As Eleições Autárquicas em 2001 em Contexto Político Nacional
Desde
1995 António Guterres chefiava o Governo (XIV Constitucional) – primeiro com
maioria absoluta e, a partir de 1999, como governo minoritário. Nas
legislativas de Outubro de 1999 o PS obteve 115 deputados, empatando com a soma
dos restantes partidos no parlamento ; o Presidente Sampaio chegou a alertar que aquela
“tragédia” parlamentar acabaria por trazer instabilidade. O governo Guterres
passou a depender de acordos pontuais para aprovar o Orçamento, recorrendo a
negociações heterodoxas – ficou célebre, por exemplo, o acordo com um deputado
do CDS que exigiu apoios locais (uma fábrica de queijo Limiano) em troca de
abstenção, viabilizando os orçamentos de 2001/02 . Internamente, a liderança socialista encarava críticas
veladas: no congresso de Maio de 2001 Guterres foi reeleito secretário-geral
sem oposição, mas já se sentia no ar um “ar de fim de ciclo” . O próprio primeiro‑ministro reconhecia desgaste:
confidenciou a Sampaio que “o país zangou‑se comigo” e que precisava
“reconciliar-se com as pessoas” Ao longo de 2000/2001 o executivo foi abalado
por escândalos políticos (como o das chamadas “viagens‑fantasma” que envolveu
deputados e governantes) e por sucessivas renúncias ministeriais . Esse acúmulo de
controvérsias (e a forte oposição do PSD de Durão Barroso) criou um clima de
oposição ao governo dentro e fora do PS, preparando o terreno para a crise.
Resultados das Eleições
Autárquicas de 2001
…e António Guterres Anuncia a
Demissão
Na tarde de 17 de dezembro de 2001 Guterres anunciou formalmente que apresentaria ao Presidente da República o pedido de demissão do cargo de primeiro‑ministro. Na entrevista coletiva pós‑eleições, ele justificou que deixava o cargo “para evitar que o país caia num pântano político”. Guterres declarou ainda que não buscava vantagens pessoais, afirmando ter “no ambitions” e que sua decisão “o tranquiliza”. Segundo Guterres, prosseguir com um “governo de derrotados” seria danoso para a democracia e para o próprio Presidente. Em seguida, no Palácio de Belém, formalizou a renúncia perante o Presidente Jorge Sampaio. O anúncio ficou marcado por essa expressão do “pântano político”, que foi amplamente destacada na imprensa como símbolo do fim do XIV Governo Constitucional.
Impacto Imediato e
Consequências Políticas
A
demissão de Guterres teve desdobramentos rápidos. O Presidente Sampaio
dissolveu a Assembleia da República e convocou eleições legislativas
antecipadas para 17 de março de 2002. O PS elegeu então Ferro Rodrigues como
novo líder e candidatou‑se ao pleito, mas foi derrotado pelo PSD de Durão
Barroso – que formou coligação com o CDS para governar. Assim, encerrava‑se o
ciclo do PS no poder iniciado em 1995. Na prática, a saída de Guterres pôs fim
ao XIV Governo Constitucional e deixou o PS na oposição nos anos seguintes. Quanto
ao próprio Guterres, ele distanciou‑se da política interna e dedicou-se à
carreira internacional: tornou‑se presidente da Internacional Socialista e,
pouco depois, Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados, consolidando
sua projeção mundial. Em suma, o episódio provocou uma redefinição imediata do
mapa político (novas eleições e governo) e marcou o fim da era Guterres em
Portugal, dando lugar a nova liderança no PS e ao retorno do PSD ao Executivo.