domingo, 25 de agosto de 2024

ardeu o Grandella

25 de agosto de 1988. São cinco e meia da manhã e milhares de bombeiros já estão a caminho dos Armazéns Grandella, a fim de apagar as chamas que consomem os edifícios que fazem parte do mesmo, e que atingiram as ruas do Carmo, Nova do Almada, Garrett, Crucifixo, Ouro e Calçada do Sacramento. Durante as horas que se seguiram, e os dias, aglomeraram-se habitantes, comerciantes e curiosos a fim de ajudar ou unir-se em solidariedade pelas perdas, que varreram várias casas icónicas como a Pastelaria Ferrari ou as primeiras mercearias da Jerónimo Martins
O espaço levava o nome do seu fundador, Francisco de Almeida Grandella, nascido em Aveiras de Cima, em 1852, uma referência do comércio lisboeta e da capital do princípio do século XX. Além de maçom e filantropo, "era um empresário à maneira moderna, introdutor dos grandes Armazéns Grandella em Lisboa, um destacado republicano (...)" revela Isabel Xavier, presidente da Associação Património Histórico de Lisboa, na reportagem da RTP de Filipa Simas "O Grandella do Chiado". "Projetados pelo francês Georges Demaye, especialista em arquitetura do ferro, que, inspirado nos armazéns franceses Samaritaine, adoptou para estes armazéns em Lisboa uma estrutura de ferro fundido, seguindo o gosto pela Arte Nova.
À data da sua inauguração, estes armazéns foram considerados uma obra vanguardista e sinal de elegância e luxo. A primeira versão dos luxuosos Armazéns Grandella inaugurou precisamente em 1907, 28 anos depois de Francisco Grandella abrir as Fazendas Baratas, uma pequena loja na rua da Prata. Ergueu-se, assim, um edifício de duas fachadas, com acessos
pela Rua do Ouro, onde Grandella já tinha um estabelecimento comercial, e pela Rua do Carmo (num total de 11 andares a partir da Rua do Ouro e em 6 pisos a contar da entrada da Rua do Carmo). "A fachada da Rua do Carmo, andar nobre da casa, exibia um relógio monumental, onde duas figuras de ferreiros batiam as horas, o qual encimava dois baixos-relevos representando a Verdade e o Comércio. As colunas entre as portas ostentavam medalhões esculpidos na cantaria com o lema da casa: 'Sempre por bom caminho e segue'"

O projeto arquitectónico da reconstrução do Chiado foi, depois, entregue ao arquitecto Siza Veira. Após a sua recuperação, os armazéns reabriram ao público em 1996, mas seguindo um novo modelo de funcionamento, integrando grandes lojas mais modernas. A sua fachada da Rua do Carmo recriou o famoso relógio monumental, as figuras da Verdade e do Comércio, bem como os medalhões esculpidos com o lema da casa.

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

o Fenómeno Kamala

Candidata tem mensagem "curta", mesmo com élan da Convenção Democrata. 
Com desistência de Kennedy, "eleição vai ser disputada em pequenos nichos".
(Vasco Rato, ex-presidente da FLAD)

domingo, 18 de agosto de 2024

Lusa, a nossa agência “noticiosa”

vale certamente a pena que a Lusa explique aos seus accionistas, ou seja a todos nós, quais os seus critérios para o uso de aspas. Ficava tudo mais claro, o que é naturalmente de agradecer.

“Milhares de opositores reclamam por “verdade” e Maduro mobiliza caravana motorizada”. Esta verdade entre aspas usada no texto da Lusa logo replicado em várias notícias é um bom símbolo da forma como a agência Lusa nos mostra o mundo: os opositores a Maduro pedem “verdade”. Cautelosa a nossa Lusa coloca verdade entre aspas porque como é mais que óbvio quem pede verdade pode estar a mentir e portanto usam-se aspas, faz-se uma citação e fica tudo acautelado. Curiosamente ao mesmo tempo que coloca aspas na verdade exigida pelo opositores a Maduro, a nossa Lusa (sim, todos nós contribuintes somos obrigatoriamente accionistas da Lusa) escreve sem aspas “Mortos em Gaza ultrapassam os 40.000″ A fonte deste número é

o Ministério da Saúde de Gaza controlado pelo Hamas, que para a nossa Lusa merece uma credibilidade várias vezes superior à oposição venezuelana e portanto está dispensado de ter as suas declarações entre aspas.

Nada disto espanta na Lusa. O que espanta e deve suscitar perguntas é a opção do Governo de Luís Montenegro de enterrar ainda mais dinheiro dos contribuintes na Lusa. Note-se que o Estado português já era maioritário na Lusa, mas os 50,15% que aí detinha passaram em Julho deste ano a 96 % quando o Governo de Luís Montenegro comprou as participações da Global Media e da sua accionista maioritária Páginas Civilizadas no capital da Lusa. Não sei quais os planos governamentais para a Lusa mas, para começar, vale certamente a pena que a Lusa explique aos seus accionistas, ou seja a todos nós, quais os seus critérios para o uso de aspas. Ficava tudo mais claro, o que é naturalmente de agradecer. (Helena Matos em “A política vice-versa”]


quinta-feira, 15 de agosto de 2024

António de Bulhões

No ano de 1195, neste ditoso dia [15 de Agosto], governando a Barca de São Pedro, Celestino III, o Império do Oriente Isaque Ângelo, o do Ocidente Henrique V, e o Reino de Portugal Dom Sancho I. Nasceu em Lisboa, famosíssima Capital do mesmo Reino, o glorioso e portentoso Santo António. Foram seus Pais, Martim de Bulhões e Dona Teresa Taveira, ambos de claríssima nobreza e de estremada virtude. Viviam junto da Igreja Catedral de
Lisboa, em casas que vemos convertidas em um asseadíssimo Templo, fábrica moderna dos Reis Dom João II e Dom Manuel, como se vê no letreiro que corre no arco da porta principal, cujas letras, por serem cortadas com artifício em pedaços de ramos e outras figuras alheias da escritura, não são muito conhecidas, formam estas palavras: Joannes II. Emmanuel I. Reges hoc opus construxerunt. É Igreja do Padroado Real, isenta do Ordinário por privilégio da Santa Sé Apostólica, administrada pelo Senado da Câmara. É hoje tão rica, tão perfeita, tão asseada, tão vistosa, e tão bem servida, que faz competência com as melhores de Portugal. Tem para seu serviço e ornato mais de cem mil cruzados de prata lavrada, dizem-se na mesma Igreja cada ano mais de trinta e duas mil Missas.
Pe. Francisco de Santa Maria in «Ano Histórico, Diário Português: Notícia Abreviada de pessoas grandes e coisas notáveis de Portugal», 1744.

sábado, 10 de agosto de 2024

a tradição parece ter deixado de ser o que era...

Donald Trump podia ter escolhido Nikki Haley, mulher e republicana moderada, ou Tim Scott, senador negro do Sul, para “equilibrar” a sua candidatura, mas preferiu consolidar o seu popular “populismo” com um dos representantes do nascente “populismo intelectual”: o “branco pobre” dos Apalaches, famoso pela sua Era Uma Vez um Sonho (Hillbilly Elegy), James David "JD" Vance que protagonizava uma história de sucesso muito americana – serviço nos Marines com uma passagem pelo Iraque em guerra que o desiludira quanto à cruzada neoconservadora para exportar a democracia, Yale, sucesso empresarial, conversão ao catolicismo e sensibilidade ao nacionalismo, aos reveses da emigração desregulada e ao solidarismo social do pós-liberalismo norte-americano. E pensamento articulado, coisa rara nos dias que correm – na política e na América.
Kamala Harris
tinha, na sua short list, três candidatos a vice: 
Mark Kelly, senador do Arizona, Josh Shapiro, governador da Pensilvânia, e Tim Walz, governador do Minnesota. O curriculum de Kelly tinha tudo para conquistar conservadores e independentes: aviador de combate na guerra do Golfo e astronauta, e eleição e reeleição para o Senado pelo Arizona em 2020 e 2022, uma proeza num Estado que desde 1962 era republicano. Mas, aparentemente, Kelly não era suficientemente “normal” para normalizar o progressismo de Kamala Harris.
Joshua David Shapiro, congressista pela Pensylvania, eleito Procurador-Geral pelo Estado entre 2017 e 2023, onde dirigira com rigor as investigações sobre os abusos sexuais na Igreja Católica, e Governador da Pennsylvania em 2023, também tinha um bom curriculum.  E seria o primeiro judeu praticante a entrar na Casa Branca como vice da primeira mulher “negra” presidente.  Pena que na crise nascida dos ataques do Hamas em 7 de Outubro Josh se tivesse revelado crítico das manifestações anti-judaicas e pró-palestinianas nas universidades americanas. Era preciso alguém mais “normal.”
e o escolhido foi
Tim Walz, que vinha, não para equilibrar mas para exponenciar o progressismo de Kamala; um homem que, com a propaganda adequada,  podia convencer os conservadores mais distraídos, passando maravilhosamente por americano médio, por cidadão comum, por um afável “moderado” cuja branquitude, a masculinidade, a pertença à classe média e as “piadas à pai de família” dissociariam o ticket democrata das políticas radicais que o mesmo Walz tinha vindo a promover e que vinham afastando a Esquerda…do “cidadão comum”. 
Assim, com este recurso à “normalidade”, diluía-se o dilema de uma esquerda “too woke to connect with voters” ou em claro processo de desconexão com o povo trabalhador; uma esquerda que, assim, não teria já de escolher entre a “wokeing class” e a “working class”.


a “desinformação” e a informação "deles"!

[o social fascismo, ou o nacional socialismo, renascem na Grã Bretanha e assim se percebe porque é que os próprios chamam os outros de extrema-direita]
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Desculpem a longa citação, a qual, só para que fique claro, não é o péssimo monólogo de um péssimo vilão num péssimo filme. Ou, bem vistas as coisas, se calhar é.
O crime de incitamento ao ódio racial envolve a publicação ou a distribuição de material ofensivo ou abusivo, que pretende ou é capaz de alimentar o ódio racial. Assim, se alguém “retweeta” isso, se partilha isso, potencialmente comete esse crime. E nós temos agentes da polícia exclusivamente dedicados a vigiar as redes sociais. O trabalho deles é procurar material do género, e depois accionar processos de identificação, detenções e por aí fora. É algo de muito sério. As pessoas pensam que não estão a fazer nada de mal. Estão. E sofrerão as consequências.

O autor das afirmações acima chama-se Stephen Parkinson e, desde Novembro de 2023, manda no Crown Prosecution Service, uma espécie de Ministério Público da Inglaterra e Gales. As crianças e os ingénuos terminais acharão louváveis as intenções do homem, que afinal, coitadinho, apenas quer impedir o “racismo” e punir os “racistas”. Mas quem não se ri à menção da palavra “hemorróidas” percebe que o objectivo é outro.

O objectivo do sr. Parkinson é proibir a divulgação de opiniões e informações não devidamente filtradas sobre a guerra civil que se cozinha na terra dele. A propósito de guerra civil, Elon Musk usou a expressão no mesmo contexto e inspirou uma onda de indignação e exigências para que se abolisse o Twitter e, idealmente, o próprio Musk. Na Venezuela, o ogre local já atingiu metade dos desígnios (e, a fim de alcançar a metade restante, desafiou o bilionário americano para um encontro de porrada com transmissão ao vivo). O Reino Unido vai a caminho, e por enquanto desatou a prender cidadãos por “espalharem desinformação”.
O conceito de “desinformação” é um primor. Em primeiro lugar, é espantoso que seja o Estado, fonte suprema de confiança, a decidir o que a ralé deve afirmar ou consumir. Em segundo lugar, é extraordinário que simulacros de jornalistas saltitem de alegria perante a imposição da censura. Em terceiro lugar, é de censura que se trata, e um regime onde vigora a censura não é um regime democrático. Ao reduzir a questão a um confronto da “verdade” com a “mentira”, a ortodoxia no poder esquece-se de referir um pequeníssimo pormenor: o de que a decisão acerca do que é verdadeiro é sempre deles, e só nós mentimos. Quando os factos dependem de quem detém a força, os factos morreram. E a liberdade também.

O sr. Parkinson fala em “ódio racial”. Na verdade, que como se vê é um anacronismo, o que, nas entrelinhas do seu cérebro funcionário, o sr. Parkinson realmente diz e realmente deseja erradicar é “frases, imagens, palpites desagradáveis para com muçulmanos, certas minorias étnicas ou peculiaridades sexuais ou físicas que esteja na moda acarinhar”. A título de exemplo, não tenho notado as autoridades do Reino Unido demasiado preocupadas com o ódio aos judeus, no recato da internet, nos protestos de rua e, às vezes, no lombo do judeu mais à mão. É possível que considerem os apelos à extinção de Israel e ao extermínio dos seus habitantes uma manifestação de carinho e, sobretudo, uma aspiração genuína e factualmente inatacável. Não sei. Eles, por definição, é que sabem. E decidem em conformidade.

Se tamanha miséria se resumisse ao Reino Unido, a miséria seria suportável: não ponho lá os pés há 18 anos, e há 22 que evito Londres com intenso zelo. O que me interessava naquelas paragens ou desapareceu ou prepara-se para desaparecer ou resiste em doses insuficientes. A chatice é que os ataques à civilização não se esgotam ali. Na América, país com que mantenho uma relação próxima e tumultuosa, há agora um candidato a vice-presidente convicto de que a liberdade de expressão não inclui o “discurso de ódio”, ou seja, o que ele e os comparsas dele decidem ser “discurso de ódio”. Suponho que, se a dona Kamala for eleita em Novembro, explicar ao sr. Tim Walz que os rapazes não menstruam engrossará a lista de crimes passíveis de cadeia. Porém, incendiar e saquear cidades a pretexto de “injustiça social” candidatará o criminoso a uma medalha por actos cívicos.

Os ventos gelados da censura, naturalmente seleccionada, e da submissão, evidentemente orientada, sopram no Ocidente inteiro, por acaso o pedaço do mundo que, após séculos de cabeçadas, conseguira arranjar um lugar humano para o indivíduo na sociedade, e um equilíbrio sofrível entre direitos e obrigações. Foi, compreendemos hoje, um equilíbrio precário, que durou por alto meia dúzia de décadas e deixará saudades. Minto: não deixará saudades a toda a gente. É escusado visitar o estrangeiro para sentir o apetite de tantos por restrições, mordaças, castigos. Portugal, o Portugal institucional e o Portugal anónimo que, da esquerda à direita, se manifesta nas “caixas” de comentários, rebenta de apelos a tempos menos livres. Talvez essas criaturas imaginem que, no divertido exercício da opressão, lhes caberá a parte de cima, e não lhes ocorre a enorme probabilidade de acabarem em baixo.


quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Olivença!

O património português de Olivença integra parte do que de melhor se encomendou em Portugal nos séculos XVI, XVII e XVIII. A Igreja de Santa Maria Madalena, uma magnífica peça manuelina, apresenta na fachada um portal que é considerado uma das mais belas peças do primeiro Renascimento em Portugal. A Igreja de Santa Maria do Castelo, mandada erguer por Filipe I de Portugal sobre as ruínas da igreja templária da vila, é um exemplo perfeito de uma igreja-salão, adornada, já no séc. XVIII, com um impressionante altar-mor e com a maior Árvore de Jessé da Península Ibérica. A Capela da Misericórdia é um encantador exemplo da arte azulejar e de talha portuguesas. A torre de menagem da muralha de D. Dinis foi uma das mais altas do reino de Portugal.

domingo, 4 de agosto de 2024

As palavras têm um significado e não é por grande parte da esquerda e da imprensa portuguesa não o discernir que elas deixam de o ter. A ignorância e o preconceito nada desculpam.

É necessário entender de vez o que foi o fascismo de modo a não o confundir com as direitas democráticas que despontam hoje. Digo isto para evitar as costumeiras asneiras que povoam as cabeças do público eleitoral português sujeito à mais descarada desinformação e manipulação de que há memória na nossa história colectiva.

O fascismo foi um sistema político ultranacionalista oposto ao cosmopolitismo da modernidade democrática e liberal cujo objectivo foi a transformação da sociedade e do indivíduo, através da ditadura de um partido único, basado numa concepção unitária e global da comunidade nacional. O fascismo quer à força a unidade dos contrários. Caracterizou-se pelo autoritarismo e pelo totalitarismo. O primeiro é o contrário da democracia política e o segundo o oposto da liberdade individual e colectiva. A ditadura que caracterizou o fascismo é antimoderna, repressiva, nacionalista e imperialista. A partir daqui houve várias versões ideológicas; a tradicionalista, como no nosso país, a nacionalista como na Espanha franquista, a «revolucionária» como na Itália mussoliniana e a racista como na Alemanha nazi.

O fascismo foi isto e nada mais. Apareceu, viveu nuns países mais do que noutros, e desapareceu para sempre. Não regressará porque as condições históricas para ele nunca mais existirão. Seria uma aberração nos dias de hoje.

Aquilo a que a esquerda portuguesa chama ainda hoje «fascismo» tem a sua origem numa invenção mal cozinhada pelos ideólogos da III internacional comunista, dita komintern, que, ao sabor de uma nova estratégia, contrária à anterior da «frente única», resolveram, a partir do seu VI congresso, em 1928, adoptar as posições ultraesquerdistas próprias da estratégia da «classe contra classe» e desataram a ver inimigos da classe operária em toda a parte, a que logo chamaram «fascistas», sob os auspícios do camarada Dimitrov, homem de mão de Estaline, cuja boçalidade era proverbial. Viam assim «fascismo» em qualquer partido que a eles se não subjugasse e mesmo aos sociais- democratas alemães passaram a chamar-lhes amorosamente «sociais-traidores», imagine-se! No «fascismo» saído da cabeça dos ideólogos da III internacional (até 1935) cabia tudo. O termo era fácil e barato. Impedia o juízo crítico e escondia a complexidade da realidade.

Foi por isso que o termo se vulgarizou desde muito cedo no nosso país e permaneceu até hoje.

Não queirais pensar pela cabeça do camarada Dimitrov. Não vale a pena desenterrar fórmulas que serviram uma estratégia radical de classe contra classe quando foi considerado oportuno promovê-la para logo ser abandonada a partir do VII congresso da internacional comunista em 1935, já depois do triunfo dos fascismos, que adoptou a estratégia contrária baseada dessa vez nas frentes populares e que tiveram êxito, sobretudo em França; os ex-«fascistas» sociais-democratas passaram a ser forças «democráticas» aliadas.

Ora, aceitar hoje que há «fascistas» a esmo é fazer uma concessão à má-fé e oportunismo. É pactuar com uma expressão que foi escolhida para estupidificar e impedir a compreensão das coisas. E nem serve hoje os propósitos dos verdadeiros comunistas porque os impede de compreender a complexa estrutura do capitalismo actual e sobretudo a difícil estratificação das classes na sociedade fragmentada e pós-tradicional em que vivemos. A estrutura de classes modificou-se muito. Na verdade, a burguesia já não é o que era há oitenta anos e a classe operária tradicional fragmentou-se e quase desapareceu em benefício de uma classe média hegemónica onde estão presentes complexas distinções. Temos hoje uma imensa classe média compósita, transversal a toda a sociedade e com pouca ideologia, lugar de um vastíssimo centro plural e diversificado, sem a consciência de classe de que os comunistas se alimentavam, pilar da estabilidade política e do Estado social.

O fascismo não pesca aqui. E os coitados dos marxistas esbarram contra uma parede para eles intransponível. Lá fora o termo fascismo foi rejeitado há muito por obscurantista, mas cá no país persiste. Não admira. Camarada Dimitrov, tens ainda grandes admiradores «antifascistas» em Portugal. Davam para encher mais que um santuário.

Seja como for, o que é fundamental é entender que os que hoje querem ver «fascistas» em toda a parte, são os mesmo que calaram perante o regime mais criminoso e desumano da história da humanidade, um regime que envergonha a espécie humana, personificado por monstros com o Estaline, Molotov, Vychinsky, Beria, Trotsky, Dimitrov, Mao, Pol Pot, entre tantos outros. É imperativo não esquecer isto.

Chamar «fascista» ao primeiro democrata não comunista é um episódio da luta política? Não. Vindo de onde vem, é um escarro. Chamar fascista a esmo ao primeiro democrata português não socialista é tão infame como dizer, como diz Putin, que são fascistas os nacionalistas ucranianos descendentes dos quase 35 mil judeus que foram assassinados a frio pelos nazis, em Setembro de 1941, em Babi Yar ao pé de Kiev, ou das centenas de milhares de militares ucranianos esmagados no cerco de Kiev pelo exército nazi comandado por Runstedt, em 1941, ou que eram fascistas os mais de 10 milhões de ucranianos que Estaline mandou matar à fome durante o Holodomor, em 1932/3, e sem esquecer os perigosos fascistas cuja fuga para o Ocidente era evitada pelo «muro antifascista» de Berlim.

As palavras têm um significado e não é por grande parte da esquerda portuguesa não o discernir que elas deixam de o ter. 
A ignorância e o preconceito nada desculpam.