sábado, 31 de dezembro de 2022

Bento XVI

Do progressismo teológico ao papel na reforma da Igreja, Ratzinger foi quem durante mais tempo influenciou a maior instituição religiosa do mundo na história contemporânea. Morreu aos 95 anos. Conheça a sua longa vida

Papa Bento XVI - Joseph Aloisius Ratzinger


 

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Uma tristeza profunda que nem o Natal mitiga

A 2 de novembro, dia de finados, decidimos exteriorizar publicamente a nossa tristeza e prolongá-la no tempo. Decisão profundamente ponderada pela Direção Central e pelo Conselho Supremo da Liga dos Combatentes. Ponderada foi, também, a forma como transmitir publicamente o sentimento auscultado, desde há anos, por parte dos Combatentes, quer nas inúmeras cerimónias, convívios e visitas feitas pelos elementos da Direção Central e Direções dos Núcleos por esse Portugal profundo, quer em contundentes cartas e mails anti-governos sistematicamente recebidos. O Estatuto do Combatente, documento histórico ainda não completamente regulamentado nem implementado, foi bem acolhido, mas quedou- -se por medidas de ordem moral e ficou sem tomar qualquer atitude no que se refere aos direitos adquiridos por todos os Combatentes após a publicação da Lei 9/2002, depois profunda e negativamente alterada pela Lei 3/2009 e mantidos, sem alteração, pelo chamado Estatuto do Antigo Combatente. Sublinho que os direitos foram reconhecidos a todos os Combatentes e não apenas aos mais carenciados. Por isso, a posição da Liga dos Combatentes tem sido a da revisão dos direitos adquiridos por todos os Combatentes, sem distinção daqueles a quem a vida veio a sorrir ou daqueles para quem a vida foi madrasta. Todos, ricos e pobres, cumpriram, então, com sacrifício e perda do direito à liberdade e do direito à vida, de armas na mão, um serviço superior ao país que a lei 9/2002 veio a recompensar materialmente. Direito esse que a lei 3/2009 veio a reduzir drasticamente e que serviços como a CGA e Segurança Social reduziram e alteraram para menos, sem qualquer explicação aos Combatentes, que não seja a informação que se trata da aplicação da lei e nada mais. Mas passemos à exemplificação de casos concretos. A lei 9/2002 estabelecia suplementos especiais de pensão e acréscimo vitalício de pensão, para todos os Combatentes, de acordo com o tempo passado em áreas de grande periculosidade, que em média se situavam em cerca de 200 a 300 euros por ano. A Lei 3/2009 veio reduzir e fixar limites mínimos e máximos. Máximo, 150 euros ano, para quem passou mais de dois anos em áreas definidas como de grande perigo, 100 euros ano para quem esteve até dois anos e 75 euros para quem esteve até um ano. Se a redução na Lei 3/2009 foi drástica, a execução da lei foi até hoje incompreensível. Há Combatentes que recebiam 150 euros e recebem hoje 60 euros ano. Há Combatentes que recebiam 75 euros e recebem hoje 36 euros ano. Há Combatentes que ultrapassam o máximo e recebem 180 euros ano! Sobre todos os suplementos recai o IRS! Os Combatentes do quadro permanente deixaram de receber pela Lei 3/2009. Mas há Combatentes do quadro permanente que continuam a receber. Por outro lado, o complemento especial de pensão que se destina aos Combatentes com pensão social, pouco mais de 200 euros mês, passou pela Lei 3/2009 para apenas 3,5% da pensão por cada ano de serviço o que significava cerca de 7 euros/ano. O novo estatuto aumentou o complemento especial de pensão 100%, o que corresponde a cerca de 14 euros! Manifestamente insuficiente. São cerca de 1700 Combatentes nesta situação. A Liga dos Combatentes, nas suas propostas entregues à Assembleia da República e ao Governo, em maio de 2021 e maio de 2022, propôs um vencimento mínimo por mês para estes Combatentes em situação de pobreza evidente, e para os restantes um vencimento mínimo por ano, a atingir em três anos (ver as outras propostas completas na revista «Combatente» e site da Liga). Os restantes Combatentes, cerca de trezentos mil, a que agora acrescem as viúvas (contempladas pela Lei 9/2002 e excluídas pela Lei 3/2009), mantêm-se na situação descrita, recebendo anualmente o que apelidam de “esmola” de outubro, referente ao suplemento especial de pensão uns e outros ao acréscimo vitalício de pensão. É essa situação geral de tratamento indigente e incompreensível quanto à alteração e diferenciação do mesmo, para que mais uma vez se alerta. Nem apoio à saúde, nem o apoio do HFAR tem sido possível, embora as Forças Armadas e o Ministério da Defesa Nacional, tudo tivessem diligenciado para que isso acontecesse. Outros apoios médicos e medicamentosos, nada foram considerados e a taxa moderadora, concedida no Estatuto foi, e bem, extensível a todo o cidadão. Os transportes gratuitos ficaram reduzidos aos transportes terrestres até 32 km da residência e a entrada dos Museus, reduzida a 25 museus nacionais! Regista-se, porém, um esforço para implementar medidas do Estatuto. Alguns dos Combatentes sentem-se recompensados por finalmente serem considerados, por proposta da Liga dos Combatentes, embora 47 anos após o fim da guerra, como “Titulares do Reconhecimento da Nação”. Grande Vitória moral! A generosidade dos Combatentes não tem limites! Cumprem o seu juramento. Mas o sentimento de frustração e de tristeza, constatando que foram votados ao ostracismo, em termos de apoio social e apoio à saúde, é real, quando se sente hoje a preocupação governamental, em termos de orçamento do estado e face à situação atual, de se compensarem todos os cidadãos, onde como é natural se situam os Combatentes, mas sobre os quais se enunciam, mais uma vez, apenas efémeras e teóricas referências. A Liga dos Combatentes vem informando desta situação, desde há anos, quer ao nível da Presidência da República, Assembleia da República, Primeiros-ministros e Ministério últimas propostas da Liga dos Combatentes. Foi atitude unânime manifestar publicamente a nossa tristeza. A maior tristeza do povo manifesta-se no luto. Os Combatentes emanam do povo. A sua grande tristeza manifesta- -se pelo sentimento do luto. No dia 2 de novembro, colocaram na lapela do casaco um laço preto de Homenagem aos Combatentes caídos, em especial aos caídos sem apoio à saúde e sem apoio social. Continuarão usando esse laço preto na lapela do casaco, em cerimónias, convívios e outras atividades públicas, em sinal de tristeza, para não usar outros adjetivos, até que a situação descrita neste editorial seja resolvida. Esta situação não poderá implicar que não passemos tranquilos e evoquemos o Natal, gozando esta Paz teórica, feliz geograficamente, ainda sem tiros, neste canto do mundo à beira mar plantado. Estaremos tristes, mas unidos nos mesmos valores e princípios que a condição militar nos ensinou quando foi necessário defender, de armas na mão, os interesses então considerados superiores do país. Foi isso que nos tornou cidadãos diferentes, e iguais àqueles que se bateram e batem hoje desde a Bósnia à República Centro Africana. Somos aqueles cidadãos diferentes, que na sua juventude, durante anos, perderam a Liberdade e o Direito à Vida. Por isso a nossa esperança continua inabalável. Temos razão e apelamos por justiça. Quem dentro de uns anos falta implementar. É sobre aquilo que falta legislar, e é fundamental, que aqui deixamos o sentimento generalizado dos Combatentes. Entretanto, renasce esperança no caminho a percorrer, ao ouvirmos a Ministra da Defesa Nacional, na tomada de posse do Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional, atribuir primeira prioridade aos assuntos dos Antigos Combatentes e dos deficientes militares que deverão constituir preocupação dominante daquela Direção-Geral de Recursos. A Liga dos Combatentes continuará sempre atenta e disponível. Um outro assunto agudizou a nossa tristeza. O facto da Liga dos Combatentes ter apresentado a sua candidatura, no âmbito do seu Programa Estratégico e Estruturante Liga Solidária, ao Programa aberto pelo Ministério da Segurança Social, para apoio à construção de uma Residência para Combatentes e famílias no Entroncamento e a mesma não ter sido contemplada. Temos um terreno cedido pela Câmara do Entroncamento e o seu empenhado apoio, apresentámos projeto e exigiram-nos os projetos finais que nos custariam cerca de mais 150.000 euros, sem que tivéssemos a certeza de ser contemplados. Comprometemo-nos a entregar imediatamente esses projetos se fossemos contemplados. Temos uma residência no Porto e outra em Estremoz, era importante ter uma no centro onde temos muitos antigos militares e famílias necessitadas.

domingo, 25 de dezembro de 2022

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Habituem-se!

Confesso que hesitei em escrever este artigo. Primeiro, porque compreensivelmente receava a dura prova de ler nada menos do que as 11 páginas da entrevista de António Costa à Visão. Um confronto assim com a temível máquina de palavras que é António Costa ameaçava deixar-me derreado. Em segundo lugar, porque já tanta gente escreveu ou falou da entrevista em questão que a probabilidade de notar algo que tivesse passado previamente despercebido era remota.
E é verdade que os traços mais salientes da entrevista foram quase todos notados. Por exemplo, o seu desprezo manifesto pela oposição, expresso numa linguagem grosseira e primitiva. Assim, a IL é constituída por “queques” que “guincham”, o que os torna “ridículos”, sem conseguirem alçar-se ao “vozeirão popular que o Ventura consegue fazer”. O PSD, pelo seu lado, em estado de desespero, “faz números”. “Guinchos” e “números” são, naturalmente, amplificados pela “bolha mediática”, aliada à “central de produção de soundbites da direita”. Toda esta gente ignora por inteiro os verdadeiros problemas dos portugueses, que intimamente a desprezam e amam Costa. O único problema do Governo que não se reduz a “casos e casinhos” puramente imaginários foi o de Pedro Nuno Santos com o aeroporto, e esse foi resolvido em 24 horas.

Não é que Costa negue a necessidade de uma verdadeira oposição. Nobremente, reconhece que “não há nenhum bom governo que não precise de uma boa oposição”, acrescentando com uma generosidade única: “É muito útil para a democracia”. Grande verdade, grande sabedoria, grande lição. Infelizmente, a oposição, que tanto o deveria saber, ajudada pela “bolha mediática”, ignora-o abissalmente. E com essa atitude, Costa não tem paciência. Mas mesmo nenhuma. Enumera as suas profundas preocupações de estadista e desabafa: “se agora andasse a distrair-me com essas coisas que entretêm os comentadores, meu Deus!”. Tal a sua irritação que menciona o incómodo que a insistência nos “casos e casinhos” causa junto dos seus assessores de imprensa, “que podiam concentrar-se noutros trabalhos e são ocupados a distrair-se com esses assuntos”. Não está bem, de facto. Os assessores de imprensa a preocuparem-se com as histórias de Miguel Alves! Não é justo!

Mas o que o irrita verdadeiramente e provoca a sua indomável cólera é outra coisa: são as “mentiras vis” – “velhacarias”, diria o seu mestre Sócrates – de Carlos Costa no livro de Luís Rosa. Isso põe-no fora de si. E lembra o exemplo do pai e da mãe. Face à turpitude de “criaturas” que revelam em público conversas, “mantenho-me nas regras da educação que os meus pais me deram” – que comportam, sem dúvida, os imperativos de não “guinchar” nem “fazer números”. A família, de resto, ocupa uma elevada presença no pensamento de António Costa. Respondendo a uma pergunta sobre os novos dois irmãos no Governo, que aparentemente violariam a regra imposta desde o tempo do célebre caso das famílias no conselho de ministros, Costa responde (vale a pena citar a resposta por inteiro): “Disse tudo: são duas personalidades com competências reconhecidas. Tenho uma grande vantagem: vejo, pela minha própria família, que não é pelo facto de eu ser o primeiro-ministro e de o meu irmão ser quem é [Ricardo Costa, director de informação da SIC] que deixo de cumprir as minhas funções, e ele também”. Os entrevistadores, Mafalda Anjos e Filipe Luís, aparentemente não levaram a mal que Costa não lhes respondesse à questão que tinham colocado – a colisão com um princípio por ele próprio estabelecido –, já que não insistiram na pergunta, talvez embevecidos com tão notáveis exemplos familiares.

Tudo isto tem a sua importância, embora uma importância relativa. O que, pelo contrário, é verdadeiramente preocupante num primeiro-ministro é outra coisa: a sua manifesta ignorância do que significa “estrutural”. Em três colunas da entrevista, Costa usa a palavra pelo menos 11 vezes. O que significa, sem dúvida, que a aprecia – ou, pelo menos, que ela lhe lembra alguma coisa. Infelizmente, lembra-lhe qualquer coisa de errado, atendendo ao modo como a utiliza.

Senão, vejamos. António Costa começa por distinguir as reformas estruturais que a direita quer das que ele defende. As da direita, presume-se, são vãs e malignas (e, no que têm de bom, como as que permitiriam a melhoria da competitividade da nossa economia, ele fá-las melhor). As dele, pelo contrário, são magníficas e prosseguem, indomáveis, à velocidade da luz.

São elas: “ter reduzido para menos de metade o abandono escolar precoce no nosso País”, “a mudança mais estrutural do País, porque muda tudo”; a mudança estrutural – aliás, uma “revolução estrutural” – obtida, no seguimento “da paixão do engenheiro Guterres pela Educação” e “do programa tecnológico do engenheiro Sócrates”, nos níveis de qualificação do País; a mudança estrutural na “forma como temos finanças públicas sustentáveis e ao mesmo tempo conseguimos aumentar o investimento público”; a “mudança estrutural em curso” na redução da pobreza; o encerramento das centrais de carvão; o aumento de dotação para a Saúde; e a aprovação do estatuto do SNS. “Se isto não são mudanças estruturais, o que são mudanças estruturais?”, pergunta-se.

 

Ora, se entendermos por “estrutural” aquilo que normalmente se entende, isto é, no mínimo, problemático. “Estrutura” significa uma rede interconectada que serve de base a uma série de operações que a partir delas podem ser operadas. É, portanto, algo de que possui uma forte estabilidade que contrasta com a variabilidade relativa daquilo que a partir dela pode ser produzido através de um número indefinido de combinações. É uma versão simplificadora das coisas, é verdade, mas é aqui suficiente. A natureza, as sociedades, as línguas e um sem-número de outras realidades possuem estruturas: definem-se a partir delas. As mutações estruturais, possíveis em algumas dessas realidades – e as sociedades pertencem a esta categoria –, são transformações nessa base, a partir de reformas ou de revoluções, que modificam, em graus variáveis, as combinações possíveis na superfície da estrutura. Não são modificações na superfície: são modificações na base que determinam, mais ou menos univocamente, modificações na superfície.

Como é bom de ver, as “reformas estruturais”, ou “revoluções estruturais”, mencionadas por Costa não são, com a possível excepção do encerramento das centrais de carvão, nada de estrutural. São rearranjos, mais ou menos felizes, mais ou menos credíveis, da superfície. Não quero estar aqui a discutir a felicidade ou infelicidade desses arranjos, a sua credibilidade ou inverosimilhança. Apenas quero dizer que nada têm de estrutural.

Seria pretensioso da minha parte estar aqui a discutir a pertinência do vocabulário de Costa neste ponto particular, não fosse ele revelar a natureza – estrutural, de facto, essa – do modo de relação de António Costa com a linguagem. Como boa e bem rolada máquina de palavras que é, ele é useiro e vezeiro em utilizar as palavras sem relação directa (às vezes, nem sequer indirecta) com o seu significado. É a versão portuguesa do Humpty-Dumpty da Alice: as palavras significam o que eu quero. E não há nada a fazer: ele é assim. Para que deixasse de o ser, seria preciso uma verdadeira revolução estrutural. Suponho que com meras reformas ele não ia lá.

Socialistas europeus expulsaram Eva Kaili. Por cá, o que diriam os "nossos" socialistas?

A eurodeputada Eva Kaili foi detida por suspeita de corrupção, mas isso bastou para socialistas europeus e gregos a expulsarem das suas fileiras.

Por cá diríamos apenas que era a Justiça a funcionar e que a Política tinha de esperar... pelo trânsito em julgado.

O "vosso "Presidente da minha República afirmou:
"Em matéria de corrupção não há meios-termos. Se há matéria a investigar deve-se investigar exemplarmente a todos os níveis, porque senão a corrupção alimenta a corrupção e a impunidade alimenta a impunidade
Agora use a sua memória e compare com o que este “tudólogo” que está Chefe de Estado tem dito (ou silenciado) com o que tem acontecido no meu, e talvez no seu, País.

domingo, 11 de dezembro de 2022

o estado a que isto chegou: "'Embrutecidos' pelo futebol, já aceitamos tudo"

Guerra, cabaz alimentar a subir, 15 horas de filas nas urgências?
Estamos "habituados e dessensibilizados" para o novo normal.
Cheias em Lisboa: "Medina e Moedas são os vencedores da história".

quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Ciganos Século XVII

Bem sei que a esmola, conforme nela foi o intento e caridade, terá seu merecimento. E quem a pudesse dar a todos por amor de Deus faria bem, quando isso não fosse ocasião de pecar, ou de não deixar o pecado, que o sol a todos alumia, porém quem não pode senão limitadamente, parece a deve antes de dar ao digno, que ao indigno, quais são quase todos estes ciganos, ladrões, salteadores, matadores, sem lei, nem temor dela: e elas ladras, feiticeiras, inquietadoras da honestidade das mulheres, e fazendo-as mal parir. Embaidoras que por dois vinténs, ou dois pães, não duvidarão trazer à vossa escrava ou criada a peçonha, e o mesmo solimão para matar seus senhores e enganar a simples donzela com nome de mezinha para o outro casar com ela. E ainda à casada, a título de o marido lhe querer bem, lhe dão com que os coitados vão ao outro mundo fazer a experiência da mezinha, ou ficam para nunca mais prestar. Então a descarga disto é que digam que o marido era um amancebado e andava toda a noite, e que disso morreu assim mal.

E sabe Deus, e suas próprias mulheres o como e azadas, a quantos isto cada dia acontece. E seja verdade que todos somos pecadores, estes o são por ofício e por carta, e dele se mantém. E os que introduziram em Portugal mil feitiçarias e males, que nele não se sabiam. Por onde eu aconselharia a todo o homem que evitasse o falar qualquer coisa sua com esta gente, nem ainda zombando ou com achaque de boa dita, muito mais cautelosamente e com mais rigor que com um ferido de peste, e falo de ciência certa. E é de notar que se um nosso Português vai ser morador em outro Reino, em poucos anos logo fala a língua desse Reino, e seus filhos já nela e em tudo o mais como naturais mesmo da terra. E esta gente com haver tantos centos de anos que Espanha os agasalhou, que quase eles mesmos não sabem de que nação ou reino procedem, porque sendo Gregos que se vieram fugindo dos Turcos, se fazem Egípcios ou Gitanos. E pelo contrário, e sendo Caldeus, como diz Jacobo Filipo Bergomate no seu livro, Supplementum chronicarum, que de certos povos chamados Zíngaros se saíram a encher toda a Europa; porém que nenhuns os consentem mais de três dias, pela subtileza de seus furtos, e que por essa causa os Venezianos, e os terem por suspeitos, os lançaram de todas as suas terras, e que nunca deixaram a sua língua Caldeia, que deve ser a que lhe ouvimos falar, e parece são estes de Portugal. Os quais dos Zíngaros se chamam Ciganos, que é o mesmo. E o não perderem nunca a sua língua, não foi por certo para nela se lerem e usarem dos livros católicos, ou de ciências e artes que trouxessem boas, senão para melhor inteligência de suas más artes, latrocínios, e embelecos, ou enganos, porque usando tudo isto com usam por ofício os não possamos entender. E nós tão cegos e descuidados, que ninguém atenta nisto: falo dos que governam, que o poderão remediar, e vendo-o e palpando-o cada dia e cada hora a nossas portas e dentro de nossas próprias casas passam por isso. E não sei como os conselheiros dos Reis e os que governam as Repúblicas desvelando-se tanto em novas pragmáticas sobre ninharias, não buscam remédio a coisa tão importante como fora não estar Portugal, e Espanha toda, criando em suas entranhas estas lombrigas, ou digo víboras que o estão roendo de contínuo por todas as partes de seu todo. Agasalhando-os Portugal, vindo perseguidos dos Turcos, usam tão mal desse agasalho e benefício.

E pudera isso ter muito bom remédio, embarcando-os divididos para o Brasil e Angola e outras nossas conquistas, e agora para a nova povoação do Maranhão poucos a poucos em cada navio que fosse, e se iriam acabando de sair do reino, ou deles estes mãos costumes: e quando isso não parecesse, fazendo-os viver dentro no meio das cidades repartidos pelo Reino, vedando-lhes o uso do trajo e da linguagem, e o sair fora das cidades e vilas. O que é muito importante e mais essencial é obrigando-os a ofícios com tenda sua, ou obreiros nas alheias. E que não fossem ferreiros, que só usam a fim de fazer gazuas e instrumentos de roubar. E a elas o mesmo a ofícios, ou vender em tendas, ou pelas ruas, e outros exercícios com o que, ou outros remédios, se lhes atalhasse o furtar e outros malefícios. E o pedir esmola que aos pobres se deve necessitados (que há muitos nossos naturais) e não a eles que podem bem com trabalhar remediar sua vida. Pois a verdadeira caridade deve começar por nós mesmos e pelos mais chegados nossos.
(Miguel Leitão de Andrada in «Miscelânea», 1629)
                                                                                

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Marcelo e os Ciganos


Sobre os ciganos

A desinformação chegou a Belém e Marcelo debitou fake news com ar pomposo. 
A Casa Civil está uma lástima e é de temer o pior. (Jose Magalhaes)




sexta-feira, 25 de novembro de 2022

do football ...

 




De Abril a Novembro

Quarenta e sete anos depois, é fazendo as contas ao estado deste país adiado que se deve olhar, lembrar e julgar o 25 de Novembro.
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“O 25 de Abril foi uma revolução corporativa, na origem e no desenrolar das suas fases mais agudas, com incipientes clientes políticos lutando pelo favor dos pretorianos, também sempre condicionados e limitados pela conjuntura exterior, que era a Guerra Fria.


Quem conheceu e viveu a resistência ao PREC não pode deixar de ler a maioria dos relatos oficiais desse período, entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Novembro de 1975, como uma fábula interessada, composta para uso e consagração dos príncipes. E sobre o 25 de Novembro, a narrativa maniqueísta é ainda dominante: desloca protagonismos e chefias, minimiza o pessoal no terreno – as companhias de Comandos convocados – e exalta grandes chefes e cérebros estratégicos. E é sobretudo omissa quanto ao papel das forças sistémicas, internas e externas, no controlo do que poderia ter sido uma viragem na revolução portuguesa, caso tivesse sido politicamente explorada.
Assim, foi um Thermidor em que, em nome da pacificação e da moderação, se congelou o PREC e o seu contrário, iniciando-se a consolidação do regime sob uma ideologia de esquerda antifascista, com uma classe política de centro-esquerda – o Centrão PS-PSD – e uma marginalização das direitas, sempre carregando as culpas do anterior regime.
Quarenta e seis anos depois, é fazendo as contas ao estado deste país adiado que se deve olhar, lembrar e julgar o 25 de Novembro, o esforço e sacrifício dos seus combatentes e o modo como os derradeiros vencedores contaram e contam a História.”
(in “A história dos vencedores” por Jaime Nogueira Pinto)

aleluia! Aleluia!

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

apostolos


01 - Simão

Simão é um apóstolo pouco retratado nos relatos bíblicos, por isso, tudo o que se sabe dele é pura especulação, inclusive a sua morte. Alguns contam que ele havia sido morto em Roma, durante um massacre no ano 70. Outros contam que ele teria morrido após renegar algum deus do Sol. Isso poderia ter sido tanto na Inglaterra quanto na Pérsia (atual Irão).
02 - Judas Tadeu
Depois da morte de Cristo, Judas Tadeu escreveu uma das cartas presentes no Novo Testamento, as chamadas ‘Carta de Judas’. Ele teria seguido a sua missão depois da morte do Mestre e pregado na Mesopotâmia, Arábia, Síria e Pérsia.
Esse último teria sido o local da sua morte, de causas violentas, mas não especificadas.

03 - Mateus
Relatos dão conta de que Mateus teria continuado sua missão no lugar onde viveu com Cristo. O apóstolo teria percorrido toda a Pérsia, Judeia e Etiópia.
A história mais antiga diz que ele morreu na Etiópia de causas naturais. Mas há pelo menos quatro relatos em que ele é assassinado por um rei local: decapitado, afogado, esfaqueado ou queimado.

04 - Filipe
A história da morte de Felipe é confusa. Até hoje não se sabe ao certo como morreu o discípulo que deu continuidade à missão na Ásia, nas regiões de Frígia e Hierápolis.
Há relatos que ele tenha morrido de causas naturais, mas também há estudiosos que acreditam que ele morreu enforcado, apedrejado e até crucificado em Hierápolis.

05 - Tiago Menor
Há dois relatos das causas de morte de Tiago. O primeiro diz que ele foi crucificado, assim como Jesus no Egito no ano de 62. O apóstolo tornou-se missionário na Palestina e no país onde foi morto.
Outra hipótese é que ele teria sido apedrejado até a morte a mando de Ananias, um sumo sacerdote que queria que ele queria denunciasse alguns cristãos.

06 - Tomé
Após a morte de Jesus, o apóstolo que ganhou destaque nos relatos bíblicos por pedir para tocar em Cristo após a sua ressurreição e virou sinônimo de: “ver para crer”, saiu em missão pela Índia.
Morreu no ano 53, perfurado pelas lanças de soldados em Mylapore, na Índia, durante uma de suas orações. Tudo porque ele converteu a esposa do rei Misdaeu, Charisius, que se negou a fazer sexo após virar cristã. Mylapore, quando foi dominada pelos portugueses, passou a se chamar São Tomé de Meliapor

07 - João
João era o discípulo mais jovem que Cristo tinha. Cogita-se que na época da crucificação de Jesus, ele teria entre 17 e 20 anos. Irmão de Tiago (outro apóstolo), o jovem teria sido lançado vivo em óleo fervente a mando do imperador romano Domiciano, mas ele não teria nada sofrido.
Após esse episódio, exilou-se na Ilha de Patmos, na Grécia, em meados do ano 90. De lá se mudou para Efésios, onde morreu de causas naturais por volta dos 100 anos de idade.
08 - Judas Iscariotes
Suicidou-se, arrependido por ter traído Jesus. Ele se enforcou em uma árvore, sobre um penhasco. A corda arrebentou e Judas caiu em cima de pedras afiadas.
É a única morte de um apóstolo que é relatada biblicamente. O relato completo está no Evangelho de Mateus, no capítulo 27 e versículos de 3 a 5.

09 - Pedro
Pedro era o mais velho dos apóstolos e aquele a quem Jesus claramente lhe deu algum tipo de liderança. Após a morte de Cristo, foi Pedro quem conduziu a missão entre os que ficaram.
Vítima da perseguição religiosa de Nero, pediu para ser crucificado de cabeça para baixo por se sentir indigno de morrer como Cristo. Segundo a tradição, o fato se deu no Circo de Nero, onde hoje fica o Vaticano.

10 -  André
André era irmão de Pedro, também pescador. Antes de conhecer a Cristo, ele já era seguidor de João Batista, mas não titubeou quando conheceu o Messias e logo juntou-se a ele.
Morreu suspenso em uma cruz em forma de X, na Grécia. Ele havia se recusado a renegar sua fé diante do procônsul romano Aegeates

11 - 02 - Tiago Maior
O Nome “Maior” era para diferenciar do outro Tiago mais jovem (o Menor). O pescador que tornou-se apóstolo, Tiago Maior, tem a sua morte relatada de fontes mais confiáveis. Ele teria sido morto no ano 44. Ele foi morto em Jerusalém na mesmo ocasião em que Pedro foi preso.
Foi Tiago, o primeiro discípulo a morrer em nome da causa cristã. Séculos depois, ele se tornou patrono da Espanha.
Com a colonização de alguns países da América do Sul pela Espanha, Tiago passou também a ser padroeiro de muitas regiões do Chile (Santiago), Peru, México e outras nações que passaram pelo domínio espanhol.
Morreu ao lado do homem que o delatou ao rei da Judeia, Herodes Agripa. O delator se arrependeu e se converteu na hora H. Ambos foram executados em Jerusalém: decapitados ou perfurados pela espada de um soldado.
Segundo uma tradição lendária, o corpo de Santiago teria sido transportado para a Galiza, e sepultado no lugar de Compostela (depois chamado, em sua honra, Santiago de Compostela).

12 -  Bartolomeu
Bartolomeu teria exercido a sua missão em Anatólia, Etiópia, Armênia, Índia e Mesopotâmia. A forma de sua morte também desperta polêmica e confusão, pois há mais de uma versão para o fato.
Teria morrido na Armênia, mas não se sabe se foi crucificado ou esfolado e decapitado pelo irmão do rei Polymius. O monarca havia sido convertido pelo apóstolo.

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

e o vencedor é...

PS precisa de arrumar a casa e acalmar os nervos. A culpa dos casos e casinhos é do Governo. Costa vai impedir o "aumento injustificado" de 10% das portagens. Mais um truque. E o que vai dar em troca?

domingo, 20 de novembro de 2022

Nagasaki 451 anos depois

O porto da cidade de Nagasáqui, no Japão, fez 451 anos, no dia 20 de Novembro, e para comemorar o feito, o coro masculino daquela cidade cantou o hino nacional português para simbolizar a importância de Portugal na sua história, uma vez que foi o povo português que abriu as portas de Nagasáqui ao mundo, em 1571. 

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

activistas climáticas

As cinco ativistas pelo clima detidas na terça-feira no Ministério da Economia aceitaram esta quarta-feira a suspensão provisória do processo, mediante o compromisso de prestarem trabalho comunitário.
No entanto que estas "ativistas" acham que já prestam trabalho a favor da comunidade ao defenderem a causa climática .
...querem agora concentrar energias nas ações que estão a ser planeadas para a primavera.

terça-feira, 8 de novembro de 2022

eleiçoes intercalares nos EUA

biden, obama, clinton querem salvar a democracia (de esquerda)! ...e o que é que os americanos vão querer!

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Da verdadeira luta de classes em Portugal

Sim, é verdade. Existe uma verdadeira luta de classes em Portugal e estas estão perfeitamente identificadas e diferenciadas. Só que o conflito já não opõe os capitalistas aos proletários até porque estes últimos se encontram dos dois lados da barricada e já não têm, como outrora, interesses comuns. A luta é entre o Estado e os que dele dependem e os contribuintes.
De um lado temos os que vivem à sombra do Estado. Arrumaram-se à mesa do orçamento e exercem o poder sob diversas formas. O Estado serve-lhes de título de legitimidade para explorarem a outra classe, ou seja, os pagantes de impostos, taxas e multas. Mais que nunca é actual a figura do Zé Povinho esmagado por tributos do nosso imortal Rafael Bordalo Pinheiro. O poder exercido pelos que beneficiam dos impostos é imenso e tem diversas formas. Reflecte-se no autoritarismo político do Governo, designadamente se alicerçado numa maioria absoluta, na inépcia dos seus membros na maioria incompetentes e munidos de curricula intrujões, no mais descarado e arrogante nepotismo, no despesismo e na incúria na prestação de serviços públicos tornada possível por um regime que obviamente não responsabiliza os dirigentes de nomeação partidária pelos medíocres resultados obtidos. Assim se premeia a incompetência e se reforça a influência no Estado.

Fica assim claro que de um lado está o Estado, sector político, administrativo e empresarial incluídos, e do outro a grande massa dos cidadãos contribuintes. A ideologia de justificação já não é a religião salvífica nem a «Pátria» como no tempo do Salazar mas o interesse público mediante o qual o Estado quer convencer os cidadãos que a sua contribuição tributária é em prol do bem comum e, em última análise, no próprio interesse deles. O circo mediático totalmente controlado ajuda.

A classe dominante, ou seja, o Estado tem interesses próprios e muito claros; explorar o contribuinte e exercer o poder por intermédio dos seus dirigentes em boa hora nomeados pelas suas inúmeras qualidades cívicas e intelectuais, evidentemente, quais novos sábios platónicos.

Ao chamar a atenção para esta realidade não se pretende denegrir a maioria dos funcionários públicos, entendida em sentido lato, que fazem o que podem e dão exemplos de sincera dedicação à causa pública. Mas o mesmo não se verifica com os dirigentes políticos, com os «empresariais» e com os administrativos. São estes que têm o poder de decisão e este está cada vez mais concentrado. São eles que exercem o poder e dele dispõem como de uma coutada, assaltando os contribuintes sem tréguas e sem quaisquer sinais de contenção em benefício dos seus privilégios de classe, servidos quentinhos através do orçamento e beneficiando de todas as vantagens do poder. Há situações que roçam o crime por omissão. São eles os verdadeiros senhores do nosso país.

Fica assim claro que o Estado é um bolo muito apetecível. É por essa razão que os partidos dominantes o querem conquistar. E mais, querem que o partido se sobreponha ao Estado de modo a transformar o poder estatal em poder partidário. Não custa a compreender. Neste aspecto, ironia do destino, até parece que Marx tinha razão ao dizer que o Estado é um instrumento da luta de classes, só que as classes não são as que Marx pensava.

Claro que os partidos maioritários estão do lado da classe dominante. E mais, são a classe dominante. Atingiu-se até hoje em dia o ponto mais alto na nossa história recente na identificação de um partido político com o Estado. A realidade mexicana mostrou-nos durante décadas as consequências da sobreposição do Estado e do Partido Revolucionário Institucional. Os partidos maioritários são no nosso país um exemplo claro de situacionismo na pior acepção do termo.

Não há alternativas. O PSD está cheio de pressa para fazer o mesmo que faz hoje o PS em nome do tal interesse público. Nada garante que a classe dominante fosse apeada. Só os seus dirigentes é que (em parte) mudariam.

Não tenham ilusões. A modificação desta aviltante situação só se fará com uma profunda alteração da cultura política dominante em prol de uma nova República alicerçada em valores democráticos e liberais, legitimada não apenas pelo sufrágio mas por uma vida democrática muito mais exigente e participativa e, sobretudo, por uma Sociedade Civil forte e independente, coisa em que os actuais partidos dominantes nem querem ouvir falar. É coisa para demorar muito tempo, pelo menos o de uma geração. Até lá continuaremos a assistir ao espectáculo da luta dos partidos dominantes pelo monopólio do chamado interesse público enquanto vão enchendo os bolsos à custa do contribuinte e assegurando uma velhice descansada para os respectivos dirigentes em nome daquele famigerado interesse, evidentemente.  (in Luis Cabral de Moncada in Da verdadeira luta de Classes em Portugal” )


terça-feira, 1 de novembro de 2022

Brasil 2022

O discurso de Jair Bolsonaro nas entrelinhas
No discurso de Bolsonaro não há uma referência a Lula da Silva e a palavra derrota (ou equivalente) não tem espaço nos dois minutos de declaração, mas há uma promessa subentendida: não vai desaparecer
Lula da Silva tem dois meses e pode contratar uma equipa de 50 pessoas para trabalho político e técnico de preparação, um mecanismo para evitar transições bruscas. Bolsonaro vai facilitar-lhe a vida?
São dias de tempestade, política e não só, em Brasília. O silêncio do Presidente deixou o país mergulhado num mar de dúvidas, a que, nos bastidores da Alvorada, os jornalistas iam tentando responder.

 


reconstrução de Lisboa pós terramoto 1755

 


segunda-feira, 31 de outubro de 2022

domingo, 23 de outubro de 2022

Um boneco de Soros na Assembleia da República

Passou algo despercebida a votação de um projecto de resolução levado recentemente à AR mas que tem um certo significado e importância para se perceber como certos lóbis supranacionais penetram no parlamento nacional.
Falo do projecto apresentado pelo Livre para que o governo português tomasse medidas concretas contra o governo de Viktor Orbán com base no incumprimento húngaro do mecanismo de “Estado de Direito” da U.E., um procedimento que foi inventado precisamente para legitimar o corte de fundos e a perseguição aos governos que ousem rejeitar as directivas ideológicas nefastas que são impostas aos europeus através das instituições da U.E.
O propósito final desse mecanismo é retirar o financiamento aos governos refractários, chantageando-os a cederem ou, caso não o façam, potenciar o surgimento de crises internas que levem à sua queda.
Sabemos bem que o suposto incumprimento do mecanismo de “Estado de Direito” por parte do governo húngaro resulta simplesmente da sua recusa em permitir a actuação livre dos lóbis de Soros no país, consentindo a disseminação interna da ideologia de género e aceitando as políticas migratórias que visavam transformar a sua nação numa mixórdia multiétnica similar à que criaram nas nações da europa ocidental.
Ora, não é por acaso que esta proposta tenha sido levada à AR pelo Livre e através do deputado Rui Tavares, como também não é por acaso que o personagem ande há vários anos a ser insistentemente promovido na comunicação social. Sempre esteve ligado a interesses financeiros muito poderosos e com significativa penetração nos Media.
Rui Tavares é um dos políticos portugueses alinhados com as agendas da rede de George Soros. É aliás uma das mais antigas figuras portuguesas ligadas a esse lóbi global.
Foi este Tavares, que as televisões conseguiram meter na AR, que em 2013 escreveu o primeiro relatório do Parlamento Europeu a acusar o governo de Orbán por supostos desrespeitos ao “Estado de direito democrático”. Posteriormente, um outro relatório, na mesma linha argumentativa mas com um foco maior na desobediência húngara à política de acolhimento de “refugiados” da U.E., foi apresentado em 2018, por mais uma das figuras “amigas” de Soros e membro da mesma bancada parlamentar de Rui Tavares (Greens – European free Alliance), a deputada holandesa Judith Sargentini. Na altura Orbán falou abertamente deste documento, que seguia as linhas do anterior, como sendo elaborado pela rede de actores de Soros no Parlamento Europeu.
As fundações do que mais tarde viria a originar o tal “mecanismo” do “Estado de Direito” que agora permitem à U.E. chantagear países como a Hungria ou a Polónia foram lançadas com aqueles relatórios.
A convergência de Rui Tavares com a rede de George Soros é antiga e já conheceu vários episódios. Tavares consta, desde 2015, na lista de membros da Open Democracy, uma das mais importantes ONG’s da Open Society de Soros (e também financiada por lóbis como as Fundações Rockefeller e Ford). Mas já em Fevereiro de 2014, meros 6 meses depois da apresentação do seu relatório no Parlamento Europeu, encontramos intervenções de Tavares publicadas no site da Open Democracy. (1)
Noutro exemplo recordamos que em 2016 o líder do Livre foi eleito membro do Conselho de uma organização transnacional denominada “Europen Alternatives” que era também financiada pela Open Society. (2)(3)
A verdade é que Orbán é o grande espinho que continua atravessado no caminho daqueles
que pretendem destruir a identidade histórica das nações europeias.
Foi o próprio Orbán que melhor o formulou:
“Grandes forças estão de novo em movimento para erradicar as nações da Europa e unificar o continente sob a égide de um império global. A rede Soros, que se tem tecido através da burocracia europeia e da sua elite política, tem vindo a trabalhar há anos para fazer da Europa um continente de imigrantes. Hoje a rede Soros, que promove uma sociedade global aberta e procura abolir os enquadramentos nacionais, é a maior ameaça enfrentada pelos Estados da União Europeia. Os objectivos da rede são óbvios: criar sociedades abertas multiétnicas e multiculturais, acelerando a migração, e desmantelar a tomada de decisões nacionais, colocando-a nas mãos da elite global.”(4)
Os “amigos” de Soros espalhados pelas diferentes assembleias europeias estão a tentar agravar o cerco ao governo húngaro. Foi Soros, a própria voz de comando da Hidra, que deu o mote, numa coluna de opinião onde instava a U.E. a ser lesta e decidida na aplicação de sanções à Hungria (5). As cabeças da Hidra limitam-se agora a fazerem, na medida do que podem, o trabalho complementar nos diversos parlamentos onde operam. É assim que esta proposta do Livre deve ser lida. 
(2) https://partidolivre.pt/.../rui-tavares-eleito-para-o...
(3) https://thesaker.is/george-soros-open-society-foundation.../
(4) https://miniszterelnok.hu/europe-must-not-succumb-to-the.../
(5) https://www.project-syndicate.org/.../europe-must-stand...


quarta-feira, 19 de outubro de 2022

A camioneta-fantasma da I República

19 de Outubro de 1921.
O dia em que acabou a Republica e começou o Estado Novo
um episódio de terror, parecido com aquele terror vermelho que estava a começar a acontecer na Europa".

A ‘camioneta-fantasma’ é a história de uma das revoluções durante a I República. Existia então um governo da direita republicana chefiado por António Granjo que cai perante um movimento revolucionário conjunto da Guarda Republicana e de marinheiros.
O Presidente da República António José de Almeida recusa-se a empossar o Comité Revolucionário e o País fica sem governo. A 19 de Outubro de 1921, Granjo vai para casa e, durante esse dia, começa a ver-se a Guarda Republicana descomandada e descontrolada.
Guardas e marinheiros vagueiam pelas ruas de Lisboa e, à tarde, dirigem-se a casa de António Granjo para o prender. Mas um vizinho de Granjo avisa-o e o ex-chefe de governo refugia-se em casa de um adversário político, Cunha Leal.
Cunha Leal recebe-o, acolhe-o, tenta protegê-lo – mas, à noite, os tais marinheiros vão numa camioneta que sai do Arsenal da Marinha, onde estavam reunidos, com os guardas".
A ‘camioneta-fantasma’ começa por ir buscar António Granjo. Ao ver Granjo, um dos revolucionários grita para os camaradas: "ó rapaziada! Fura-se o gajo já aqui…?". Não furaram.
Cunha Leal vem com ele para o tentar proteger – e são levados até ao Arsenal da Marinha, onde Granjo é violentamente assassinado. Depois de insultado e agredido, é morto a tiro e à baioneta. A mesma camioneta, onde vai o cabo ‘Dente de Ouro’, persegue e assassina alguns dos políticos republicanos conotadas com o sidonismo.
Como é o caso de Machado dos Santos, ex-ministro de Sidónio Pais e fundador da República – mas também de José Carlos da Maia, um dos revolucionários do 5 de Outubro, entre outros. Machado dos Santos, o herói da Rotunda, o líder do 5 de Outubro, acaba por ser morto a tiro, ainda a caminho do Arsenal, no Intendente.
A camioneta-fantasma da I República foi um episódio de terror, parecido com aquele terror vermelho que estava a começar a acontecer na Europa".

sábado, 15 de outubro de 2022

“Mais do mesmo não dará resultados diferentes”

O próximo Orçamento é um Orçamento de incerteza?
É, se considerarmos a conjuntura nacional e internacional.
Não é se olharmos para a sua estrutura.

Quero com isto dizer que é um Orçamento que retoma a linha dos últimos anos, o que significa que vamos certamente acabar 2023 com mais carga fiscal (basta pensar que a atualização dos escalões do IRS não acompanha a inflação o que significará que todos os aumentos salariais que repuserem o poder de compra arriscam-se a ser fiscalmente penalizados) e quase apostava que com menos investimento público do que aquele que se anuncia (foi sempre assim em todos os governos de António Costa).
Sem entrar na discussão das muitas medidas anunciadas, julgo que há em quase todas elas um traço comum: a ligação do complicómetro.
Na minha perspetiva, um bom exemplo disso é o IRC, os descontos no IRC. O governo acredita que pode comandar as opções das empresas e criou mecanismos de redução seletiva do imposto para uma variedade de situações, a mais emblemática de todos a relativa às atualizações salariais. Mas quais atualizações salariais? Um aumento igual para todos os trabalhadores? O aumento da massa salarial? Não é a mesma coisa e, para fazer uma avaliação exaustiva, vai ser preciso a Autoridade Tributária entrar ainda mais dentro da gestão de cada empresa. O mesmo é válido para outros possíveis descontos no IRC a pagar.
Não há aqui novidade, mesmo havendo a novidade do acordo obtido na concertação social, um acordo que apenas foi assinado pelas associações empresariais porque era melhor do que nada. O resto é fogo de vista e isso ficou muito claro quando vimos a Confederação do Comércio a faltar à cerimónia encenada para a propaganda.
Vamos por isso ter mais do mesmo. Do lado positivo, a promessa de controlo das contas públicas, o que se saúda. Do lado negativo, o aumento dos mecanismo de tutela do Estado sobre a sociedade e a economia, com a criação de ainda mais dependentes.
O resultado de mais do mesmo só pode ser o mesmo: um crescimento medíocre pois nunca uma economia semi-dirigida foi uma economia vibrante. (José Manuel Fernandes no Observador)

a descomplicar o OE2023

A MAGIA DAS PALAVRAS
Nas últimas 24 horas ficou claro que o robusto corte de rendimentos que o governo está a empreender nos setores público e privado - a pretexto de travar a inflação e de reduzir o défice e a rácio da dívida - tem dois objetivos de fundo: 1. Retirar valor à parte do trabalho na economia ; 2. Fazer desaparecer despesa fixa das contas do Estado. 
São esses os dois únicos propósitos do acordo apresentado neste domingo com pompa e circunstância. O primeiro passo de um longo número de prestidigitação que se prolongará até 2026. 
O acordo anunciado na Sala dos Espelhos do Palácio Foz constitui a base instrumental do OE que hoje deu entrada na Assembleia da República. Segue-se a liturgia da sua aprovação, num registo de mera formalidade democrática.  
O momento é propício à venda fácil de algumas ilusões. O aumento extraordinário do PIB previsto para este ano (6,5%) - empolado pelo efeito da inflação - fará subir automaticamente o divisor na rácio da dívida. O quociente matemático dessa operação, isto é, a dívida percentual, descerá como num passe de pura magia. A inflação fará minguar a dívida para uns reluzentes 110 % do PIB no final de 2023. É a pomba branca que o governo começa por tirar da cartola.
Porém, o OE que se anuncia passa ao largo de tudo o que seria preciso fazer em termos de medidas económicas de fundo. Eis alguns exemplos mais óbvios:
Para reduzir o “gap” produtivo e de rendimentos com a Europa, Portugal carece como de pão para a boca de um crescimento económico robusto. Sem um aumento decente do PIB não haverá emprego, nem receita fiscal nem uma digna distribuição de rendimentos. Portugal precisa, pois, de um aumento substancial do PIB e do investimento público e privado. E era para ontem.
O governo apresenta no OE/2023 um objetivo de crescimento de apenas 1,3 % (contra os 6,5 % previstos em 2022). Uma quebra brutal, resultado da travagem a fundo da economia. Mesmo que não se lhe queira chamar recessão, por pudor semântico e em obediência à definição clássica: dois trimestres consecutivos de crescimento negativo. Mas que nome se deverá então dar a uma queda de 5,2 % do crescimento do PIB num só ano (de 2022 para 2023) ? OK, para os que não gostam de chamar as coisas pelos devidos nomes, direi que é um ‘flop’. 
Mas devo perguntar: um crescimento (nominal) do PIB de 1,3 % com uma inflação de 4 % prevista pelo governo (há uma previsão de 5,1 % do Conselho de Finanças Públicas), representa um crescimento real de quanto em 2023 ? A calculadora indica: será de menos 2,7.
Em rigor, estamos perante um cenário macroeconómico de crescimento real negativo do PIB em 2023. Embora não se fale nisso nem essa essa evidência tenha sido referida nos quadros do governo. Assim sendo, a que distância estaremos de uma recessão ? 
Não obstante a resposta estar bem à vista, o governo insiste em baixar o défice para 0,9 % em 2023. Num cenário social de enormes carências.- e quando a UE autoriza os 3%. Após um ano (2022) de brutal empobrecimento usar o limite legal seria prudente. Permitiria aumentar os apoios de emergência às famílias e às empresas, e alavancar o investimento público em mais 4 mil milhões € sem beliscar as regras comunitárias. 
Ao teimar em reduzir o défice para 0,9 %, em 2023, o governo asfixia a capacidade de investimento e agrava a penúria de milhões de pessoas - sem que nada a isso obrigue ou o justifique.
Em 2012/13 (era Passos Coelho/Portas) chamou-se "ir além da troika" ao mesmo tipo de políticas erradas que estão a repetir-se pela mão do PS. Sim, é exatamente: adotar políticas de austeridade e ampliá-las a uma dimensão desnecessária. 
Em 2022/23 (era António Costa II) a estratégia de desvalorização fiscal, ou orçamental, é chocantemente idêntica à aplicada pela troika. O neoliberalismo mudou de embalagem e passou a ter um “nome de guerra”diferente. 
Existe uma austeridade ‘de facto’ não assumida pelo PS. Desastrosamente dissimulada no caso das pensões e disfarçada por magros apoios sociais. Essa austeridade agrava o sofrimento dos que foram proletarizados ou empobreceram pela via da brutal desvalorização de salários e pensões em 2022, e ainda, dos aumentos de taxas de juro do BCE.
Para 2023, impõe-se ainda às empresas e à economia um outro módulo de austeridade: um crescimento raquítico (1,3 %) e um défice (0,9 %)  - 70 % abaixo dos 3% exigidos pela autoridade monetária europeia e pelas regras da zona €. 
Hoje, já não se diz "ir além da troika". Arranjou-se uma palavra mais quente e  que a todos consola: "responsabilidade". Amparada numa bengala coxa do jargão técnico-financeiro: “consolidação orçamental”. Expressão que, em bom rigor, significa a consolidação da perda do poder de compra dos milhões de portugueses que vivem de salários ou pensões. O alvo favorito dos neoliberais.

Em tempos não muito distantes, houve um Ronaldo nas Finanças (não sei se se lembram). O estilo de jogo, ficou. O mago das finanças fundou uma religião batizada de "contas certas". O mais importante dos discípulos está à frente do governo. É um mago das palavras certas.

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

“Controlo de danos com ajuda da inflação”

A aversão extrema a mudanças de fundo e reformas é uma marca identitária portuguesa. Por isso, não seria num dos períodos de maior incerteza global em várias décadas que elas iriam aparecer. Na linha do que estes governos nos habituaram, trata-se de gerir o dia a dia, distribuir o mal e o bem pelas aldeias e olhar para as duas últimas linhas das tabelas das contas públicas: o défice e a dívida, porque a tempestade pode estar ao virar da esquina e a memória do descalabro de 2010 e 2011 está bem viva.
O Orçamento do Estado para 2023 dá um pouquinho às famílias — uns pozinhos do IRS e uma atualização dos apoios sociais (com exceção do truque das pensões) em linha com a inflação deste ano. Dá também um pouquinho às empresas — umas mudanças no IRC para tentar impulsionar o aumento de salários. Por fim, fica com uma boa fatia para si — o saldo primário (diferença entre a receita e a despesa antes de juros) é positivo e melhora quase 3500 milhões de euros.
Feitas as contas, as famílias não vão ter reposto o poder de compra perdido ao longo de 2022 e vão, provavelmente, continuar a perder salários reais ao longo de 2023 — os funcionários públicos serão os mais penalizados. Todos chegarão ao final do próximo ano mais pobres do que estavam no início de 2022, antes da inflação e dos juros começarem a ir por aí acima. E não será por impacto das medidas do orçamento que as empresas vão aumentar a sua competitividade.
É um orçamento de controlo de danos políticos, económicos e sociais com alguns passes de magia pelo meio. Exemplo? A redução da retenção na fonte de IRS para contribuintes que tenham crédito à habitação não é uma descida do imposto. O que as famílias descontarem a menos ao longo de 2023 vão pagar em 2024 quando fizerem o acerto de contas anual após a entrega da declaração.
Mas o passe de mágica mais eficaz chama-se inflação. Pode parecer um paradoxo, mas enquanto é a origem de muitos apertos para as famílias, a inflação é também um consolidador orçamental como poucos. À conta dela, as receitas fiscais continuam a subir a bom ritmo. E sem ela, o milagre da dívida pública com que Fernando Medina fez questão de arrancar a conferência de imprensa não existiria. Não fosse um crescimento nominal do PIB insuflado com uma inflação próxima dos dois dígitos e a dívida pública não faria o favor de cair acentuadamente para os 115% do PIB em 2022 e para os 110% do PIB no próximo ano.
A ilusão monetária provoca danos sociais mas, como se vê, continua a ser uma boa amiga de governos que precisam de praticar políticas restritivas sem o aborrecimento de terem que o dizer olhos nos olhos aos cidadãos. O Orçamento do Estado para 2023 continua a beneficiar dessa ilusão. (Paulo Ferreira no Observador)

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

“O orçamento #vaificartudobem”

A realidade tem pouco de animador. A inflação sobe impiedosamente, baixando o poder de compra das famílias. As Euribor aumentam continuamente e podem duplicar, pressionando os orçamentos familiares. Os custos energéticos crescem até se tornarem incomportáveis, o gás natural mantém-se próximo dos preços recordes e o preço do petróleo volta a subir. O Euro desvalorizou aceleradamente face ao dólar e vale agora menos do que a moeda americana. A imprevisibilidade reina no plano internacional, seja com o prolongar indefinido da guerra na Ucrânia, seja com a instabilidade nos sectores financeiros europeus (p.ex. Crédit Suisse). Ou seja, é razoável dizer-se que o horizonte anuncia tempos difíceis, marcados por elevada incerteza e cintos apertados.
A resposta política a esta realidade foi anunciada em triunfo pelo governo. Hoje, e desde os últimos dois dias, a divulgação das medidas-chave do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023) foi preparada para soar como uma enumeração de boas notícias, sob o coro de aplausos pelo acordo com os parceiros sociais. A inflação está elevada? Sim, mas vai baixar. Há perda de poder de compra? Sim, mas o salário mínimo aumenta e os funcionários públicos têm atualizações salariais (que, nos salários mais baixos, acompanham a inflação). Quem vive dos apoios sociais terá a vida ainda mais difícil? Sim, mas a atualização do IAS chegou aos 8%, acima da inflação prevista. Os custos energéticos batem recordes? Sim, mas haverá descontos nos combustíveis e 3 mil milhões de euros destinados a reduzir as faturas da electricidade e do gás. Os juros sobem? Sim, mas os juros serão dedutíveis no IRS. Os custos com a habitação poderão tornar-se incomportáveis para muitas famílias? Sim, mas as rendas terão um tecto máximo de aumento (2%), em vez dos 5,4% previstos por via da inflação. Os pensionistas ficam a perder com as medidas do governo? Sim (por mais que o PS diga que não), mas hoje começou a ser paga a meia-pensão que lhes foi prometida.

Tradução: perante um momento de crise e elevada pressão sobre as famílias, o governo fez aquilo que faz melhor: reforçou a dependência das pessoas no Estado, protegendo os seus principais grupos eleitorais — os menos qualificados e com rendimentos mais baixos, os funcionários públicos e os pensionistas. E, no outro lado da equação, ficou muito aquém nos apoios e alívios fiscais às empresas. O enredo soa-lhe familiar? Pois — já nos anos da pandemia foi assim: carregando nos anúncios, o governo vendeu a ilusão do #vaificartudobem. Ora, não ficou tudo bem. E, por mais que agora o governo anuncie milhões para as famílias, não há futuros risonhos como a economia estagnada e as famílias dependentes do Estado. (Alexandre Homem Cristo no Observador)

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

“Consolida, Fernando, consolida”

Está aí o primeiro Orçamento-do-PS. Os primeiros oito (7+1, com o suplementar) foram negociados com os parceiros de geringonça e o nono (o primeiro de Medina) ainda era um orçamento foice-foi-se: foice, porque mantinha algumas propostas do PCP; e foi-se, porque na altura foi-se o Leão, o ministro, mas ficaram as ideias. Agora é diferente: é um orçamento 100% PS.
Bloco de Esquerda, PCP e derivados (o derivado comunista, o PEV; e o derivado sem lactose, o PAN) foram trocados por conversas com os parceiros sociais. Com todos excepto o ausente do costume: o derivado sindical comunista, a CGTP. O PS pode agora ser ele próprio e, nesse caso, preferiu privilegiar as negociações com patrões e com os sindicatos que aceitam sentar-se com os patrões.
Se é certo que com o Ronaldo do Eurogrupo (a.k.a. Mário Centeno) já existia o mantra das contas certas, com a maioria absoluta expressões como “devolução de rendimentos” foram trocadas por outras como “consolidação orçamental” — que Costa utilizou na primeira reação a este Orçamento e em maio, no tal primeiro de Medina.
No PS ‘geringonço’, expressões como “consolidação orçamental” eram proibidas, por soarem a FMI, troika e a Passos Coelho. O Costa candidato a primeiro-ministro dizia, na apresentação da Agenda para a Década em 2014, que a consolidação orçamental era um “instrumento” e que não era estratégica para o país.
O mundo mudou, o PS e Costa também. Com maioria, o PS de Costa prefere uma redefinição da sua identidade, como partido de centro, bom aluno europeu na sua plenitude, que conversa com as empresas e com responsabilidade orçamental. É um PS mais medinista do que pedrunonista. O novo Orçamento comprova-o. E já nem o jargão austeritário é escondido, mesmo que o PS continue a negar que há uma austeridade mais ou menos direta na vida dos portugueses por via da inflação.
Mais do que as “famílias primeiro” (que muitas vezes é mais um truque, como nas pensões), ou um grande alívio fiscal da classe média (votos só são precisos em 2024), a grande preocupação do OE é manter o rigor orçamental, a sustentabilidade da segurança social e a redução da dívida pública. É um PS que está mais confortável a sentar-se com o PSD para discutir o novo aeroporto, do que com o BE para falar sobre rendimentos. Um PS que prefere conversar com a CIP em vez de falar com o PCP. Um PS que prefere agradar à Moodys do que a um ‘Manel’, votante de classe média.
O PS já cativava, agora também consolida. É um PS que cria uma grande incompatibilidade, sem necessidade de pareceres externos: com os velhos parceiros da esquerda parlamentar. (Rui Pedro Antunes no Observador)

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

O caso Pedro Nuno Santos

Para os espíritos inocentes que ainda tivessem dúvidas, o caso Pedro Nuno Santos mostrou,
de forma clara e irrefutável, que este Governo de maioria absoluta de António Costa acredita, com todas as suas forças, que a propaganda é mais poderosa do que a realidade. Para responder à notícia do Observador sobre o facto de uma empresa de Pedro Nuno Santos e do pai ter feito um contrato público com o Estado, os socialistas usaram uma confusão, uma omissão, uma falsidade, um erro e uma artimanha. Utilizando esses cinco recursos da baixa política, o Governo tentou criar um nevoeiro suficientemente espesso para permitir ao ministro ganhar o número de dias suficiente para que esta polémica seja, eventualmente, consumida por outra polémica, ou por outro caso, ou por outra notícia. Esta maioria absoluta entende que, para sobreviver politicamente, só precisa de negar a realidade o tempo que for necessário para o país desistir, por cansaço ou distração.
Tendo em conta a persistente desfaçatez do Governo, talvez seja um serviço ao debate público esclarecer e desmontar esta estratégia anti-polémicas.
A confusão. O que está em causa é muito simples, mesmo que nos queiram convencer que é complicado. Tanto na anterior lei das incompatibilidades como na atual, estão previstas três situações muito diferentes:
Aquela em que um político detém, por si só, mais de 10% de uma empresa — aí, a sociedade não pode celebrar nenhum contrato público;
Aquela em que são apenas os familiares de um político a deter mais de 10% de uma empresa — aí, segundo o parecer da PGR relativo à lei antiga, a sociedade só podia celebrar contratos públicos que não estivessem na dependência do ministro;
Aquela em que o político detém, conjuntamente com um familiar, mais de 10% de uma empresa — aí, tal como na primeira situação, a sociedade não pode celebrar nenhum contrato público, tenha o político em causa 9%, 1% ou 0,1% da empresa.

No caso de Pedro Nuno Santos está em causa a terceira situação: o ministro das Infraestruturas tem 1% da empresa, o seu pai tem 44% e a mãe tem 5%. Não há nenhuma dúvida sobre isto, mas, na primeira resposta à investigação do Observador, antes mesmo da publicação da notícia, o Ministério das Infraestruturas tentou logo lançar a confusão dizendo duas coisas:

Disse que o ministro não tem, por si só, 10% da empresa e que, por isso, não está em causa a primeira situação

            — claro que não está, ninguém afirmou que estava;

E disse que, no caso de empresas detidas apenas por familiares, a contratação pública só estava proibida, segundo o parecer, se fosse feita na dependência do ministro

— o que é verdade, mas não é relevante, porque também não é essa a situação de Pedro Nuno Santos.

Reparem na habilidade: para contornar o primeiro ponto, o ministério refere que o ministro tem uma participação, mas de apenas 1%; para contornar o segundo ponto, esquece a participação de 1% do ministro. Tudo isto para fazer de conta que não sabem que há uma terceira situação prevista na lei

— precisamente aquela que se aplica ao ministro e que o deixa em dificuldades.

A falsidade. Esta confusão tem por objetivo dar credibilidade a uma falsidade: o ministro Pedro Nuno Santos argumenta que um parecer da Procuradoria sobre a lei anterior diz respeito à sua situação e o coloca dentro da legalidade. Nenhuma das duas coisas é verdade. Como o parecer é sobre a situação em que são apenas os familiares de um político a deter mais de 10% de uma empresa, e como no caso do ministro a empresa é detida, “conjuntamente”, por familiares e pelo próprio ministro, então o objeto desse parecer não se aplica ao processo do governante. Ou seja: Pedro Nuno Santos defende-se com um parecer que não o defende.
A omissão.
No dia a seguir à publicação da notícia do Observador, o ministério de Mariana Vieira da Silva veio tentar defender o ministro Pedro Nuno Santos
através de uma nota à comunicação social. Trata-se de um documento oficial da Presidência do Conselho de Ministros — e desafia a credulidade de qualquer pessoa que um papel com o selo do Estado português possa ser escrito de forma tão enganadora.
Naquela nota, comportando-se com um misto de infantilidade e prestidigitação, o Governo, para tentar inocentar Pedro Nuno Santos, só fala em dois dos três impedimentos existentes na lei:
Fala da situação em que um político detém, por si só, mais de 10% de uma empresa;
E fala da situação em que são apenas os familiares de um político a deter mais de 10% de uma empresa.
Já reparou no truque, certo? 
O comunicado oficial omite o terceiro impedimento que consta da lei, precisamente aquele que está em causa com o ministro: omite a situação em que um político e um familiar detêm, “conjuntamente”, mais de 10% de uma empresa. Mariana Vieira da Silva iliba o seu colega Pedro Nuno Santos daquilo que não está em causa e deixa de fora da sua nota à comunicação social a parte da lei que queima o ministro.
O erro.
Além desta omissão, o comunicado da Presidência do Conselho de Ministros tem um erro flagrante. Não é um erro inocente — é um erro que cumpre um propósito. Como vimos, o ministro Pedro Nuno Santos usa em sua defesa um parecer sobre a lei anterior (mesmo que, na realidade, esse parecer não o defenda). Ora, para manter a validade desse parecer, é preciso argumentar que nada mudou.
Por isso, no comunicado da Presidência do Conselho de Ministros escreve-se isto: “Ainda que o parecer tenha sido emitido na vigência da Lei n.ª 64/93, de 26 de agosto, a Lei n.º 52/2019 de 31 de julho, que a substituiu, não alterou as disposições à luz das quais foi emitido o referido parecer do Conselho Consultivo da PGR, que assim mantém plena atualidade”.
Só há um pequeno detalhe: é que a lei nova mudou mesmo. E mudou, precisamente, na situação que é analisada pelo parecer, que é a que diz respeito a empresas detidas exclusivamente por familiares de políticos. A lei anterior dizia isto: “Ficam sujeitas ao mesmo regime [de proibição de contratação pública] as empresas de cujo capital, em igual percentagem, seja titular o seu cônjuge, não separado de pessoas e bens, os seus ascendentes e descendentes em qualquer grau e os colaterais até ao 2.º grau, bem como aquele que com ele viva nas condições do artigo 2020.º do Código Civil”. E a lei atual diz isto: “O regime referido no n.º 2 [de proibição de contratação pública] aplica-se ainda aos seus cônjuges que não se encontrem separados de pessoas e bens, ou a pessoa com quem vivam em união de facto, em relação aos procedimentos de contratação pública desencadeados pela pessoa coletiva de cujos órgãos o cônjuge ou unido de facto seja titular.” Ou seja: ao contrário do que diz o Governo, a lei mudou — e mudou muito
Por um lado, reduziu o número de familiares abrangidos pela proibição de contratação pública. Por outro lado, instituiu na lei que essa proibição apenas vigora para contratos que estejam na esfera de influência do ministro. Mas vou repetir: isso só se aplica quando está em causa uma empresa detida apenas por familiares — não é isso que acontece no caso Pedro Nuno Santos.
A artimanha. Aliás, a lei mudou tanto que até é mais favorável a uma empresa que fosse detida apenas pelo pai de Pedro Nuno Santos. Segundo a lei anterior e o parecer da Procuradoria que a interpreta, antigamente uma empresa que fosse só do pai do ministro poderia ganhar qualquer concurso público com apenas uma exceção: esses concursos públicos não podiam ser lançados na esfera de influência do seu filho ministro. Com a nova lei, até essa excepção desaparece para os ascendentes do ministro, ou seja, para o seu pai — mantém-se apenas para “cônjuges que não se encontrem separados de pessoas e bens” ou para “a pessoa com quem viva em união de facto”. Se a nova lei até reduziu o número de impedimentos a que estão sujeitos os políticos e as suas famílias, então porque é que Pedro Nuno Santos prefere usar em sua defesa um parecer da Procuradoria em vez da legislação atual? Simples: porque é mais fácil lançar a confusão com um documento de 38 páginas que poucos irão ler do que com 10 linhas de uma lei que qualquer um pode ler num minuto.

Chegados ao final desta deprimente história, sobra uma dúvida intrigante. Se o Governo tem tanta certeza de que Pedro Nuno Santos não fez nada de mal, porque é que foi à gaveta dos truques políticos buscar uma confusão, uma omissão, uma falsidade, um erro e uma artimanha? Eu tenho um palpite: quando se distorce assim a realidade é porque se tem medo da verdade.