segunda-feira, 6 de outubro de 2025

É tempo de dar músculo real às autarquias..

(assim "pensa" a Inteligência Artificial)
Incêndios: 
centralismo caro, prevenção pobre.
Gastamos fortunas em meios de combate cada vez mais incapazes de travar fogos que se tornaram quase incombustíveis ao bom senso. Ao mesmo tempo, adiamos — ano após ano — as medidas de prevenção estrutural e a devolução de competências reais às autarquias, únicas entidades com proximidade, legitimidade e memória do território. Em 2025, a factura fala por si: Portugal já ultrapassou os 222 mil hectares ardidos — a maior percentagem de território queimado na UE — e isto depois de, em poucos dias, terem sido devorados mais de 60 mil hectares. SIC Notícias+1RTP
Um diagnóstico sem eufemismos
Quando um autarca experiente como Pedro Santana Lopes fala em “falência do Estado” na organização e no comando, apontando a durabilidade e descoordenação como traços desta época de fogos, a crítica não é um mero soundbite: é a confirmação de um modelo centralista que dispersa responsabilidades e dilui a execução. Now Canal
Não é de hoje que Santana Lopes defende responsabilização e meios ao nível municipal — incluindo obrigar proprietários a limpar e prevenir —, uma linha de coerência com mais de uma década. E no terreno, como autarca, tem estado a acompanhar limpezas e prevenção em freguesias do concelho. O problema é que o quadro legal continua a transferir “tarefas”, mas nem sempre competências plenas e recursos estáveis. Jornal de Notícias Central Press
O labirinto legal: muita norma, pouca autonomia
Sim, existe hoje o SGIFR (Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais), há PMDFCI (Planos Municipais de Defesa da Floresta) e uma teia de regras sobre gestão de combustível, faixas, queimadas e autorizações. Mas a coordenação estratégica continua demasiado verticalizada (ICNF/AGIF), enquanto os municípios, que conhecem os proprietários e as servidões, ficam com a ponta da execução e com orçamentos oscilantes. Resultado: planeia-se no topo; apaga-se em baixo; previne-se pouco. Diário da RepúblicaI
Mesmo no domínio da protecção civil municipal — onde o Estado anunciou descentralização — a realidade no terreno é desigual: falta gente qualificada, equipas permanentes, mecanização e dinheiro plurianual. Transferências sem musculatura financeira tornam-se, na prática, mandatos impossíveis. Diário da República PGD Lisboa
O que fazer: oito decisões com dono e relógio
1 Cheque-Prevenção Municipal: financiamento per capita florestal (€/hectare de área de risco) directo às câmaras, plurianual, protegido de cativações, para equipas próprias de gestão de combustível, aceiros, mosaicos e caminhos florestais. Prioridade ao perímetro dos aglomerados e às interfaces urbano-rural. ICNF
Mosaicos obrigatórios, com comando local: tornar vinculativa a execução de mosaicos de gestão de combustível à volta de aldeias e infra-estruturas críticas, com ICNF a coordenar a rede primária e municípios a dominarem a rede secundária e a última milha. ICNF+1
Terras sem dono, risco com dono: processo simplificado para intervenção municipal em parcelas abandonadas ou sem proprietário identificado, com recuperação de custos via taxa de risco sobre o prédio (e leilão subsequente se houver reincidência). Este é um dossiê jurídico adiado que agrava todos os fogos. Ordem dos Advogados
Autorizações de queimada com critério e fiscalização: manter a regra de autorização municipal/freguesia, mas com janelas meteorológicas padronizadas e equipas de vigilância local dedicadas na época crítica. Falha? Coima efectiva e suspensão de autorizações nessa campanha. Agroportal
Brigadas municipais permanentes (12 meses): menos “sazonalidade de Verão”, mais equipa todo-o-ano para limpeza, arborização resistente, gestão de linhas de água e manutenção de rede viária florestal. O PRR e fundos climáticos devem privilegiar capex/opex local em vez de gadgets de combate. Diário Imobiliário
Seguros e energia: prémios e tarifas pró-prevenção: prémios de seguro rural bonificados para freguesias que cumpram 90% do PMDFCI; penalização nas faltas. Nos territórios de alto risco, uma fracção das receitas energéticas (produção eólica/hídrica local) afecta a um Fundo Municipal de Prevenção. ICNF
Comando único local na primeira hora: clarificar por lei que, na fase inicial, o Comandante Operacional Municipal lidera a resposta em solo municipal, com passagens de comando cronometradas conforme níveis de gravidade — e com dever de informação para o presidente de câmara. Diário da República
Transparência radical: painéis públicos diários por concelho com execução do PMDFCI (km de faixas limpas, hectares tratados, contra-fogo autorizado), causas apuradas e sanções aplicadas. Se o país soube, a meio de Agosto, que já ardia “como não se via” desde 2017, também pode saber quem cumpriu e quem falhou em cada concelho. SIC Notícias
Conclusão
Não há milagre aéreo que substitua gestão do combustível no chão. Enquanto o Estado continuar a centralizar o planeamento e a derivar a execução para quem tem menos meios, repetiremos o ritual: sirenes, heróis exaustos, balanços e promessas. O país precisa de autarquias com comando, carteira e lei — e de um Governo que lhes entregue, sem medo, as chaves da prevenção. Como alertou Santana Lopes, o que está em causa já não é apenas o combate aos fogos: é a capacidade do Estado de responder ao mínimo que os cidadãos têm direito. Com donos e com relógio. Now Canal

Notas e referências essenciais
1 2025, ano negro: 222.210 ha ardidos até 20 de Agosto; Portugal com a maior percentagem de território ardido na UE. SIC NotíciasRTP
2 “Falência do Estado”: declaração de Pedro Santana Lopes (18 de Agosto, NOW). Now Canal
3 Quadro legal: SGIFR (DL 82/2021) e PMDFCI (ICNF); descentralização de protecção civil municipal (DL 44/2019). Diário da República
4 Queimadas e autorizações: enquadramento prático com autorização municipal/freguesia. Agroportal