sábado, 14 de junho de 2025

O que nos une e que nos querem que esqueçamos!

À semelhança do que se passou nas Forças Armadas e na guerra, a Cerimónia da XXXIII Homenagem aos Combatentes da Guerra do Ultramar teve sempre portugueses de todas as cores, raças e credos religiosos. O que nos unia, aos que fomos para a guerra, era a defesa do que então considerávamos território nacional. Dizer-se que “muitos dos que lá morreram não concordavam com aquela política de defesa do Ultramar” é esquecer que os que não concordavam podiam sempre ser refráctários e evitar o serviço militar – e houve bastantes que o fizeram – ou, depois de lá estarem, desertar – e também houve alguns.
Mas a maioria, à volta de um milhão em 14 anos, foi, serviu e voltou. Morreram mais de nove milhares, cujos nomes estão inscritos nas paredes do Forte do Bom Sucesso que rodeiam o lago. Em 1975, já no caos do PREC, ainda lá ficaram umas dezenas.

Também nas fileiras, em Angola, na Guiné e em Moçambique, serviram muitos jovens do recrutamento local, na sua maioria negros. Em 1974, nas vésperas do 25 de Abril, dos cerca de oitenta mil militares portugueses em Angola, metade era desse recrutamento local; em Moçambique, em cerca de setenta mil, eram mais de metade; e na Guiné eram um terço dos 36 mil que compunham as forças portugueses.
Ora em Moçambique e na Guiné, muitos destes combatentes eram muçulmanos, e as suas convicções religiosas não os impediram de combater por Portugal. E muitos morreram.
Por isso, a partir de 2005, nos encontros do 10 de Junho dos Combatentes passou-se a realizar uma cerimónia religiosa mista, em que o xeique Munir, imã da Mesquita de Lisboa, juntamente com um sacerdote católico, rezavam em memória dos caídos. É, portanto, uma cerimónia inter-religiosa que se realiza há mais de 20 anos, decorrendo sempre no maior respeito e unidade. 
Foi, por isso, com grande surpresa e indignação que, na terça-feira, 10 de Junho, depois da oração conjunta do xeique Munir e do capelão militar católico, se ouviram de dois intrusos uma série de impropérios insultuosos contra o Xeique.
Houve surpresa e houve indignação. Os provocadores foram mandados calar pela assistência e foram depois retirados pela PSP. 
A este incidente juntaram-se outros insultos dispersos contra um candidato a Presidente da Republica, estes vindos, aparentemente, de alguns “negacionistas” presentes, acusando-o de, com as vacinas, ter contribuído para a morte de muitos portugueses.

Foi o que bastou para que as cadeias de televisão entrassem em excitação e se precipitassem para “cobrir” o acontecimento. Ignorando, tanto como os arruaceiros, que a cerimónia inter-religiosa era ali uma tradição de há mais de vinte anos, os insultos e o par de provocadores que os proferira foram redimensionados, amplificados e generalizados, dando a entender que, entre os antigos combatentes, havia um grupo racista e fundamentalista que queria correr com o Islão entre saudações nazis. E que confundia o Islão com o jihadismo, que, como é sabido, tem feito mais vítimas entre muçulmanos do que entre cristãos.
(Jaime Nogueira Pinto)