quinta-feira, 22 de maio de 2025

As Eleições Autárquicas em 2001

As Eleições Autárquicas em 2001 em Contexto Político Nacional

Desde 1995 António Guterres chefiava o Governo (XIV Constitucional) – primeiro com maioria absoluta e, a partir de 1999, como governo minoritário. Nas legislativas de Outubro de 1999 o PS obteve 115 deputados, empatando com a soma dos restantes partidos no parlamento ; o Presidente Sampaio chegou a alertar que aquela “tragédia” parlamentar acabaria por trazer instabilidade. O governo Guterres passou a depender de acordos pontuais para aprovar o Orçamento, recorrendo a negociações heterodoxas – ficou célebre, por exemplo, o acordo com um deputado do CDS que exigiu apoios locais (uma fábrica de queijo Limiano) em troca de abstenção, viabilizando os orçamentos de 2001/02 . Internamente, a liderança socialista encarava críticas veladas: no congresso de Maio de 2001 Guterres foi reeleito secretário-geral sem oposição, mas já se sentia no ar um “ar de fim de ciclo” . O próprio primeiro‑ministro reconhecia desgaste: confidenciou a Sampaio que “o país zangou‑se comigo” e que precisava “reconciliar-se com as pessoas” Ao longo de 2000/2001 o executivo foi abalado por escândalos políticos (como o das chamadas “viagens‑fantasma” que envolveu deputados e governantes) e por sucessivas renúncias ministeriais  . Esse acúmulo de controvérsias (e a forte oposição do PSD de Durão Barroso) criou um clima de oposição ao governo dentro e fora do PS, preparando o terreno para a crise.

Resultados das Eleições Autárquicas de 2001

As eleições autárquicas de 16 de dezembro de 2001 foram um fracasso histórico para o PS. A nível municipal, o PSD obteve vitórias em várias câmaras antes controladas pelos socialistas. Destacam‑se, em particular:
Lisboa: Santana Lopes (PSD) conquistou a câmara, derrotando a coligação de esquerda que governava a cidade .
Porto: Rui Rio (PSD) venceu o socialista Fernando Gomes na câmara do Porto .
Sintra: Fernando Seara (PSD) triunfou sobre a socialista Edite Estrela em Sintra .
Além disso, o PS perdeu outras capitais de distrito (Coimbra, Faro, Setúbal, entre outras) e 14 câmaras em relação a 1997. O PSD, por seu lado, ganhou 159 municípios (número recorde), incluindo as grandes cidades acima. Em suma, o Partido Socialista foi o grande derrotado do pleito . Essa derrota em centros urbanos simbólicos foi interpretada como um sinal claro de rejeição popular ao governo. Em apenas meia hora após o fechamento das urnas Guterres anunciou ao país que pediria demissão para “evitar que o país caísse num pântano político”, indicando que reconheceu o peso político dos resultados.

…e António Guterres Anuncia a Demissão

Na tarde de 17 de dezembro de 2001 Guterres anunciou formalmente que apresentaria ao Presidente da República o pedido de demissão do cargo de primeiro‑ministro. Na entrevista coletiva pós‑eleições, ele justificou que deixava o cargo “para evitar que o país caia num pântano político”. Guterres declarou ainda que não buscava vantagens pessoais, afirmando ter “no ambitions” e que sua decisão “o tranquiliza”. Segundo Guterres, prosseguir com um “governo de derrotados” seria danoso para a democracia e para o próprio Presidente. Em seguida, no Palácio de Belém, formalizou a renúncia perante o Presidente Jorge Sampaio. O anúncio ficou marcado por essa expressão do “pântano político”, que foi amplamente destacada na imprensa como símbolo do fim do XIV Governo Constitucional.

Impacto Imediato e Consequências Políticas

A demissão de Guterres teve desdobramentos rápidos. O Presidente Sampaio dissolveu a Assembleia da República e convocou eleições legislativas antecipadas para 17 de março de 2002. O PS elegeu então Ferro Rodrigues como novo líder e candidatou‑se ao pleito, mas foi derrotado pelo PSD de Durão Barroso – que formou coligação com o CDS para governar. Assim, encerrava‑se o ciclo do PS no poder iniciado em 1995. Na prática, a saída de Guterres pôs fim ao XIV Governo Constitucional e deixou o PS na oposição nos anos seguintes. Quanto ao próprio Guterres, ele distanciou‑se da política interna e dedicou-se à carreira internacional: tornou‑se presidente da Internacional Socialista e, pouco depois, Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados, consolidando sua projeção mundial. Em suma, o episódio provocou uma redefinição imediata do mapa político (novas eleições e governo) e marcou o fim da era Guterres em Portugal, dando lugar a nova liderança no PS e ao retorno do PSD ao Executivo.