Estamos a assistir não apenas ao declínio da esquerda tradicional, mas também ao fim do sistema de bastidores que governou o país com alternância previsível entre dois partidos. O vazio que se abriu foi ocupado por uma nova força política que soube vestir a pele do antissistema.
O paradoxo é este: o que os média acreditaram ser o antídoto contra o CHEGA, pode muito bem ter-se tornado no seu principal aliado de crescimento.
As sondagens mais recentes, como a da Intercampus, confirmam duas realidades que se cruzam no presente político português:
O desgaste profundo do PS e a falta de uma alternativa clara no PSD.
O desaparecimento da esquerda radical como força eleitoral relevante.
O BE já não é novidade; o PCP perdeu bases sociais e influência sindical. A chamada extrema-esquerda sobrevive mais no tempo de antena mediático do que nas urnas. Essa deslocação do peso da política para os comentadores é, por si só, sinal de decadência.
O CHEGA e a revolta de duas gerações
Nesse vazio, emerge o CHEGA. É verdade que tem uma base sólida entre os mais velhos (acima dos 70 anos), mas também consegue atrair uma franja jovem, desiludida com a política tradicional e que encontra nas redes sociais um espaço de mobilização.
Para ambos, o denominador comum é a sensação de que o sistema faliu: a alternância previsível entre PS e PSD/CDS deixou de oferecer respostas.
Há uma ironia difícil de ignorar: a hostilidade militante dos chamados “média de referência” contra o CHEGA acabou por ser um combustível inesperado.
Nos mais velhos, provocou um reflexo de defesa: sentiram que o partido é alvo de uma perseguição injusta e, por isso, merece ser protegido.
Nos mais jovens, gerou uma atitude de desafio: se os jornalistas do regime o demonizam, então talvez seja precisamente essa a alternativa que quebra o conformismo.
Em ambos os casos, aquilo que pretendia ser confronto e exclusão transformou-se em legitimação e curiosidade.