiu euforicamente o desempenho do seu ex-número 2 António Costa e teve boas razões para isso. Costa não só não se distanciou claramente das políticas do Governo socialista que colocou Portugal no limiar da bancarrota como foi ao ponto de “acusar” Passos Coelho de ter chamado a troika, esquecendo que foi precisamente o Governo de José Sócrates quem a chamou a 6 de Abril de 2011, depois de o ministro das Finanças Teixeira dos Santos ter assumido que o Estado português estava prestes a entrar numa situação de ruptura de tesouraria, ficando sem dinheiro para pagar salários e pensões.
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Sócrates é, por direito e vontade própria, a figura central das próximas eleições legislativas. Como reconheceu a insuspeita Fernanda Câncio num lúcido artigo: “Não há, pois, volta a dar: Sócrates está no centro da campanha. Porque os media querem, porque a coligação quer e, como a revelação, ontem, de uma foto no interior da casa tornou inegável, ele quer.”
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Sócrates tem razões para estar agradado com o desempenho de Costa. A agressividade permanente de Costa na entrevista fez lembrar o “animal feroz”, tendo-se aliás mantido na entrevista conduzida por Vítor Gonçalves, com o líder do PS a procurar sistematicamente intimidar o jornalista da RTP, em linha com o estilo de Sócrates.
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Se, dia 4 de Outubro, António Costa ganhar, será dado um importante passo para a reabilitação política de Sócrates. E, se Costa perder, Sócrates terá, ainda assim, uma palavra a dizer no futuro do partido.

Uma coisa é certa: as notícias sobre a morte política de Sócrates foram manifestamente exageradas. (base artigo de opinão de André Azevedo Alves no Observador )

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

foi o PSD quem chamou a troika!

Isaiah Berlin, inspirado por um velho adágio grego, dividiu um dia os intelectuais em ouriços e raposas: a raposa sabe muitas pequenas coisas, mas o ouriço sabe uma grande coisa. Passos sabe uma grande coisa, Costa sabe muitas pequenas coisas. Uma das questões para os portugueses é saber se, neste momento, lhes convém mais um ouriço ou uma raposa..

Na manhã seguinte, porém, a vitória já não parecia tão clara. Como as flores de certas plantas raras, não durou uma noite.
Ganhar um debate, para quem precisa de ganhar de qualquer maneira, não é complicado: basta fazer o indispensável para que a claque se sinta à vontade ao clamar vitória. Há um truque: estar sempre ao ataque, disparar sobre tudo, não parar de chutar à baliza. Nem é preciso acertar: basta mostrar agitação. Foi o que Costa fez, aproveitando, aliás, a previsível opção de Passos pela impassibilidade do estadista. 
Entretanto, o país, pela voz dos seus comentadores, declarava-se pouco “esclarecido”. O facto é que a situação do país é tal que uma hora de debate nunca seria suficiente para o “esclarecer”.

Em 2011, pouca gente acreditara na viabilidade do ajustamento. O sucesso, até por inesperado, impressionou: fez o PSD e também o CDS aceitarem a “missão” de Passos. Hoje, os anti-passistas da direita estão isolados, ou em trânsito para o PS. Passos pode permitir-se ficar no mesmo sítio, sem variar os temas nem levantar a voz.
António Costa vive outra vida… A sua expectativa, o ano passado, era ser acolhido consensualmente. Não o foi. Viu-se forçado a andar pelos mais variados caminhos e atalhos. Aproximou-se e afastou-se do Syriza. Arranjou Nóvoa, mas também Centeno. Grita contra a “austeridade”, mas quer parecer responsável. Precisa de se distanciar de Sócrates, mas não o pode renegar. 

O debate desta semana confrontou assim duas maneiras de ser. De um lado, Passos Coelho, mais ou menos rígido e solene, avesso a aventuras, preocupado em lembrar o que lhe parece essencial, com muitas explicações, embora por vezes sem eloquência nem rasgo, como durante a segunda parte do debate. Do outro lado, António Costa, cheio de artes e de artimanhas, desesperado, e portanto disposto a tudo, mas frequentemente sem critério, como durante a primeira parte do debate, em que não evitou o ridículo (“foi o PSD quem chamou a troika!”). (baseado no texto de Rui Ramos no Observador )
http://observador.pt/opiniao/passos-e-costa-o-ourico-e-a-raposa/

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

análises ao debate Passos-Costa

O que realmente foi substantivo neste debate foi a frase de Costa para Passos: “Porque não vai lá a casa debater com Sócrates?” Nesse momento, no Bairro dos Actores, percebeu-se, e no Largo do Rato também, que Costa não só deixou cair Sócrates como não está disposto a perder um voto que seja por causa do antigo líder socialista. (Helena Matos)
António Costa tinha de ganhar. Mas Costa, como certos artistas, não gosta de facilidades. Por isso, tornou as coisas ainda mais difíceis para si próprio, ao começar com a negação de uma série de evidências: qualquer governo teria feito crescer a riqueza sob o programa de ajustamento; foi o PSD quem chamou a troika; para viabilizar a segurança social, basta manter as contribuições. Passos foi, como sempre, muito explicativo e não falou do que iria fazer, mas pôde desmontar quase tudo: o decréscimo de riqueza em Portugal foi menor do que em outros países sujeitos a ajustamento; foi o PS quem chamou a troika, porque o país não tinha financiamento, e por isso também o PS, até 2011, cortou salários e aumentou impostos; até o PS admite diversificar as fontes de financiamento da segurança social. (Rui Ramos)
A que partido é que este debate equivalente serviu mais? Passos Coelho tinha de ser claramente destronado, e não foi. Mas Costa foi tão credível como o Primeiro-Ministro, mostrando-se à altura do chefe de governo em todos os dossiers. (Marina Costa Lobo)
Santo Deus, o que terá passado pela fervilhante cabeça de António Costa? Não sei se o ouviram: troika, troika, troika; e mais troika, troika, troika; e ainda, para quem tivesse abandonado a sala por minutos para voltar a encher a chávena com café, troika. Quem suspirou pela troika? Pedro Passos Coelho. Quem negociou com a troika? Pedro Passos Coelho. Quem teve vontade de ir ao Bairro Alto tomar um copo com a troika? Pedro Passos Coelho.
Já perto do final do debate, o líder do PS ficou tão incomodado com as referências ao seu “ante-antecessor” (peço desculpa, a palavra, se é que se pode chamá-la assim, não é minha) que perguntou a Passos Coelho, com comovente indignação: “Porque é que não vai lá a casa debater com José Sócrates?”. A resposta a essa angustiante pergunta seria simples: porque, graças ao próprio António Costa, não é preciso. (Miguel Pinheiro)
António Costa falou bastante menos (cerca de 4 minutos menos), mas pareceu ter falado bastante mais. Melhor indicador não é possível. Hoje as hostes socialistas terão uma noite de alegria. As hostes da PàF devem estar a pensar que mais valia Passos Coelho ter ido debater com Catarina Martins, guardando Paulo Portas para este debate decisivo. Como representante da esquerda, elegi o canal público. Se vos parecer que viram o debate diferente do meu é porque, provavelmente, viram o debate num canal privado. (Luis Aguiar Conraria)
Na forma António Costa esteve melhor. Teve a iniciativa, foi mais eficaz no discurso e procurou, dentro do possível, reagir ao passado que o ligava ao anterior Governo do PS.
No conteúdo, mais equilibrado porque Passos conseguiu transmitir as principais mensagens que levava de forma mais acutilante. Associar Costa a um regresso ao passado, relembrar a incerteza e a posição do PS face à Grécia e colar à campanha do PS muitas promessas populistas de que as pessoas já não acreditam. (Luís Bernardo)

domingo, 6 de setembro de 2015

brinquedos para as crianças mimadas...

As causas estão para os enfastiados europeus como os brinquedos para as crianças mimadas. Depressa mandarão os refugiados sírios para o baú onde estão o leão Cecil mais as primaveras árabes.
Temo sinceramente que à primeira desilusão com os ditos refugiados logo eles sejam esquecidos como todos os outros objectos da nossa solidariedade nos últimos anos.
A experiência portuguesa ensina várias coisas. Escolhi três. A primeira delas é que o pior que pode acontecer a um povo é que o seu país desista dele ou que ele desista do seu país. A segunda é que o sucesso da integração é tanto maior quanto menos paternalista for o acolhimento. O terceiro ensinamento ganhei-o não a investigar o fenómeno dos retornados, mas sim a ver, ouvir e ler noticiários: vivemos de arrebatamento em arrebatamento e cada arrebatamento tem de ser mais arrebatado para compensar a anterior desilusão. Iniciámos o ano com o Syriza e a crise humanitária grega, depois veio o Varoufakis a dobrar a espinha à Merkel e a Catarina Martins aos pulinhos em Atenas (que as sibilas nos perdoem!). Abriam-se contas para financiar a Grécia (em troca podiam mandar-nos queijo e azeitonas ou uma fotografia assinada pelo Tsipras). E até houve quem marcasse férias na Grécia para ajudar a causa alternativa. Agora os gregos estão ainda mais pobres, vai haver novamente eleições, ninguém quer saber da Grécia para nada e a Catarina Martins já não pula, pelo menos em Atenas. Agora só se pensa, fala e sente o drama dos refugiados.
Dentro de pouco tempo os refugiados sírios serão substituídos por outros protagonistas e depois bem podem permanecer acantonados num qualquer canto da Hungria que ninguém se interessará pelo seu destino.
Claro que no terreno ficarão as associações, os conselhos disto e daquilo, mais os mediadores que constituem o mundo do chamado apoio.
A presente crise dos refugiados para lá de evidenciar a degradação da vida nos seus países de origem coloca-nos face a um dos mitos do nosso tempo: a de que no Ocidente podíamos substituir as intervenções militares por intervenções humanitárias. Não podemos. Entre outras razões porque nos desumanizamos. Aliás não tardará que, se o fluxo de refugiados se mantiver nos actuais níveis, passemos todos a imitar a Hungria.
A ilusão de que podíamos viver rodeados de turbulentos vizinhos a quem nos momentos difíceis oferecemos medicamentos e provisões é falsa e perigosa. Ou temos força suficiente para participar no esforço de estabilização desses países – e isso não se faz com drones mas sim com exércitos –, ou acabamos a pôr tropas a perseguir os refugiados. É apenas uma questão de tempo.
( por Helena Matos no Observador)