O PRINCíPIO DO FIM - Há 50 anos, a 5 de Setembro de 1975, acontecia a primeira grande derrota do PCP, o princípio do fim do PREC. Tratou se da Assembleia do MFA ou também conhecida, entre os derrotados como o pronunciamento de Tancos.
Em Setembro, o governo comunista de Vasco Gonçalves estava moribundo, sem qualquer força política. Costa Gomes quando o nomeou alertou que seria um governo a prazo. Ainda com a legitimidade revolucionária a sobrepor-se à legitimidade democrática, o governo, mesmo que provisório, não possuia qualquer representatividade política, ao invés era um governo de um único partido, o PCP.
Infelizmente isso não significou, no imediato, uma travagem nas nacionalizações, ocupações de terras, saneamentos ou prisões sem validação de um juiz e na maioria dos casos com mandados de captura em branco. Desde que o PS e PSD tinham saído do Governo, o PCP sentia que teria pouco tempo para transformar Portugal no país dos Sovietes. Costa Gomes foi claramente o seu maior cúmplice e ainda hoje não sabemos o propósito, se para permitir a entrega de Angola aos comunistas do MPLA, se para garantir que todo o Alentejo se tornava numa enorme Unidade Cooperativa de Produção: em Julho, Agosto e Setembro ocuparam-se mais de 200 mil hectares ou para terminarem o processo de nacionalizações: a CUF, a Petroquímica, as Pirites Alentejanas, a Companhia das Lezírias ou a Covina ( Ind Vidreira), a Setenave ou os Estaleiros de Viana do Castelo foram nacionalizados no mês de Agosto ou principio de Setembro de 1975.
Foi a maior tragédia económica que atingiu Portugal desde o início da sua história moderna. O Portugal teve uma quebra real do PIB per capita de 6,7% em 1975, depois de já ter caído mais de 1,3% em 1974.
E assim foi
No início de setembro de 1975, o Presidente da República Costa Gomes propõe aos três ramos das forças armada nomear Vasco Gonçalves, então primeiro-ministro, como Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA), retirando-lhe desta forma a chefia do governo.
A proposta teve a oposição do Exército e da Força Aérea, já que a Marinha mantinha o seu espírito revolucionário e estava indefetível ao lado de Vasco Gonçalves.
Face à falta de consenso, foi sugerido que a proposta viesse a ser apresentada numa Assembleia do MFA. Para isso seria necessário fazer Assembleias preparatórias para cada um dos ramos das Forças Armadas,
As reuniões preparatórias decorreram em cada ramo das Forças Armadas. A do Exército, foi a mais tumultuosa e com muitos detalhes, já que foram precisas duas Assembleias para se chegar ao resultado final.
Vasco Gonçalves, embora lutando energicamente, de forma estridente até ao fim, sentiu a ausência de apoio e saiu derrotado. Proferiu um discurso longo, cerca de 40 minutos, resignado, e renunciou ao cargo de CEMGFA. Assim, depois de altos e baixos, ganhou a linha próxima dos moderados.
O Grupo dos Nove tinha organizado cuidadosamente os encontros, com o objetivo de bloquear a nomeação de Vasco Gonçalves na chefia das Forças Armadas, aprovar a recomposição da Assembleia que lhes daria maioria e por fim impôs o afastamento de alguns membros comunistas do Conselho da Revolução, contrariando a hegemonia do PCP. Foram também votados nomes para o Conselho da Revolução, sendo excluídos Vasco Gonçalves, Corvacho, Miguel Judas, Costa Martins e outros oficiais próximos dos comunistas, numa proporção de 9 para um. Otelo foi curiosamente um aliado dos moderados no combate ao PCP. Nem sabia ele, que para o Pais recuperar o caminho da Democracia seria o COPCON o próximo alvo a neutralizar.
No dia seguinte, reuniram-se também as assembleias da Armada e da Força Aérea. Enquanto a segunda estava alinhada com o Exército e o Grupo dos Nove, a da Armada manteve-se, como sempre, fiel a Vasco Gonçalves.
Na Assembleia do MFA, já reunindo os três ramos, Os Nove afastaram definitivamente Vasco Gonçalves da liderança das Forças Armadas, recompuseram o Conselho da Revolução e consolidaram a sua influência, marcando a derrota definitiva dos "gonçalvistas" e reduzindo em muito o peso do PCP no Conselho da Revolução.
Os moderados vencem a batalha de Tancos. Recompõem o Conselho da Revolução, que passa a contar com apenas três elementos ligados ao PCP, entre eles Rosa Coutinho, militar de má memória quer para os Portugueses quer para os Angolanos. Os mais ativos oficiais gonçalvistas caem no meio da refrega. Otelo inebriado com a vitória e inoportuno como sempre, reclama:
“Agora é preciso que aprendamos todos, que nos esforcemos por aprender aquilo tudo que não nos quiseram ensinar, ao longo dos anos. É preciso que os tipos do 25 de Abril saibam qual é o caminho.
Como descrito mais tarde pelo historiador José Freire Antunes “Expansivo e inábil, Otelo continua a saber exprimir, como ninguém, toda a fragilidade dos militares atirados para a fogueira da política.”
Em Tancos morre o gonçalvismo, mas não o PCP, mesmo que tenha saído fortemente abalado. O PPD reclamou o fim do Conselho da Revolução, ao mesmo tempo que reclamava ir armar 50 mil homens, mas a luta transferiu-se para outra arena - a rua, e é cada vez mais radical. A norte, ardiam sedes do PCP, atacadas por populares com algum apoio da Igreja, principalmente na zona de Braga. Por cada tentativa de assalto, os militantes comunistas reagiam ao tiro, o que demonstrava que o PCP já estava armado. Dois meses depois o País assistiu ao cerco da Assembleia da República por parte de forças afetas ao PCP, talvez a maior intimidação coletiva exercida sobre um órgão de soberania. Cerca de 90 dias depois assistiria a uma tentativa de golpe de Estado liderada pelo PCP e com a participação inequívoca de Otelo, com intervenção direta, precisamente sobre as tropas que estavam estacionadas na base de Tancos. Mas isso é outra história e iremos lá mais tarde.
(Manuel Castelo Branco)


