O apagão de 28 de Abril (que começou por ser um ciberataque à Europa de Van der Leyen e Macron perpetrado pela dupla Trump-Putin, ou só pelos “russos” ou, quem sabe, pelos “chineses”, a justificar todos os kits de sobrevivência recomendados, e que acabou, por enquanto, por ter como explicação oficial uma enigmática convergência de altas tensões) foi uma demonstração do grau de dependência, impreparação para a contingência e marginalidade do nosso país. Uma dependência e marginalidade justificadas pela política do melhor preço e ajudadas pelas políticas de “urgência climática” que nos levaram a fechar ou a congelar centrais eléctricas.
Três dias antes tínhamos tido a celebração do que também já vai sendo para muitos um insistente apagão: a omissão de certas verdades, números e realidades em mais um aniversário do 25 de Abril, o 51º. Neste, porém, houve um acontecimento inédito – o reconhecimento e aplauso entusiástico de grande parte da classe jornalística e comentatorial à actuação da Polícia.
Já não era sem tempo. Mudam-se os termos, mudam-se as verdades. Não longe daquela rua do Bem-Formoso onde, há semanas, os polícias da PSP obrigavam uma série de pacíficos imigrantes a voltarem-se contra a parede em nome de um falacioso controle à criminalidade e à irregularidade, numa evocação de cenas terminais do gueto de Varsóvia, os mesmos polícias desancavam à cacetada umas dezenas de perigosos neonazis. E, desta vez, muito bem, porque, desta vez, era em nome da ordem democrática e contra a extrema-direita que o faziam. Contra a extrema-direita, não, contra a extremíssima direita, porque de extrema-direita já era o Chega, como já foram e como também o vão sendo, à medida das conveniências, o CDS ou o PSD de Passos Coelho. Mas parece que estes, os que deram para o torto, estavam mesmo ainda mais à direita do que essa extrema-direita toda.
Por isso os jornalistas e comentadores aplaudiram a Polícia. A manifestação estava proibida, a direita à direita da direita mais extrema insistiu em fazê-la, provocando os democratas que celebravam Abril e os contramanifestantes Antifas, que antevendo a insistência dos extremistas e a alta tensão que geraria ali tinham acorrido para assumir moderadamente a vanguarda da defesa da democracia… ao que a Polícia interveio, de capacete e couraça, para os poupar ao trabalho.
Enfim, é urgente defender a democracia, ameaçada pelo voto popular em seres próximos destes trauliteiros; e fazê-lo antes que seja preciso recorrer ao sistema da Roménia, onde para parar o Georgescu teve o Tribunal Constitucional de anular a eleição. O que, sendo justo e necessário, não deixa de ser embaraçoso.
É que, agora que se cumpriram oitenta anos sobre a morte de Hitler e da derrota do nazismo, parece que há reencarnações. Na opinião subtil de um prelado português, Hitler terá mesmo escolhido os Estados Unidos para reencarnar… e não é que os americanos foram escolher para presidente em 5 de Novembro passado a reencarnação de Adolfo?
Os estragos eram inevitáveis. Só não destruiu a ordem liberal internacional porque a mesma já estava em agonia antes da sua reeleição. E os americanos, não contentes com o lapso da eleição, parece que continuam a apoiá-lo, mesmo depois de 100 dias de altas tensões e desatinos.
De qualquer forma, estava-se tão bem na Europa, na América, no Médio Oriente, no mundo… e agora isto, obra de um só homem, obra exclusivamente da Direita, que é sempre extrema. Antes que este desvio e desvario popular chegue a outros povos na Europa, convém prevenir, exactamente para não ter de remediar. É que à certeza da interferência russa, junta-se agora a certeza da prepotente interferência (ou da cruel indiferença) americana.
Quem nos informa sabe do que fala e diz que assim é. E não há que duvidar da cultura e da perspicácia de alguns dos que nos informam: houve até uma jornalista que, lendo os escritos do Papa Francisco, louvou o seu humor ao comparar a dificuldade de “um rico entrar no reino dos Céus, com a de um camelo passar pelo buraco de uma agulha.”
Pobres ricos, pobres camelos, pobres pobres, pobres de nós, os informados e formados por quem passa pelos buracos, pelos vistos bem largos, das agulhas da instrução e da cultura geral.
Às vezes parece não ser possível conter, refrear, por um lado a máquina da propaganda (que há cinquenta e um anos nos assegura a bondade e excelência do regime e nos garante a perenidade dos seus princípios e da sua classe política), por outro, a ignorância de alguns dos porta-vozes desta nomenclatura partidária tecnoburocrática e dos seus instrumentos mediáticos (que os torna orgulhosamente convictos das fantasias que repetem).
De resto, já nem vai sendo preciso que nos assegurem e se assegurem da bondade e da integridade de alguns políticos, porque parece ter-se já perdido, de forma generalizada, aqueles mínimos de pudor, ou até de hipocrisia, que eram, segundo Santo Agostinho, “a última homenagem que o vício prestava à virtude”.
Isto vê-se, por exemplo, na ousadia de alguns dirigentes que já se permitem declarar, em voz alta e pública, que a direita deve ter cuidado com o modo como quer restringir os direitos dos imigrantes porque estes, “em cinco anos vão ter a nacionalidade e o direito de voto, e os seus filhos já nascem portugueses”. Já não há, assim, grande lugar para dúvidas quanto à “substituição populacional” que a própria Esquerda vem admitir como objectivo… mais eleitoralista do que humanista.
É ver a reportagem da Now sobre os arrendamentos em Lisboa de lojas de conveniência, capa para lavagem de dinheiro e para outros negócios, como o tráfico humano, de que os imigrantes que por cá passam são as principais vítimas, tudo com a conivência interessada, a vista grossa ou negligência danosa do Estado português, sob uma retórica de bons sentimentos.
Combater este dolo muito real – a cumplicidade no tráfico e no crime a par da perda de identidade nacional, a nossa e a de outros Estados europeus, com os picos de alta tensão que prometem – e criar planos de contingência deviam ser das grandes preocupações políticas do presente. Porque uma coisa é certa: apagar, obscurecer ou distorcer a realidade para glorificação do regime não é, nunca foi nem nunca será um bom caminho para a enfrentar.
O apagão, em plena pós-comemoração cinquentenária, devia-nos fazer pensar nisso.