sexta-feira, 31 de outubro de 2025
E agora, que vai ser de nós sem os bárbaros?
O poema “À Espera dos Bárbaros”, de Konstantínos Kaváfis, descreve uma cidade que suspende a vida enquanto aguarda a chegada dos invasores. Os senadores vestem as melhores togas, o imperador aguarda ansioso, os oradores preparam discursos de boas-vindas. Mas, ao cair da noite, os bárbaros não aparecem. E a cidade, sem saber o que fazer, pergunta:
“E agora, que vai ser de nós sem os bárbaros?
Essa gente era uma espécie de solução.”
Portugal parece hoje viver esse mesmo dilema — mas os “bárbaros” chamam-se Ventura.
Como escreve Rui Ramos, a oligarquia política precisa dele: precisa de um “inimigo” que justifique o vazio das suas ideias, a sua falta de coragem e de sentido de realidade. Ventura fala de imigração, insegurança, justiça, mérito — e os outros respondem com histeria moral e antifascismo de papelão.
A cena repete-se: Ventura lança uma provocação, e logo desfilam Marques Mendes e Gouveia e Melo em coreografias de indignação televisiva, tentando parecer os guardiões da democracia. Mas o resultado é o oposto — revelam apenas medo e ausência de proposta.
O país real já percebeu: Ventura fala dos problemas, os outros fingem que eles não existem. É por isso que ele cresce e eles encolhem. Porque o eleitor comum não vive em seminários de ética republicana nem em colunas de opinião — vive num país inseguro, caro e injusto.
E talvez um dia, quando o regime se der conta de que a sua sobrevivência depende de o ter para insultar, se ouça de novo a velha pergunta de Kaváfis, agora mais portuguesa do que nunca:
“E agora, que vai ser de nós sem os bárbaros?”
(Notas:
Rui Ramos, “A oligarquia precisa de três Venturas?”, Observador, 31.10.2025; Konstantínos Kaváfis, “À Espera dos Bárbaros”, 1904.)
quinta-feira, 30 de outubro de 2025
Isto não é Alcobaça, nem Alvalade, nem Algueirão...
O artigo publicado no Observador — intitulado “Isto não é o Bangladesh” — é um exemplo cristalino desse desvio: sob a aparência de comentário político, assume a forma de panfleto moral, dirigido contra um candidato à Presidência da República que, por acaso, é também o líder da oposição parlamentar¹.
A autora do texto, travestida de observadora imparcial, não comenta: adverte, julga, sentencia. Classifica André Ventura de “antissistema”, insinuando ser “antidemocrático”. Mas quem define o “sistema”? E, sobretudo, quem lhe deu o poder de o delimitar?
Verdade e aparência
O ensaio filosófico “Verdade e Existência: uma defesa do aspecto objectivo”² sustenta que a verdade não é produto de gosto ou simpatia, mas correspondência entre o que é dito e o que é — entre o juízo e o real.
Quando o jornalismo abdica deste “aspecto objectivo” e se converte em comentário de simpatia ideológica, deixa de ser veículo de conhecimento e torna-se instrumento de propaganda.
Não é a opinião que ameaça a democracia — é a pretensão de impor uma só opinião como “verdade”.
Jornalista ou activista?
Convém lembrar: o jornalista informa, o comentador opina. O problema surge quando o comentador pretende ser jornalista e o jornalista se comporta como activista.
A crítica política é legítima, mas a militância mascarada de reportagem é desonesta.
O artigo que atacou Ventura não visa esclarecer o leitor; visa moldar-lhe a percepção, qualificando um candidato de “perigo” para a democracia e, implicitamente, apoiando os outros — os “seguros”, os “aceitáveis”, os que não incomodam o regime mediático.
Trata-se, pois, de jornalismo militante, e esse é o mais perigoso, porque nega a liberdade que finge defender.
A força do discurso e o medo da verdade
Ventura fala alto, é certo. Fala claro, o que é raro. Mas falar alto não é crime; é parte essencial da liberdade política.
A democracia que teme a palavra vigorosa está doente: quer cidadãos dóceis, políticos domesticados, imprensa uníssona.
A liberdade de expressão não existe para proteger as ideias consensuais — existe para proteger as ideias incómodas.
O ataque mediático a Ventura é, no fundo, um sintoma: o sistema teme o espelho que o devolve à sua própria contradição.
E quando a imprensa tenta silenciar um político chamando-lhe “antissistema”, o que confessa é medo — medo de perder o monopólio da narrativa.
Isto não é Alcobaça, nem Alvalade, nem Algueirão
“Isto não é Alcobaça” — nem um feudo mediático, nem uma república de censores.
É Portugal, onde a palavra ainda é livre, mesmo quando fere sensibilidades delicadas.
O artigo do Observador não é jornalismo; é activismo com assinatura.
E a liberdade de expressão que Ventura reivindica, em nome próprio, é a mesma que permite à sua autora escrever o que escreveu — embora sem lhe reconhecer o mesmo direito de resposta.
Defender Ventura, neste caso, é defender um princípio:
que ninguém, nem jornalistas nem partidos, se arrogue o poder de decidir quem pode ou não falar em nome do povo.
A verdade — como a existência — não se curva perante conveniências mediáticas e
A liberdade de expressão é objectiva, não condicional.
E o dia em que o discurso político for policiado por colunistas, será o dia em que a democracia deixará de o ser.
Em nome da verdade, e da liberdade de a dizer, afirmemos sem medo:
Isto não é Alcobaça, nem Alvalade, nem Algueirão
Notas de rodapé
-Ver artigo original no Observador, “Isto não é o Bangladesh — um artigo anti-Ventura disfarçado de comentário político”, disponível em cdeitado.blogspot.com.
-José Costa-Deitado, Verdade e Existência: uma defesa do aspecto objectivo, estudo filosófico guardado nos arquivos ReVisões, Outubro de 2024.
a morte da inocência!
Acima de tudo, e de todos, agradeço ao comentador Jorge Fernandes que mais que decretar a “morte do PS” parece ter promulgado o fim do estado de graça do Partido Socialista, quiçá abriu o caminho para a sua minimização no espectro politico nacional.
“Isto não é o Bangladesh.”, um artigo anti CHEGA da Inês André Figueiredo
A frase tem ecoado nas redes sociais nos últimos meses e tornou-se uma arma de marketing político da campanha eleitoral de André Ventura. O presidente do Chega colocou cartazes gigantes com o slogan e tem apostado tudo numa linguagem mais radical nos últimos dias. Objetivos: distanciar-se dos “candidatos do sistema”, centrar a corrida presidencial nele próprio e, não menos importante, vincar as diferenças em relação a Henrique Gouveia e Melo — que pode estar a conseguir seduzir alguns simpatizantes e eleitores do Chega.
Depois de umas eleições autárquicas em que o partido ficou aquém dos objetivos definidos pelo próprio líder do Chega, André Ventura vira agora a agulha para as presidenciais com discurso mais forte e agressivo. Num momento em que a imigração é o centro da discussão política em Portugal, o candidato a Belém entendeu que era preciso mostrar que é o único verdadeiramente capaz de “extremar posições“, dizem ao Observador fontes próximas de André Ventura.
O líder do Chega está especialmente atento a Henrique Gouveia e Melo. As mesmas fontes insistem que é preciso aproveitar a moderação com que Gouveia e Melo se tem apresentado a jogo para tentar provar que Ventura é mesmo o único candidato antissistema — o único capaz de combater contra o “politicamente correto” que todos os outros “candidatos do sistema adotam”, incluindo o almirante.
Gouveia e Melo e Ventura: um duelo particular
Nem de propósito, André Ventura foi particularmente violento no ataque que fez a Gouveia e Melo. “Aqueles que querem ser Presidentes da República não podem achar que um imigrante ao fim de 10 anos é igual a um português, nem podem dizer que Mário Soares é a sua referência. Mário Soares foi um traidor a este país e a direita portuguesa sabe que Mário Soares foi um traidor a este país”, acusou o líder do Chega.
“É preciso mostrar que [Gouveia e Melo] não é o que se chegou a pensar”, defende um dirigente do partido, que nota outra coisa: o almirante parece empenhado em aproveitar o espaço que existe no centro e centro-esquerda para conquistar votos, pelo que importa a André Ventura aproveitar o facto de Henrique Gouveia e Melo estar a destapar o seu flanco direito.
As ações de Ventura têm provocado a reação de Gouveia e Melo. O almirante acusou recentemente o líder do Chega ter entrado “num corrupio de xenofobismo e racismo”, que faz lembrar o sistema hitleriano. Antes, em reação à frase sobre os “três Salazares“, Gouveia e Melo já tinha acusado Ventura de ser um “saudosista” do Estado Novo.
Nessa altura, almirante sugeriu que o líder do Chega “tem algumas tendências ditatoriais” e “gostaria eventualmente de ser presidente da Venezuela e poder mandar prender opositores”. Para Henrique Gouveia e Melo, aliás, “só quem não tem memória verdadeira do regime antigo que atrasou Portugal, que era opressivo e ditatorial”, é que acredita que seria preciso Salazar.
Vêm aí mais cartazes — Ventura no centro do debate
São cinco os cartazes de André Ventura como candidato presidencial que já estão nas ruas. Três sobre imigração, um focado na comunidade cigana e um último com uma mensagem relativa à corrupção. Além do já polémico “Isto não é o Bangladesh”, o líder do Chega surge ao lado de frases como “Os imigrantes não podem viver de subsídios”, “Os portugueses primeiro”, “Ciganos têm de cumprir a lei” e “Um país sem corrupção.”
São todos em fundo branco, com a fotografia do líder do Chega à frente de duas riscas, uma vermelha e uma verde, a simular a bandeira de Portugal, e letras garrafais com mensagens curtas e diretas. Fonte próxima de Ventura não tem dúvidas de que o objetivo principal foi cumprido com o impacto que os cartazes geraram. “Colocou todos a falar sobre ele e colocou todos contra ele”.
A reação de todos os adversários, de Gouveia e Melo a Catarina Martins, de Luís Marques Mendes a João Cotrim Figueiredo, reforçou, precisamente, a ideia que André Ventura quer vender: a de que é um alvo a abater por ser o “único que é capaz de dizer estas coisas” e de traduzir aquilo que os portugueses “na rua” pensam.
Além disso, este tipo de estratégia permite cavar (ainda mais) as diferenças em relação a Marcelo Rebelo de Sousa, que tem sido mais recuado do que o Governo em matéria de imigração — o atual Chefe de Estado começou por vetar a Lei de Estrangeiros e tem agora nas mãos a possibilidade de enviar a Lei da Nacionalidade para o Tribunal Constitucional. Ventura quer aproveitar a onda para mostrar que o Presidente da República pode ser “preponderante” também neste tipo de questões.
Usar uma paródia como arma de política
O cartaz que tem gerado mais polémica — “Isto não é o Bangladesh” — é inspirado numa música do artista “Bruttosuave”, que utiliza a Inteligência Artificial e produz vídeos de humor “satírico e negro”. “Nada do que é exposto neste canal deve ser levado a sério e todas as personagens dos vídeos deste canal, embora baseadas em pessoas reais, são fictícias e criadas através do recurso a IA. O universo de bruttosuave é assumidamente satírico e negro, quem não tiver estofo para este tipo de humor é aconselhado a não ver estes vídeos”, pode ler-se na descrição do perfil do YouTube, onde a música “Bangladesh” já conta com mais de 270 mil visualizações.
O vídeo há muito que entrou no universo do Chega, de tal forma que André Ventura já foi desafiado por jovens, em plena campanha eleitoral, a cantar o refrão para as redes sociais. No vídeo, as figuras de André Ventura, Rita Matias e Pedro Pinto (todas geradas por Inteligência Artificial) são protagonistas da paródia e surgem a gozar os visados, com referências a questões pessoais (o facto de André Ventura não ter filhos, por exemplo) e políticas defendidas pelo partido.
No caso do líder do Chega, a personagem diz colocar a “família acima de tudo”, menos para ele próprio, que ainda não se dignou a ter “putos“. No vídeo-paródia, há ainda referências a Miguel Arruda, o deputado apanhado a roubar malas no aeroporto, a Pedro Pinto e ao facto de ter agredido um árbitro de 18 anos num jogo de futebol, ou ainda a Rita Matias e ao discurso sobre mulheres e feminismo. No entanto, e mesmo tratando-se de um vídeo que goza com e critica objetivamente o Chega, André Ventura optou por priorizar o hype da música e aproveitar a forma como se popularizou nas redes sociais, principalmente no Instagram e TikTok.
quarta-feira, 29 de outubro de 2025
Um dia: Estrangeiros na própria terra?
Há frases que soam a profecias, mesmo quando são ditas ao acaso. Esta, por exemplo:
“E, se tudo se mantiver como está com o reagrupamento familiar e por aí fora, bem, qualquer dia também acontecerá cá aquilo que acontece noutras sociedades em que as pessoas, os nacionais, as pessoas que fazem parte daquela sociedade, se sentem estrangeiras na sua própria terra.”(Pedro Passos Coelho)
Dita assim, entre o “bem” e o “por aí fora”, parece um desabafo. Mas por trás há uma inquietação profunda, uma espécie de cansaço silencioso de quem olha em volta e já não reconhece o sítio onde vive.
É uma sensação cada vez mais comum — e perigosa. Porque quando um cidadão começa a sentir-se estrangeiro no seu próprio país, é o próprio pacto social que se desfaz. E não é apenas por causa de quem chega, mas também por causa de quem já cá está e decidiu deixar que o país se tornasse apenas um “espaço de passagem”, sem cultura comum, sem projeto, sem fronteiras mentais nem materiais.
O discurso sobre o reagrupamento familiar, a integração e a diversidade costuma vir embrulhado em boas intenções. Fala-se de acolhimento, de humanidade, de solidariedade. Tudo conceitos nobres — e necessários. Mas há uma fronteira subtil entre acolher e dissolver-se. Entre ser aberto e ser indefinido. Entre integrar e desistir de se reconhecer.
É aqui que entra o desconforto. O português que já se sente deslocado no próprio bairro, que vê as escolas transformadas em mosaicos culturais mas sem língua comum, que ouve mais vezes o som do “outro” do que o eco do “nós”. E depois vem a culpa: não se pode dizer isto em voz alta, sob pena de ser imediatamente carimbado como “xenófobo”.
O problema é que a conversa pública sobre imigração se tornou um campo minado. Há os que negam qualquer problema — e há os que transformam todo o problema numa guerra civilizacional. Nenhum dos extremos ajuda. Porque o que está em causa não é a origem de quem chega, mas o rumo de quem recebe.
Portugal tem uma longa tradição de emigração e acolhimento. Somos um povo que saiu e que voltou, que aprendeu línguas e que ensinou outras. Mas havia sempre uma âncora — uma ideia de casa. Hoje, essa âncora parece soltar-se. A globalização tornou tudo mais rápido e mais impessoal: o trabalhador é “mobilidade”, o bairro é “diversidade”, o país é “mercado”. E, no meio disso, o cidadão sente-se inquilino da própria história.
Há países que já passaram por isto: França, Reino Unido, Suécia. Sociedades onde o discurso do “multiculturalismo” se transformou, com o tempo, numa coleção de comunidades paralelas, onde a coexistência substituiu a convivência. Onde o “nós” se partiu em ilhas identitárias. Quando se chega a esse ponto, o passo seguinte é a desconfiança: cada grupo começa a defender o seu território simbólico, e o Estado passa a ser apenas um árbitro cansado.
Ainda vamos a tempo de evitar isso — mas só se tivermos coragem para fazer duas coisas que raramente andam juntas: pensar e decidir. Pensar no país que queremos ser, sem medo de falar de limites, de regras, de reciprocidade. E decidir que a hospitalidade não significa autoanulação.
Integrar implica exigência — aprender a língua, respeitar os costumes, participar na vida cívica. Mas também implica que quem já cá está acredite que vale a pena manter uma identidade comum. Uma sociedade que não se reconhece não integra ninguém; apenas absorve por inércia, como quem enche um copo rachado.
Talvez o verdadeiro desafio do nosso tempo não seja “acolher o outro”, mas não perder o sentido de casa. Porque a casa não é um muro nem uma bandeira — é um conjunto de gestos, de palavras, de memórias partilhadas. E, se deixarmos de cuidar disso, um dia acordamos e percebemos que já não sabemos onde estamos.
E nesse dia, sim, seremos estrangeiros na nossa própria terra. Não por causa de quem chegou — mas por termos esquecido quem somos.
terça-feira, 28 de outubro de 2025
O Bloco: funeral de uma flotilha ideológica
Os comentadores politicamente correctos estão em comoção com a saída de Mariana Mortágua da liderança do Bloco de Esquerda. Fala-se em “recomposição”, em “liderança alternativa”, em “sobrevivência de um projecto de esquerda radical”. É comovente. Só falta distribuírem lenços de papel e cartazes com “Free BE”.
Mas há uma diferença entre um partido com dificuldades e um partido que nasceu programado para implodir. O Bloco nunca foi um partido democrático no sentido liberal ou pluralista da palavra. Foi, desde o primeiro minuto, uma coligação ideológica de extrema-esquerda, com uma matriz totalitária assumida — trotskistas, maoistas e comunistas reciclados que nunca engoliram bem a queda do Muro de Berlim.
Os que hoje fingem surpresa perante a decadência do Bloco são muitas vezes os mesmos que, durante duas décadas, trataram este partido como “voz progressista da sociedade civil”, fechando os olhos às suas simpatias por ditaduras de manual — da Cuba castrista à Venezuela chavista.
Nos últimos anos, a agenda política do Bloco foi sendo substituída por um activismo de cartaz, mais preocupado em defender terroristas do que trabalhadores portugueses. Da Palestina a Cuba, passando pela “Flotilha da Liberdade”, os bloquistas converteram-se em operadores de propaganda internacional, frequentemente financiados por redes nebulosas de ONG’s alinhadas com interesses bem menos “românticos” do que proclamam.
Não é difícil perceber porque razão há tanto interesse em “flotilhas de luxo” e “missões humanitárias” muito bem financiadas: a política de extrema-esquerda contemporânea vive tanto de performance mediática quanto de convicções ideológicas. Mas quem paga a conta dessas férias revolucionárias? Essa pergunta costuma desaparecer do radar dos jornalistas sempre prontos a retratar estes “activistas” como mártires das causas justas.
Não é ser fiel à realidade escrever sobre o Bloco sem dizer o óbvio: este é um partido abertamente hostil à ordem democrática liberal. Idolatra regimes onde não há liberdade de imprensa, onde os opositores são presos e onde a economia é controlada por burocracias ideológicas. A diferença é que, em Portugal, aprenderam a usar a democracia — que desprezam — para ganhar tempo de antena e subvenções parlamentares.
Quando se aliaram ao Partido Socialista, não foi para moderar-se. Foi para condicionar políticas públicas a partir de dentro, impondo agendas ideológicas radicais, sem ter de enfrentar o incómodo de governar. Agora, que perderam peso eleitoral e capacidade de chantagem, voltam ao que sempre foram: uma minoria barulhenta e auto-referencial.
Os bloquistas têm sempre uma explicação para as derrotas: foi o mundo que virou à direita, foi a campanha, foi o patriarcado, foi o imperialismo… nunca são eles. O comentador Miguel Santos Carrapatoso escreve que “os eleitores deixaram de os compreender”. Não. O país compreendeu demasiado bem. Compreendeu que gritar “prende que é fascista” ou “Free Palestine” não resolve problemas de segurança, de habitação ou de salários.
A extrema-esquerda portuguesa esqueceu-se de que não existe povo real no país imaginário da sua retórica. E quando um partido se fecha no eco das suas convicções, acaba inevitavelmente a falar sozinho. É exactamente o que está a acontecer com o Bloco.
A eventual morte política do Bloco não é uma tragédia — é a normalização da política portuguesa. Quando partidos que defendem ditaduras, que hostilizam a economia de mercado e que vivem de slogans perdem peso, a democracia agradece.
O que virá a seguir? Talvez algumas reuniões em cafés alternativos, umas “ocupações” para os fiéis e umas crónicas indignadas no Observador e na SIC Notícias. A esquerda radical sempre foi perita em funerais simbólicos — e este, ironicamente, será o único com alguma coerência.
“O Bloco não desaparece. Regressa simplesmente à sua verdadeira dimensão: minoria ruidosa e ideologicamente fossilizada.”
segunda-feira, 27 de outubro de 2025
a Extrema. Esquerda que te esconderam nas "aulas de cidadania..."
O Partido Revolucionário do Proletariado foi uma organização política socialista revolucionária portuguesa, nascida na clandestinidade em setembro de 1973, ainda sob regime fascista. Juntou ex-membros da CDE e outros anti-fascistas e anti-capitalistas a membros das BR. Em face da então fraude eleitoral recorrente em Portugal e do golpe anti-democrático de Pinochet no Chile, o PRP defendia a revolução socialista e a ditadura do proletariado (retirado do seu manifesto constitutivo de 1973).[1]
Terminou a atividade até 1978, com a prisão da maioria dos seus dirigentes, entre os quais Isabel do Carmo e Carlos Antunes. Estes viriam a se transferir para a Organização Unitária dos Trabalhadores que estaria na génese da formação do Projecto Global, liderado por Otelo Saraiva de Carvalho, que incluía as Forças Populares 25 de Abril e a Força de Unidade Popular. O partido viria então a ser declarado extinto apenas em 5 de junho de 1980.[2]
Politicamente esteve muito ativo durante o PREC Durante este período, o PRP confundiu-se com as Brigadas Revolucionárias, funcionando estas de forma articulada e organizada recebendo apoio financeiro e dando-lhe cobertura politica. Nunca concorreu a
ualquer eleição legislativa ou autárquica, tendo no entanto apoiado Otelo Saraiva de Carvalho nas duas eleições presidenciais.
O período clandestino durante a ditadura
O PRP vai corresponder às preocupações de uma série de ativistas políticos perto do fim da ditadura. César Oliveira descreve uma reunião do seu grupo político com "o grupo que viria a ser o PRP" para discutir a participação relativamente às "eleições" legislativas de 1973. Esta reunião estava inserida numa série de reuniões com outros movimentos políticos. Na sala do escritório de Jorge Sampaio, este, César Oliveira, Victor Wengorowius, ou José Manuel Galvão Teles, vão reunir com "da outra parte, a Isabel do Carmo, um militante creio eu chamado José de Sousa, uma médica colega da Isabel do Carmo e o Goulart".[3]
Nasceu, em setembro de 1973 de uma cisão na Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN). A ideologia do Partido Revolucionário do Proletariado pode ser caracterizada como comunista de esquerda - corrente socialista revolucionária antiparlamentarista e anti-marxista-leninista. Defendia a organização autónoma da população, em assembleias e comissões de trabalhadores e de moradores, como a forma mais legítima e autêntica da luta de classes.[4] O PRP porém, ao contrário de outras correntes socialistas libertárias como o anarco-sindicalismo ou o conselhismo que não consideram necessária a constituição de um partido político, defendia que a simples organização autónoma dos trabalhadores não era suficiente para a tomada do poder e a constituição da ditadura do proletariado. Como tal, defendia que a existência de um partido era imprescindível para a organização dos trabalhadores e militantes mais politicamente ativos, muito embora o PRP reconhecesse e aceitasse a desconfiança que a classe operária terá nos partidos políticos, e até criticando partidos leninistas que, segundo o PRP, acreditam no "milagre" dos trabalhadores aceitarem um partido único de vanguarda[5]. Dava importância à luta armada, como refletido no seu símbolo.
Surge no final do marcelismo, três anos depois da criação das Brigadas Revolucionárias (BR), grupo armado com o qual se articulava ideológica e organicamente, uma vez que muitos dos seus membros eram já militantes deste grupo terrorista.[6] O PRP-BR não era uma organização política que tinha um braço armado, nem tão pouco um aparelho militar que tinha um braço político. Buscava uma nova síntese entre a luta política e a luta armada, tal como entre a luta legal e a luta clandestina. Os militantes das Brigadas Revolucionárias estavam enquadrados no PRP, mas nem todos os militantes do PRP participavam nas actividades das BR.[7]
Durante o último período do Estado Novo desenvolveu atividade de sabotagem de retaguarda contra objetivos militares portugueses, para favorecer a luta dos movimentos independentistas das então colónias portuguesas. Num desses atentados, dois militantes seus perderam a vida no manuseamento dos explosivos.
Para a sua infraestrutura clandestina aproveitava as suas ligações com sectores dos católicos progressistas.[8]
Durante o PREC
Depois da revolução dos cravos passou a ter atividade pública. Publicava os jornais Revolução, dirigido por Isabel do Carmo, e Página Um por Jorge Fagundes, também ele advogado dos dirigentes Isabel do Carmo, Carlos Antunes e Fernanda Fráguas, posteriormente detidos. em Junho de 1978.[9]
Este tipo de organizações autónomas teve um papel social extraordinariamente ativo durante o Processo Revolucionário em Curso (PREC), responsável por uma onda maciça de greves e ocupações. Foi na convergência em assembleias populares de comissões de trabalhadores, moradores e os militares mais à esquerda do Movimento das Forças Armadas (MFA), que estas formas de organização mais se aproximaram da dualidade de poderes, efetivamente contestando e desafiando as estruturas do poder do Estado durante os governos provisórios.[10]
Seguindo a sua linha antiparlamentarista, não se apresentou às eleições de 25 Abril de 1975 para a Assembleia Constituinte, tendo defendido a abstenção ou o voto nulo e participado na campanha com o slogan: "A arma é o voto do Povo".[11]
O partido exercia alguma influência em algumas empresas como a Lisnave (um dos baluartes da luta revolucionária dos trabalhadores), e no processo das operações do Serviço de Apoio Ambulatório Local (SAAL). Tinha influência também nos sectores militares revolucionários, nomeadamente junto do COPCON, muito devido à ligação que o PRP mantinha com Otelo Saraiva de Carvalho. Os seus contactos no COPCON serviram-lhe também para organizar um pequeno destacamento militar vinculado ao partido, que participou em ações de consciencialização cívico-revolucionária no distrito de Bragança durante o verão de 1975.
Os Conselhos Revolucionários de Trabalhadores, Soldados e Marinheiros e a Escola de Cultura Proletária
Durante 1974 e 1975, foi responsável pela organização dos Conselhos Revolucionários de Trabalhadores, Soldados e Marinheiros (CRTSM), uma das primeiras tentativas de união entre as organizações autónomas de trabalhadores e os militares do MFA, visando a articulação nacional das comissões de trabalhadores e a sua potencial preparação para a autodefesa armada da revolução.[12] O PRP favorecia a decisão democrática no seio destes e criticava o PCP e os seus Comités da Defesa da Revolução, que dizia serem controlados por militantes do partido e não eram responsáveis ante assembleias de trabalhadores.[13]
Os CRTSM chegaram a ser alardeados por Christopher Reed, jornalista do The Guardian em visita a Portugal em 1975, como o potencial "nascimento de sovietes".[14] O próprio Otelo Saraiva de Carvalho considerava-os, juntamente com as comissões de moradores, a essência da revolução portuguesa, comparando-os também com os sovietes russos de 1917. No entanto, os CRTSM tinham um carácter político e teórico, desligados da realidade das principais lutas económicas do seu tempo, além das dificuldades que enfrentaram com a deficiente coordenação local e regional das comissões de trabalhadores, com a agudização da luta político-partidária entre a classe operária e a excessiva concentração dos Conselhos em Lisboa.[15]
Em 1975 o PRP tentou criar uma Escola de Cultura Proletária alternativa ao ensino burguês. Para tal ocupou, em conjunto com a LUAR, uma moradia em Cacilhas, mas acabou por ser em Lisboa, num solar igualmente ocupado na Av. 5 de Outubro, que concretizou a Universidade Proletária Ernesto e Luis, assim designada em homenagem aos seus dois militantes operários mortos numa Ação armada antes do 25 de Abril. Até 1977 aí organizou debates públicos, cursos livres e uma livraria de temáticas anticapitalistas.
Verão Quente de 1975
Durante o Verão Quente de 1975, o PRP apoiou inicialmente o Documento Guia da Aliança Povo-MFA e o Documento do COPCON[16], dois documentos que defendem que o rumo da revolução portuguesa siga pelo caminho do socialismo revolucionário puramente alicerçado na democracia direta e popular,[17][18] e não um regime representativo como aquele se encontrava em redação na Assembleia Constituinte.
No final de Agosto de 1975, o PRP integrou a Frente de Unidade Revolucionária junto com outros partidos de esquerda. Foi criada essencialmente para apoiar o V Governo Provisório de Vasco Gonçalves, após cuja queda serviu principalmente para a convocação de manifestações e a tomada de algumas posições conjuntas.[19]
Participou também na organização da Soldados Unidos Vencerão (SUV), uma organização de soldados revolucionários, constituída em Agosto de 1975, que se descrevia como "uma frente unitária anticapitalista e anti-imperialista" contra aquilo que considerava ser a crescente deriva antidemocrática do MFA, nomeadamente o chamado Grupo dos Nove.[20] Os SUV eram então grupos de militares que atuavam no interior dos quartéis com vista a promover a auto-organização política dos militares. A organização será particularmente ativa nos últimos meses no PREC, numa altura em que a hierarquia militar e o MFA se encontravam em avançado estado de deterioração. Atuaram sob a direção de Ferreira Fernandes, Manuel Resende, José Carvalho e Heitor de Sousa, entre outros. Tratava-se de uma organização clandestina no interior das Forças Armadas e incluía, não só soldados como também alguns graduados.[21]
Com a radicalização e dirigismo cada vez maior da extrema esquerda tendo em vista a conquista do poder, a seguir a 1975, com o apoio e proteção do Copcon liderado por Otelo Saraiva de Carvalho, o PRP/BR colocou se ao lado deste, tendo conquistado um protagonismo e influência cada vez maiores. O documento “Autocrítica revolucionária do COPCON e Proposta de Trabalho para um Programa Político” que mais não era que a resposta ao Documento do Grupo dos Nove, publicado a 13 de Agosto de 1975.[22] e teve a participação bastante forte do PRP/BR através de Isabel do Carmo e Carlos Antunes.[23] Ao mesmo tempo, o PRP/BR defendia junto do Copcon que a forma de reforçar a Aliança Povo/MFA seria necessário constituir um grande exercício formado por militares e por membros das organizações populares de base (comissões de trabalhadores, de moradores, etc) devendo este constituir este um enorme exército revolucionário.[24]
É estabelecido então um plano para entrega de mais de 10.000 metralhadoras G3 à população. O primeiro lote, constituído por 1000 G3, foi desviado pelo capitão Álvaro Fernandes e foi entregue pela Polícia Militar a Isabel do Carmo e Carlos Antunes do PRP/BR, o que foi publicamente denunciado pela imprensa afeta as forças democráticas do PS, PSD e CDS, o que faria abortar o resto da operação.[25] Otelo não mostrou grande preocupação, atendendo a que "as armas encontravam-se à esquerda"[26]
Com a crescente tensão e polarização e violência crescente que se caracterizaram as semanas antes do 25 de Novembro, levam as Brigadas Revolucionárias a retornar a clandestinidade. Com esta decisão, o PRP pretendia preservar a estrutura militar e os paióis de armamento de que dispunha. Ao mesmo tempo, começou a apelar à insurreição armada como forma de os trabalhadores tomarem o poder, continuando a defender a urgente criação de um exército revolucionário, que articulasse os militares revolucionários e os civis armados organizados nas estruturas do poder popular.[27][28]
Em 23 de outubro de 1975, as Brigadas Revolucionárias anunciam o seu regresso à clandestinidade separando-se, pelo menos em termos oficiais, do PRP.[29][30] Sobre os acontecimentos de 25 de novembro de 1975, o PRP recusa as acusações de alguns jornais de ter supostamente apoiado as movimentações dos para-quedistas. Além disso, o partido diz que não apoia "golpes militares de esquerda", afirmando que "não é com conspirações armadas que os trabalhadores tomam o poder".[31]
Após o 25 de Novembro de 1975, .0 PRP; através do seu Secretariado Político, em comunicado datado de 30 de Novembro de 1975 e com o título "Desmascaramento do golpe de 25 de Novembro", declara expressamente que mantêm firmemente todas a propostas feitas no "Manifesto Contra a Guerra Civil, Insurreição Armada"[32] e acrescentam "A insurreição tem todas as possibilidades de levar ao poder os trabalhadores de uma forma unitária e revolucionária, sem equívocos, nem ambiguidades. Hoje como ontem dizemos: Unir, Organizar; Armar para a Revolução Socialista".[32][33]
O PRP/BR não era uma organização política que tinha um braço armado, nem tão pouco um aparelho militar que tinha um braço político. Os militantes das Brigadas Revolucionárias estavam enquadrados no PRP, mas nem todos os militantes do PRP participavam nas atividades das BR. Na pratica, não existiam muitas fronteiras entre os dois grupos, nem politicas nem humanas. A apresentação pública em conferência de imprensa da passagem à clandestinidade das BR, com dirigentes conhecidos do PRP-BR de cara descoberta e militantes do PRP-BR encapuçados é demonstrativo disso mesmo.[34]
Após o PREC
O movimento militar de 25 de Novembro de 1975 trava drasticamente a radicalização crescente e avanço do processo revolucionário e significa a derrota do projeto político da esquerda radical. Ainda assim, esta ensaia um novo “braço de ferro” nas eleições presidenciais de 1976, onde Otelo concorre, com o apoio do PRP bem como do MES, da UDP, etc, conseguindo quase 16,5% dos votos. Em 1980, tentando recriar esse resultado, o Movimento de Esquerda Socialista (MES), Organização Unitária de Trabalhadores (OUT), Partido Comunista (marxista-leninista), Partido Comunista (Reconstruído) (PC(R)), Partido Revolucionário do Proletariado (PRP), Unidade Comunista (UC) e União Democrática Popular (UDP) assinam acordo político que constitui a Força de Unidade Popular (FUP) idealizada e fundada por Otelo Saraiva de Carvalho.[35]
Com o fim do PREC, a atividade das organizações autónomas e forças de luta popular abrandou, e como consequência também a atividade política do PRP. No entanto, este após o 25 de Novembro, mantém-se, fiel à ideia do confronto armado com o poder. Em 1976, e na sequência da campanha eleitoral de Otelo, apoiada nos Grupos Dinamizadores de Unidade Popular (GDUP), dinamizados por elementos do PRP, surge o Movimento de Unidade Popular (MUP). O próprio Otelo, que pela sua condição de militar, nunca pertenceu ao partido, no seu manuscrito "Curta História" escreve que: : "... Havia sim que aproveitar o balanço possibilitado pelas eleições recentes, para aglutinar o maior número possível de bons companheiros, revolucionários, à volta de um projeto político mobilizador que mantivesse permanentemente viva a chama da Revolução Socialista, criando-se uma organização política dinâmica — o MUP, Movimento de Unidade Popular em aproveitamento da sigla GDUP que alcançara inegável êxito na campanha — de tipo quase frentista, à custa dos militantes e quadros das organizações políticas que haviam apoiado a campanha, dos elementos «independentes» e de todos aqueles que, despartidarizados, haviam aderido aos GDUP".[33]
Aquando das eleições legislativas de 1976, o PRP procurou junto dos partidos que constituíram a FUR, a criação de uma candidatura conjunta "num amplo movimento" alicerçado no Poder Popular e nos militares de esquerda saneados das forças armadas após o golpe de 25 de novembro. Os partidos recusaram, decidindo apresentar-se a eleições sozinhos, e o PRP decidiu não participar nas eleições, que denomina de "farsa burguesa", advogando a abstenção ou o voto nulo.[36]
Entretanto, a 21 de Março de 1978, foram detidos um número importante de operacionais da organização no decorrer de uma operação policial e consequente troca de tiros com os terroristas, veio a morrer o agente da Polícia Judiciária Jorge Augusto Carvalho. Durante o tiroteio ficaram gravemente feridos mais dois agentes da PJ: António do Nascimento Tomé Afonso e Agostinho Jesus Luís da Silva, saindo ileso o subinspetor que chefiava a brigada, António Barros.[37]
Entre 1975 e 1978, o PRP através das suas Brigadas Revolucionárias, desenvolveu atividade clandestina envolvendo-se em assaltos a bancos e carrinhas de transporte de valores que apelidavam de "recuperação de fundos" e que serviram como principal fonte de financiamento da organização. Foram ainda responsáveis por dezenas de atentados com explosivos em instalações militares, esquadras da polícia ou edifícios do estado e governo.[38]
Congresso da OUT (Organização Unitária dos Trabalhadores)
No 1º Congresso da OUT (Organização Unitária dos Trabalhadores), uma organização política de esquerda, antifascista, anticolonialista, que aspirava a revolução socialista apoiada no poder popular,1400 militantes reúnem-se na Marinha Grande a 8 e 9 de Abril de 1978.[1] Como símbolos uma bandeira vermelha, circunscrita parcialmente por barras pretas e uma estrela amarela, e dois hinos, A Internacional e a Grândola Vila Morena. A questão da violência política foi colocada de forma muito clara por Mouta Liz, membro dirigente da OUT e mais tarde fundador da FUP e alegadamente das FP25. Na sua intervenção, fez claramente o apelo à luta armada: “é necessário que tenhamos a coragem de afirmar que à violência só com a violência se pode responder e que para isto é preciso ter armas e organização”.[39] Os principais documentos aprovados tinham menções expressos à utilização da violência revolucionária, à necessidade de armar os trabalhadores e de formar um exército revolucionário popular” [39] [30]
Pedro Goulart em nome da direção do PRP, apresenta um discurso muito claro sobre a possível dissolução do PRP e a posterior integração deste na Organização Unitária de Trabalhadores:[33]
«... Contra as calúnias e o ódio partidário e sectário, o PRP quer aqui afirmar que os seus militantes participantes da nova Organização têm o dever de se sujeitar às decisões democráticas tomadas no' seio desta, respeitar a sua autonomia política e levar à prática a orientação aqui traçada...»[33]
«... O PRP reafirma hoje, como já o fizera a propósito do MUP que, se este projeto for para à frente, está disposto a dissolver-se nele quando isso for considerado justo, contribuindo assim, seriamente “pare a unificação dos trabalhadores e revolucionários portugueses, para a vitória do socialismo e Poder dos trabalhadores».[33]
Neste congresso, o PRP admitiu pois estar disposto a dissolver-se na OUT e deu claras instruções aos seus militantes para participarem na nova Organização e acatarem as decisões do congresso. Na prática, quase que já havia uma fusão das duas organizações.[40]
Prisão e julgamento
Mais tarde, a 20 de Junho de 1978, viriam a ser presos a maioria dos dirigentes do PRP/BR: Isabel do Carmo e Carlos Antunes. A prisão de Carlos Antunes e Isabel do Carmo e Fernanda Fráguas, Guinote dos Santos, entre outros, viria a ocorrer poucos meses depois, em Junho desse ano. Nesta operação policial, seriam ainda efetuadas buscas ás sedes do PRP e ao jornal do partido, Página Um.[41]
A solidariedade com os presos vai incluir um "manifesto a denunciar a repressão e a exigir a libertação dos presos políticos recebe o apoio de figuras como Adelino Gomes, Augusto Abelaira, Batista Bastos, Calvet de Magalhães, Emídio Santana, Fausto, Francisco Pereira de Moura, Ferreira Fernandes, Filipe Rosas, João Lavinha, José Afonso, José Fanha, Leça da Veiga, Manuel Serra, Mário Viegas, Maria do Céu Guerra, Paula Guedes, Saldanha Sanches, Viotti de Carvalho, entre outras (p.66)."[1] Pedro Goulart seria um dos dinamizadores desse movimento.[1]
Entretanto, após a prisão dos operacionais ocorrida em Março e dos principais dirigente ocorrida em Junho de 1978, os réus liderados por Isabel do Carmo e Carlos Antunes exigiam para si o papel de presos políticos em contradição com a posição do Ministério Público que os considerava presos de delito comum, em virtude dos crimes pelos quais eram acusados, constarem assaltos a bancos e carrinhas de valores, atentados à bomba contra instalações militares, postos da GNR e destruição de propriedade privada. A 24 de Abril de 1979, O Presidente da República Ramalho Eanes publica a Lei n.º 74/79, relativa à amnistia de infracções de natureza política, decorrentes entre 11 de Março e 25 de Novembro de 1975, que exclui os crimes pelos quais os réus eram acusados, não apenas porque estes ocorreram já depois do 25 de Novembro de 1975, como pelo facto dela estarem excluídas infrações cometidas com emprego de bombas ou outros engenhos explosivos.[42] Esta polémica, deu origem ao chamado "Caso PRP".
Em Novembro de 1979, um grupo de militantes do PRP/BR reivindicou a execução de José Plácido, ex-militante da Marinha Grande. Este tinha sido preso na operação policial de Março de 1978, foi assassinado nas vésperas do julgamento, onde iria depor na qualidade de dissidente e arrependido da organização. José Manuel Plácido, de 32 anos, técnico de contas de profissão e ex-tesoureiro do PRP, foi atingido mortalmente com três tiros na cabeça, enquanto saía de casa de manhã, para acompanhar a mulher ao trabalho. No comunicado que reivindicava o atentado, foi acusado de colaborar com a polícia e ainda apropriação de fundos da organização. Uns anos mais tarde, numa reunião das Forças Populares 25 de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho o descrever a história da sua própria organização referiu-se desta forma à morte de José Plácido: “É executado na Marinha Grande, no dia 15, um traidor que se vendera à polícia”.[43]
No parlamento, em Junho de 1982 há uma moção pela libertação dos militantes do PRP. Os 29 arguidos aguardavam em prisão preventiva desde 1978. Natália Correia, deputada do PSD e escritora, vota favoravelmente, concertando a sua posição com o Presidente Eanes. Outros deputados do PSD como Helena Roseta, Nuno Rodrigues dos Santos, Amândio de Azevedo, Amélia de Azevedo, Margarida Salema, Moura Guedes e Júlio Castro Caldas abandonam o hemiciclo para não desrespeitar a vontade da direção do PSD, enquanto Francisco Sousa Tavares faltou. Natália justifica o voto "Pela democracia, pela justiça (...) pelo sacrifício de vidas dispostas a imolarem-se na luta por direitos a que a tolerância democrática não pode ser indiferente, mesmo que discorde dos seus fundamentos ideológicos." (506-507) [44]
O julgamento terminou com a condenação de vários dos envolvidos, incluindo dos dirigentes (Carlos Antunes, Isabel do Carmo), entre outros.[38][45]
Final das atividades
O PRP nunca concorreu a qualquer eleição legislativa ou autárquica, além do apoio nas duas eleições, 76 e 80 à candidatura presidencial de Otelo Saraiva de Carvalho.[46]
Parte dos restantes dirigentes e militantes do PRP, entre os quais Pedro Goulart, vão participar na fundação de organizações políticas como a Organização Unitária de Trabalhadores (1978) e depois da Força de Unidade Popular (1980), Vários seriam acusados de pertencer ao Projecto Global/FP-25, a superestrutura que englobava as FP-25, a FUP e o próprio Otelo Saraiva de Carvalho. Noronha do Nascimento, Presidente Emérito do Supremo Tribunal de Justiça, resume o desfecho do processo FUP/FP-25 de Abril a inocentados na autoria material e amnistiados (aplica-se a quem não foi condenado) na autoria moral.[47]
O partido viria a ser dissolvido em congresso, em 5 de junho de 1980.[2]
Principais dirigentes
. Humberto Dinis Machado
. Fernanda Fráguas
Referências
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«Manifesto PRP-BR». Consultado em 2 de Maio de 2020
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Unir, Organizar, Armar, o PRP durante o PREC, Ana Sofia Ferreira
«Judiciária faz contas com o PRP». Renascença Gráfica. Diário de Lisboa: 1. 21 de junho de 1978
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Ligações externas
Bibliografia
Ferreira, Ana (2015). «Luta Armada em Portugal (1970-1974)» (PDF). NOVA FCSH. Cópia arquivada (PDF) em 20 de março de 2020
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Dinfo - A Queda do Último Serviço Secreto Militar, de Fernando Cavaleiro Ângelo, Casa das Letras, abril de 2020, ISBN: 978-989-660-816-3
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