segunda-feira, 31 de outubro de 2022

domingo, 23 de outubro de 2022

Um boneco de Soros na Assembleia da República

Passou algo despercebida a votação de um projecto de resolução levado recentemente à AR mas que tem um certo significado e importância para se perceber como certos lóbis supranacionais penetram no parlamento nacional.
Falo do projecto apresentado pelo Livre para que o governo português tomasse medidas concretas contra o governo de Viktor Orbán com base no incumprimento húngaro do mecanismo de “Estado de Direito” da U.E., um procedimento que foi inventado precisamente para legitimar o corte de fundos e a perseguição aos governos que ousem rejeitar as directivas ideológicas nefastas que são impostas aos europeus através das instituições da U.E.
O propósito final desse mecanismo é retirar o financiamento aos governos refractários, chantageando-os a cederem ou, caso não o façam, potenciar o surgimento de crises internas que levem à sua queda.
Sabemos bem que o suposto incumprimento do mecanismo de “Estado de Direito” por parte do governo húngaro resulta simplesmente da sua recusa em permitir a actuação livre dos lóbis de Soros no país, consentindo a disseminação interna da ideologia de género e aceitando as políticas migratórias que visavam transformar a sua nação numa mixórdia multiétnica similar à que criaram nas nações da europa ocidental.
Ora, não é por acaso que esta proposta tenha sido levada à AR pelo Livre e através do deputado Rui Tavares, como também não é por acaso que o personagem ande há vários anos a ser insistentemente promovido na comunicação social. Sempre esteve ligado a interesses financeiros muito poderosos e com significativa penetração nos Media.
Rui Tavares é um dos políticos portugueses alinhados com as agendas da rede de George Soros. É aliás uma das mais antigas figuras portuguesas ligadas a esse lóbi global.
Foi este Tavares, que as televisões conseguiram meter na AR, que em 2013 escreveu o primeiro relatório do Parlamento Europeu a acusar o governo de Orbán por supostos desrespeitos ao “Estado de direito democrático”. Posteriormente, um outro relatório, na mesma linha argumentativa mas com um foco maior na desobediência húngara à política de acolhimento de “refugiados” da U.E., foi apresentado em 2018, por mais uma das figuras “amigas” de Soros e membro da mesma bancada parlamentar de Rui Tavares (Greens – European free Alliance), a deputada holandesa Judith Sargentini. Na altura Orbán falou abertamente deste documento, que seguia as linhas do anterior, como sendo elaborado pela rede de actores de Soros no Parlamento Europeu.
As fundações do que mais tarde viria a originar o tal “mecanismo” do “Estado de Direito” que agora permitem à U.E. chantagear países como a Hungria ou a Polónia foram lançadas com aqueles relatórios.
A convergência de Rui Tavares com a rede de George Soros é antiga e já conheceu vários episódios. Tavares consta, desde 2015, na lista de membros da Open Democracy, uma das mais importantes ONG’s da Open Society de Soros (e também financiada por lóbis como as Fundações Rockefeller e Ford). Mas já em Fevereiro de 2014, meros 6 meses depois da apresentação do seu relatório no Parlamento Europeu, encontramos intervenções de Tavares publicadas no site da Open Democracy. (1)
Noutro exemplo recordamos que em 2016 o líder do Livre foi eleito membro do Conselho de uma organização transnacional denominada “Europen Alternatives” que era também financiada pela Open Society. (2)(3)
A verdade é que Orbán é o grande espinho que continua atravessado no caminho daqueles
que pretendem destruir a identidade histórica das nações europeias.
Foi o próprio Orbán que melhor o formulou:
“Grandes forças estão de novo em movimento para erradicar as nações da Europa e unificar o continente sob a égide de um império global. A rede Soros, que se tem tecido através da burocracia europeia e da sua elite política, tem vindo a trabalhar há anos para fazer da Europa um continente de imigrantes. Hoje a rede Soros, que promove uma sociedade global aberta e procura abolir os enquadramentos nacionais, é a maior ameaça enfrentada pelos Estados da União Europeia. Os objectivos da rede são óbvios: criar sociedades abertas multiétnicas e multiculturais, acelerando a migração, e desmantelar a tomada de decisões nacionais, colocando-a nas mãos da elite global.”(4)
Os “amigos” de Soros espalhados pelas diferentes assembleias europeias estão a tentar agravar o cerco ao governo húngaro. Foi Soros, a própria voz de comando da Hidra, que deu o mote, numa coluna de opinião onde instava a U.E. a ser lesta e decidida na aplicação de sanções à Hungria (5). As cabeças da Hidra limitam-se agora a fazerem, na medida do que podem, o trabalho complementar nos diversos parlamentos onde operam. É assim que esta proposta do Livre deve ser lida. 
(2) https://partidolivre.pt/.../rui-tavares-eleito-para-o...
(3) https://thesaker.is/george-soros-open-society-foundation.../
(4) https://miniszterelnok.hu/europe-must-not-succumb-to-the.../
(5) https://www.project-syndicate.org/.../europe-must-stand...


quarta-feira, 19 de outubro de 2022

A camioneta-fantasma da I República

19 de Outubro de 1921.
O dia em que acabou a Republica e começou o Estado Novo
um episódio de terror, parecido com aquele terror vermelho que estava a começar a acontecer na Europa".

A ‘camioneta-fantasma’ é a história de uma das revoluções durante a I República. Existia então um governo da direita republicana chefiado por António Granjo que cai perante um movimento revolucionário conjunto da Guarda Republicana e de marinheiros.
O Presidente da República António José de Almeida recusa-se a empossar o Comité Revolucionário e o País fica sem governo. A 19 de Outubro de 1921, Granjo vai para casa e, durante esse dia, começa a ver-se a Guarda Republicana descomandada e descontrolada.
Guardas e marinheiros vagueiam pelas ruas de Lisboa e, à tarde, dirigem-se a casa de António Granjo para o prender. Mas um vizinho de Granjo avisa-o e o ex-chefe de governo refugia-se em casa de um adversário político, Cunha Leal.
Cunha Leal recebe-o, acolhe-o, tenta protegê-lo – mas, à noite, os tais marinheiros vão numa camioneta que sai do Arsenal da Marinha, onde estavam reunidos, com os guardas".
A ‘camioneta-fantasma’ começa por ir buscar António Granjo. Ao ver Granjo, um dos revolucionários grita para os camaradas: "ó rapaziada! Fura-se o gajo já aqui…?". Não furaram.
Cunha Leal vem com ele para o tentar proteger – e são levados até ao Arsenal da Marinha, onde Granjo é violentamente assassinado. Depois de insultado e agredido, é morto a tiro e à baioneta. A mesma camioneta, onde vai o cabo ‘Dente de Ouro’, persegue e assassina alguns dos políticos republicanos conotadas com o sidonismo.
Como é o caso de Machado dos Santos, ex-ministro de Sidónio Pais e fundador da República – mas também de José Carlos da Maia, um dos revolucionários do 5 de Outubro, entre outros. Machado dos Santos, o herói da Rotunda, o líder do 5 de Outubro, acaba por ser morto a tiro, ainda a caminho do Arsenal, no Intendente.
A camioneta-fantasma da I República foi um episódio de terror, parecido com aquele terror vermelho que estava a começar a acontecer na Europa".

sábado, 15 de outubro de 2022

“Mais do mesmo não dará resultados diferentes”

O próximo Orçamento é um Orçamento de incerteza?
É, se considerarmos a conjuntura nacional e internacional.
Não é se olharmos para a sua estrutura.

Quero com isto dizer que é um Orçamento que retoma a linha dos últimos anos, o que significa que vamos certamente acabar 2023 com mais carga fiscal (basta pensar que a atualização dos escalões do IRS não acompanha a inflação o que significará que todos os aumentos salariais que repuserem o poder de compra arriscam-se a ser fiscalmente penalizados) e quase apostava que com menos investimento público do que aquele que se anuncia (foi sempre assim em todos os governos de António Costa).
Sem entrar na discussão das muitas medidas anunciadas, julgo que há em quase todas elas um traço comum: a ligação do complicómetro.
Na minha perspetiva, um bom exemplo disso é o IRC, os descontos no IRC. O governo acredita que pode comandar as opções das empresas e criou mecanismos de redução seletiva do imposto para uma variedade de situações, a mais emblemática de todos a relativa às atualizações salariais. Mas quais atualizações salariais? Um aumento igual para todos os trabalhadores? O aumento da massa salarial? Não é a mesma coisa e, para fazer uma avaliação exaustiva, vai ser preciso a Autoridade Tributária entrar ainda mais dentro da gestão de cada empresa. O mesmo é válido para outros possíveis descontos no IRC a pagar.
Não há aqui novidade, mesmo havendo a novidade do acordo obtido na concertação social, um acordo que apenas foi assinado pelas associações empresariais porque era melhor do que nada. O resto é fogo de vista e isso ficou muito claro quando vimos a Confederação do Comércio a faltar à cerimónia encenada para a propaganda.
Vamos por isso ter mais do mesmo. Do lado positivo, a promessa de controlo das contas públicas, o que se saúda. Do lado negativo, o aumento dos mecanismo de tutela do Estado sobre a sociedade e a economia, com a criação de ainda mais dependentes.
O resultado de mais do mesmo só pode ser o mesmo: um crescimento medíocre pois nunca uma economia semi-dirigida foi uma economia vibrante. (José Manuel Fernandes no Observador)

a descomplicar o OE2023

A MAGIA DAS PALAVRAS
Nas últimas 24 horas ficou claro que o robusto corte de rendimentos que o governo está a empreender nos setores público e privado - a pretexto de travar a inflação e de reduzir o défice e a rácio da dívida - tem dois objetivos de fundo: 1. Retirar valor à parte do trabalho na economia ; 2. Fazer desaparecer despesa fixa das contas do Estado. 
São esses os dois únicos propósitos do acordo apresentado neste domingo com pompa e circunstância. O primeiro passo de um longo número de prestidigitação que se prolongará até 2026. 
O acordo anunciado na Sala dos Espelhos do Palácio Foz constitui a base instrumental do OE que hoje deu entrada na Assembleia da República. Segue-se a liturgia da sua aprovação, num registo de mera formalidade democrática.  
O momento é propício à venda fácil de algumas ilusões. O aumento extraordinário do PIB previsto para este ano (6,5%) - empolado pelo efeito da inflação - fará subir automaticamente o divisor na rácio da dívida. O quociente matemático dessa operação, isto é, a dívida percentual, descerá como num passe de pura magia. A inflação fará minguar a dívida para uns reluzentes 110 % do PIB no final de 2023. É a pomba branca que o governo começa por tirar da cartola.
Porém, o OE que se anuncia passa ao largo de tudo o que seria preciso fazer em termos de medidas económicas de fundo. Eis alguns exemplos mais óbvios:
Para reduzir o “gap” produtivo e de rendimentos com a Europa, Portugal carece como de pão para a boca de um crescimento económico robusto. Sem um aumento decente do PIB não haverá emprego, nem receita fiscal nem uma digna distribuição de rendimentos. Portugal precisa, pois, de um aumento substancial do PIB e do investimento público e privado. E era para ontem.
O governo apresenta no OE/2023 um objetivo de crescimento de apenas 1,3 % (contra os 6,5 % previstos em 2022). Uma quebra brutal, resultado da travagem a fundo da economia. Mesmo que não se lhe queira chamar recessão, por pudor semântico e em obediência à definição clássica: dois trimestres consecutivos de crescimento negativo. Mas que nome se deverá então dar a uma queda de 5,2 % do crescimento do PIB num só ano (de 2022 para 2023) ? OK, para os que não gostam de chamar as coisas pelos devidos nomes, direi que é um ‘flop’. 
Mas devo perguntar: um crescimento (nominal) do PIB de 1,3 % com uma inflação de 4 % prevista pelo governo (há uma previsão de 5,1 % do Conselho de Finanças Públicas), representa um crescimento real de quanto em 2023 ? A calculadora indica: será de menos 2,7.
Em rigor, estamos perante um cenário macroeconómico de crescimento real negativo do PIB em 2023. Embora não se fale nisso nem essa essa evidência tenha sido referida nos quadros do governo. Assim sendo, a que distância estaremos de uma recessão ? 
Não obstante a resposta estar bem à vista, o governo insiste em baixar o défice para 0,9 % em 2023. Num cenário social de enormes carências.- e quando a UE autoriza os 3%. Após um ano (2022) de brutal empobrecimento usar o limite legal seria prudente. Permitiria aumentar os apoios de emergência às famílias e às empresas, e alavancar o investimento público em mais 4 mil milhões € sem beliscar as regras comunitárias. 
Ao teimar em reduzir o défice para 0,9 %, em 2023, o governo asfixia a capacidade de investimento e agrava a penúria de milhões de pessoas - sem que nada a isso obrigue ou o justifique.
Em 2012/13 (era Passos Coelho/Portas) chamou-se "ir além da troika" ao mesmo tipo de políticas erradas que estão a repetir-se pela mão do PS. Sim, é exatamente: adotar políticas de austeridade e ampliá-las a uma dimensão desnecessária. 
Em 2022/23 (era António Costa II) a estratégia de desvalorização fiscal, ou orçamental, é chocantemente idêntica à aplicada pela troika. O neoliberalismo mudou de embalagem e passou a ter um “nome de guerra”diferente. 
Existe uma austeridade ‘de facto’ não assumida pelo PS. Desastrosamente dissimulada no caso das pensões e disfarçada por magros apoios sociais. Essa austeridade agrava o sofrimento dos que foram proletarizados ou empobreceram pela via da brutal desvalorização de salários e pensões em 2022, e ainda, dos aumentos de taxas de juro do BCE.
Para 2023, impõe-se ainda às empresas e à economia um outro módulo de austeridade: um crescimento raquítico (1,3 %) e um défice (0,9 %)  - 70 % abaixo dos 3% exigidos pela autoridade monetária europeia e pelas regras da zona €. 
Hoje, já não se diz "ir além da troika". Arranjou-se uma palavra mais quente e  que a todos consola: "responsabilidade". Amparada numa bengala coxa do jargão técnico-financeiro: “consolidação orçamental”. Expressão que, em bom rigor, significa a consolidação da perda do poder de compra dos milhões de portugueses que vivem de salários ou pensões. O alvo favorito dos neoliberais.

Em tempos não muito distantes, houve um Ronaldo nas Finanças (não sei se se lembram). O estilo de jogo, ficou. O mago das finanças fundou uma religião batizada de "contas certas". O mais importante dos discípulos está à frente do governo. É um mago das palavras certas.

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

“Controlo de danos com ajuda da inflação”

A aversão extrema a mudanças de fundo e reformas é uma marca identitária portuguesa. Por isso, não seria num dos períodos de maior incerteza global em várias décadas que elas iriam aparecer. Na linha do que estes governos nos habituaram, trata-se de gerir o dia a dia, distribuir o mal e o bem pelas aldeias e olhar para as duas últimas linhas das tabelas das contas públicas: o défice e a dívida, porque a tempestade pode estar ao virar da esquina e a memória do descalabro de 2010 e 2011 está bem viva.
O Orçamento do Estado para 2023 dá um pouquinho às famílias — uns pozinhos do IRS e uma atualização dos apoios sociais (com exceção do truque das pensões) em linha com a inflação deste ano. Dá também um pouquinho às empresas — umas mudanças no IRC para tentar impulsionar o aumento de salários. Por fim, fica com uma boa fatia para si — o saldo primário (diferença entre a receita e a despesa antes de juros) é positivo e melhora quase 3500 milhões de euros.
Feitas as contas, as famílias não vão ter reposto o poder de compra perdido ao longo de 2022 e vão, provavelmente, continuar a perder salários reais ao longo de 2023 — os funcionários públicos serão os mais penalizados. Todos chegarão ao final do próximo ano mais pobres do que estavam no início de 2022, antes da inflação e dos juros começarem a ir por aí acima. E não será por impacto das medidas do orçamento que as empresas vão aumentar a sua competitividade.
É um orçamento de controlo de danos políticos, económicos e sociais com alguns passes de magia pelo meio. Exemplo? A redução da retenção na fonte de IRS para contribuintes que tenham crédito à habitação não é uma descida do imposto. O que as famílias descontarem a menos ao longo de 2023 vão pagar em 2024 quando fizerem o acerto de contas anual após a entrega da declaração.
Mas o passe de mágica mais eficaz chama-se inflação. Pode parecer um paradoxo, mas enquanto é a origem de muitos apertos para as famílias, a inflação é também um consolidador orçamental como poucos. À conta dela, as receitas fiscais continuam a subir a bom ritmo. E sem ela, o milagre da dívida pública com que Fernando Medina fez questão de arrancar a conferência de imprensa não existiria. Não fosse um crescimento nominal do PIB insuflado com uma inflação próxima dos dois dígitos e a dívida pública não faria o favor de cair acentuadamente para os 115% do PIB em 2022 e para os 110% do PIB no próximo ano.
A ilusão monetária provoca danos sociais mas, como se vê, continua a ser uma boa amiga de governos que precisam de praticar políticas restritivas sem o aborrecimento de terem que o dizer olhos nos olhos aos cidadãos. O Orçamento do Estado para 2023 continua a beneficiar dessa ilusão. (Paulo Ferreira no Observador)

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

“O orçamento #vaificartudobem”

A realidade tem pouco de animador. A inflação sobe impiedosamente, baixando o poder de compra das famílias. As Euribor aumentam continuamente e podem duplicar, pressionando os orçamentos familiares. Os custos energéticos crescem até se tornarem incomportáveis, o gás natural mantém-se próximo dos preços recordes e o preço do petróleo volta a subir. O Euro desvalorizou aceleradamente face ao dólar e vale agora menos do que a moeda americana. A imprevisibilidade reina no plano internacional, seja com o prolongar indefinido da guerra na Ucrânia, seja com a instabilidade nos sectores financeiros europeus (p.ex. Crédit Suisse). Ou seja, é razoável dizer-se que o horizonte anuncia tempos difíceis, marcados por elevada incerteza e cintos apertados.
A resposta política a esta realidade foi anunciada em triunfo pelo governo. Hoje, e desde os últimos dois dias, a divulgação das medidas-chave do Orçamento do Estado para 2023 (OE2023) foi preparada para soar como uma enumeração de boas notícias, sob o coro de aplausos pelo acordo com os parceiros sociais. A inflação está elevada? Sim, mas vai baixar. Há perda de poder de compra? Sim, mas o salário mínimo aumenta e os funcionários públicos têm atualizações salariais (que, nos salários mais baixos, acompanham a inflação). Quem vive dos apoios sociais terá a vida ainda mais difícil? Sim, mas a atualização do IAS chegou aos 8%, acima da inflação prevista. Os custos energéticos batem recordes? Sim, mas haverá descontos nos combustíveis e 3 mil milhões de euros destinados a reduzir as faturas da electricidade e do gás. Os juros sobem? Sim, mas os juros serão dedutíveis no IRS. Os custos com a habitação poderão tornar-se incomportáveis para muitas famílias? Sim, mas as rendas terão um tecto máximo de aumento (2%), em vez dos 5,4% previstos por via da inflação. Os pensionistas ficam a perder com as medidas do governo? Sim (por mais que o PS diga que não), mas hoje começou a ser paga a meia-pensão que lhes foi prometida.

Tradução: perante um momento de crise e elevada pressão sobre as famílias, o governo fez aquilo que faz melhor: reforçou a dependência das pessoas no Estado, protegendo os seus principais grupos eleitorais — os menos qualificados e com rendimentos mais baixos, os funcionários públicos e os pensionistas. E, no outro lado da equação, ficou muito aquém nos apoios e alívios fiscais às empresas. O enredo soa-lhe familiar? Pois — já nos anos da pandemia foi assim: carregando nos anúncios, o governo vendeu a ilusão do #vaificartudobem. Ora, não ficou tudo bem. E, por mais que agora o governo anuncie milhões para as famílias, não há futuros risonhos como a economia estagnada e as famílias dependentes do Estado. (Alexandre Homem Cristo no Observador)

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

“Consolida, Fernando, consolida”

Está aí o primeiro Orçamento-do-PS. Os primeiros oito (7+1, com o suplementar) foram negociados com os parceiros de geringonça e o nono (o primeiro de Medina) ainda era um orçamento foice-foi-se: foice, porque mantinha algumas propostas do PCP; e foi-se, porque na altura foi-se o Leão, o ministro, mas ficaram as ideias. Agora é diferente: é um orçamento 100% PS.
Bloco de Esquerda, PCP e derivados (o derivado comunista, o PEV; e o derivado sem lactose, o PAN) foram trocados por conversas com os parceiros sociais. Com todos excepto o ausente do costume: o derivado sindical comunista, a CGTP. O PS pode agora ser ele próprio e, nesse caso, preferiu privilegiar as negociações com patrões e com os sindicatos que aceitam sentar-se com os patrões.
Se é certo que com o Ronaldo do Eurogrupo (a.k.a. Mário Centeno) já existia o mantra das contas certas, com a maioria absoluta expressões como “devolução de rendimentos” foram trocadas por outras como “consolidação orçamental” — que Costa utilizou na primeira reação a este Orçamento e em maio, no tal primeiro de Medina.
No PS ‘geringonço’, expressões como “consolidação orçamental” eram proibidas, por soarem a FMI, troika e a Passos Coelho. O Costa candidato a primeiro-ministro dizia, na apresentação da Agenda para a Década em 2014, que a consolidação orçamental era um “instrumento” e que não era estratégica para o país.
O mundo mudou, o PS e Costa também. Com maioria, o PS de Costa prefere uma redefinição da sua identidade, como partido de centro, bom aluno europeu na sua plenitude, que conversa com as empresas e com responsabilidade orçamental. É um PS mais medinista do que pedrunonista. O novo Orçamento comprova-o. E já nem o jargão austeritário é escondido, mesmo que o PS continue a negar que há uma austeridade mais ou menos direta na vida dos portugueses por via da inflação.
Mais do que as “famílias primeiro” (que muitas vezes é mais um truque, como nas pensões), ou um grande alívio fiscal da classe média (votos só são precisos em 2024), a grande preocupação do OE é manter o rigor orçamental, a sustentabilidade da segurança social e a redução da dívida pública. É um PS que está mais confortável a sentar-se com o PSD para discutir o novo aeroporto, do que com o BE para falar sobre rendimentos. Um PS que prefere conversar com a CIP em vez de falar com o PCP. Um PS que prefere agradar à Moodys do que a um ‘Manel’, votante de classe média.
O PS já cativava, agora também consolida. É um PS que cria uma grande incompatibilidade, sem necessidade de pareceres externos: com os velhos parceiros da esquerda parlamentar. (Rui Pedro Antunes no Observador)

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

O caso Pedro Nuno Santos

Para os espíritos inocentes que ainda tivessem dúvidas, o caso Pedro Nuno Santos mostrou,
de forma clara e irrefutável, que este Governo de maioria absoluta de António Costa acredita, com todas as suas forças, que a propaganda é mais poderosa do que a realidade. Para responder à notícia do Observador sobre o facto de uma empresa de Pedro Nuno Santos e do pai ter feito um contrato público com o Estado, os socialistas usaram uma confusão, uma omissão, uma falsidade, um erro e uma artimanha. Utilizando esses cinco recursos da baixa política, o Governo tentou criar um nevoeiro suficientemente espesso para permitir ao ministro ganhar o número de dias suficiente para que esta polémica seja, eventualmente, consumida por outra polémica, ou por outro caso, ou por outra notícia. Esta maioria absoluta entende que, para sobreviver politicamente, só precisa de negar a realidade o tempo que for necessário para o país desistir, por cansaço ou distração.
Tendo em conta a persistente desfaçatez do Governo, talvez seja um serviço ao debate público esclarecer e desmontar esta estratégia anti-polémicas.
A confusão. O que está em causa é muito simples, mesmo que nos queiram convencer que é complicado. Tanto na anterior lei das incompatibilidades como na atual, estão previstas três situações muito diferentes:
Aquela em que um político detém, por si só, mais de 10% de uma empresa — aí, a sociedade não pode celebrar nenhum contrato público;
Aquela em que são apenas os familiares de um político a deter mais de 10% de uma empresa — aí, segundo o parecer da PGR relativo à lei antiga, a sociedade só podia celebrar contratos públicos que não estivessem na dependência do ministro;
Aquela em que o político detém, conjuntamente com um familiar, mais de 10% de uma empresa — aí, tal como na primeira situação, a sociedade não pode celebrar nenhum contrato público, tenha o político em causa 9%, 1% ou 0,1% da empresa.

No caso de Pedro Nuno Santos está em causa a terceira situação: o ministro das Infraestruturas tem 1% da empresa, o seu pai tem 44% e a mãe tem 5%. Não há nenhuma dúvida sobre isto, mas, na primeira resposta à investigação do Observador, antes mesmo da publicação da notícia, o Ministério das Infraestruturas tentou logo lançar a confusão dizendo duas coisas:

Disse que o ministro não tem, por si só, 10% da empresa e que, por isso, não está em causa a primeira situação

            — claro que não está, ninguém afirmou que estava;

E disse que, no caso de empresas detidas apenas por familiares, a contratação pública só estava proibida, segundo o parecer, se fosse feita na dependência do ministro

— o que é verdade, mas não é relevante, porque também não é essa a situação de Pedro Nuno Santos.

Reparem na habilidade: para contornar o primeiro ponto, o ministério refere que o ministro tem uma participação, mas de apenas 1%; para contornar o segundo ponto, esquece a participação de 1% do ministro. Tudo isto para fazer de conta que não sabem que há uma terceira situação prevista na lei

— precisamente aquela que se aplica ao ministro e que o deixa em dificuldades.

A falsidade. Esta confusão tem por objetivo dar credibilidade a uma falsidade: o ministro Pedro Nuno Santos argumenta que um parecer da Procuradoria sobre a lei anterior diz respeito à sua situação e o coloca dentro da legalidade. Nenhuma das duas coisas é verdade. Como o parecer é sobre a situação em que são apenas os familiares de um político a deter mais de 10% de uma empresa, e como no caso do ministro a empresa é detida, “conjuntamente”, por familiares e pelo próprio ministro, então o objeto desse parecer não se aplica ao processo do governante. Ou seja: Pedro Nuno Santos defende-se com um parecer que não o defende.
A omissão.
No dia a seguir à publicação da notícia do Observador, o ministério de Mariana Vieira da Silva veio tentar defender o ministro Pedro Nuno Santos
através de uma nota à comunicação social. Trata-se de um documento oficial da Presidência do Conselho de Ministros — e desafia a credulidade de qualquer pessoa que um papel com o selo do Estado português possa ser escrito de forma tão enganadora.
Naquela nota, comportando-se com um misto de infantilidade e prestidigitação, o Governo, para tentar inocentar Pedro Nuno Santos, só fala em dois dos três impedimentos existentes na lei:
Fala da situação em que um político detém, por si só, mais de 10% de uma empresa;
E fala da situação em que são apenas os familiares de um político a deter mais de 10% de uma empresa.
Já reparou no truque, certo? 
O comunicado oficial omite o terceiro impedimento que consta da lei, precisamente aquele que está em causa com o ministro: omite a situação em que um político e um familiar detêm, “conjuntamente”, mais de 10% de uma empresa. Mariana Vieira da Silva iliba o seu colega Pedro Nuno Santos daquilo que não está em causa e deixa de fora da sua nota à comunicação social a parte da lei que queima o ministro.
O erro.
Além desta omissão, o comunicado da Presidência do Conselho de Ministros tem um erro flagrante. Não é um erro inocente — é um erro que cumpre um propósito. Como vimos, o ministro Pedro Nuno Santos usa em sua defesa um parecer sobre a lei anterior (mesmo que, na realidade, esse parecer não o defenda). Ora, para manter a validade desse parecer, é preciso argumentar que nada mudou.
Por isso, no comunicado da Presidência do Conselho de Ministros escreve-se isto: “Ainda que o parecer tenha sido emitido na vigência da Lei n.ª 64/93, de 26 de agosto, a Lei n.º 52/2019 de 31 de julho, que a substituiu, não alterou as disposições à luz das quais foi emitido o referido parecer do Conselho Consultivo da PGR, que assim mantém plena atualidade”.
Só há um pequeno detalhe: é que a lei nova mudou mesmo. E mudou, precisamente, na situação que é analisada pelo parecer, que é a que diz respeito a empresas detidas exclusivamente por familiares de políticos. A lei anterior dizia isto: “Ficam sujeitas ao mesmo regime [de proibição de contratação pública] as empresas de cujo capital, em igual percentagem, seja titular o seu cônjuge, não separado de pessoas e bens, os seus ascendentes e descendentes em qualquer grau e os colaterais até ao 2.º grau, bem como aquele que com ele viva nas condições do artigo 2020.º do Código Civil”. E a lei atual diz isto: “O regime referido no n.º 2 [de proibição de contratação pública] aplica-se ainda aos seus cônjuges que não se encontrem separados de pessoas e bens, ou a pessoa com quem vivam em união de facto, em relação aos procedimentos de contratação pública desencadeados pela pessoa coletiva de cujos órgãos o cônjuge ou unido de facto seja titular.” Ou seja: ao contrário do que diz o Governo, a lei mudou — e mudou muito
Por um lado, reduziu o número de familiares abrangidos pela proibição de contratação pública. Por outro lado, instituiu na lei que essa proibição apenas vigora para contratos que estejam na esfera de influência do ministro. Mas vou repetir: isso só se aplica quando está em causa uma empresa detida apenas por familiares — não é isso que acontece no caso Pedro Nuno Santos.
A artimanha. Aliás, a lei mudou tanto que até é mais favorável a uma empresa que fosse detida apenas pelo pai de Pedro Nuno Santos. Segundo a lei anterior e o parecer da Procuradoria que a interpreta, antigamente uma empresa que fosse só do pai do ministro poderia ganhar qualquer concurso público com apenas uma exceção: esses concursos públicos não podiam ser lançados na esfera de influência do seu filho ministro. Com a nova lei, até essa excepção desaparece para os ascendentes do ministro, ou seja, para o seu pai — mantém-se apenas para “cônjuges que não se encontrem separados de pessoas e bens” ou para “a pessoa com quem viva em união de facto”. Se a nova lei até reduziu o número de impedimentos a que estão sujeitos os políticos e as suas famílias, então porque é que Pedro Nuno Santos prefere usar em sua defesa um parecer da Procuradoria em vez da legislação atual? Simples: porque é mais fácil lançar a confusão com um documento de 38 páginas que poucos irão ler do que com 10 linhas de uma lei que qualquer um pode ler num minuto.

Chegados ao final desta deprimente história, sobra uma dúvida intrigante. Se o Governo tem tanta certeza de que Pedro Nuno Santos não fez nada de mal, porque é que foi à gaveta dos truques políticos buscar uma confusão, uma omissão, uma falsidade, um erro e uma artimanha? Eu tenho um palpite: quando se distorce assim a realidade é porque se tem medo da verdade.

domingo, 9 de outubro de 2022

como chegar a ministro...

Catarina Sarmento e Castro foi um dos membros do Conselho Consultivo da PGR que votou parecer que Executivo usa como escudo para casos de empresas de familiares. Um mês depois, foi para o Governo.

O Governo concentra as fichas todas da defesa do caso da incompatibilidade do ministro Pedro Nuno Santos num parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR), pedido por António Costa em 2019. O parecer tem uma particularidade: a atual ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, foi um dos membros do Conselho Consultivo que votaram a favor, por unanimidade, neste parecer no dia 19 de setembro e, um mês depois (a 26 de outubro), estava a tomar posse como governante (na altura como secretária de Estado) e a ‘beneficiar’ desta interpretação da lei. Afinal, que parecer é este e o que diz?
O que está na origem do parecer?
No verão de 2019 surgiram vários casos de familiares de ministros que tinham negócios com o Estado: contratos do filho do secretário de Estado da Proteção Civil, José Artur Neves, contratos de empresas do pai de Pedro Nuno Santos e contratos do marido da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem. A discussão pública na altura era se as empresas dos familiares dos governantes podiam fazer contratos com o Estado e se isso devia provocar a sua demissão direta, como está na letra da lei. A tónica estava nos contratos de empresas de familiares e não nas sociedades detidas conjuntamente por titulares de cargos políticos e familiares. António Costa pediu então um parecer à PGR.
Como foi votado o parecer?
O parecer da PGR acabou por ser aprovado por unanimidade e a agora ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, “votou todas as conclusões sem reservas nem declarações”. Catarina Sarmento e Castro estava no Conselho Consultivo do Ministério Público na qualidade de vogal e por ser procuradora-geral adjunta.
A atual ministra da justiça tinha sido juíza do Tribunal Constitucional até abril desse ano, onde estava há nove anos, e tendo sido indicada pelo PS. Escolha essa que também tinha uma trama familiar. A sua eleição para juíza do TC na Assembleia da República chegou a ser chumbada porque na altura o seu pai, Osvaldo Castro (que faleceu em 2013), era o presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais.
O deputado socialista Osvaldo Castro pediu escusa no momento da votação em plenário, mas o nome da filha acabou chumbado. Apesar do acordo de votos entre as lideranças das bancadas de PS e PSD, o voto é secreto e alguns deputados roeram a corda. Foi a primeira vez que um juiz do TC foi chumbado por não ter dois terços dos votos. Mas o PS insistiu no nome em nova votação e, à segunda, Catarina Sarmento Castro foi eleita. Ficaria mais nove anos como juíza no Palácio Ratton, de onde só saiu em abril de 2019.
No mesmo verão Catarina Sarmento passou a procuradora-geral adjunta e membro do Conselho Consultivo da PGR, liderado por Lucília Gago. Foi nessa condição que votou então o parecer, embora não tenha sido a relatora do mesmo.
Os restantes membros do Conselho Consultivo da PGR votaram exatamente como Catarina Sarmento e Castro: Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires (que foi a relatora); João Alberto de Figueiredo Monteiro; Maria de Fátima da Graça Carvalho; Eduardo André Folque da Costa Ferreira; João Eduardo Cura Esteves Mariano; Maria Isabel Fernandes da Costa; e João Conde Correia dos Santos.

Os portugueses

                                                                            Os Reis do Desconcerto. Os portugueses.
Aceitaram placidamente que Pedro Nuno Santos gastasse na TAP mais de 5 mil milhões de euros numa nacionalização que nada, a não ser o capricho ministerial, justificava. Ergueram as sobrancelhas quando o ministro, num dos momentos mais insólitos de um governo em qualquer sítio do mundo, anunciou um novo aeroporto à revelia de toda a gente. Mas acham agora que estão perante um caso grave quando são informados de que uma empresa do pai do ministro fez um contrato público por ajuste directo no valor de 19.110 euros. Os portugueses, porque são eles o sujeito destas constatações, são assim: perdoam e até premeiam políticas que os empobrecem; desculpam opções que nada, a não ser a corrupção, explicam, mas sacam dos princípios quando vislumbram um caso, sobretudo se o caso meter maridos, mulheres, filhos e sobretudo se os montantes envolvidos forem numa escala que entendam, logo, baixos. Os casos, já se sabe, são a ferrugem dos governos, sobretudo daqueles a que nada mais parece afectar. Mas os casos são também a espuma que distrai do maior caso de todos: o mau Governo. (helena matos no Observador)

sábado, 8 de outubro de 2022

Ponte Kerch, ligação entre a Rússia e a Crimeia

A única ponte que liga a Rússia à Crimeia está parcialmente destruída. Há relatos de uma explosão no local e já foram confirmadas três mortes. Nas redes sociais, estão a ser partilhados vídeos onde se vê um comboio de transporte de materiais perigosos em chamas. A estrutura liga a Península da Crimeia à Rússia continental. É uma importante ligação para o abastecimento das tropas russas que estão na Crimeia, anexada pela Rússia em 2014.

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Os novos Lepantos

Lepanto foi a 7 de Outubro de 1571
Não creio que valha muito a pena, na sua celebração, estabelecer retóricas paralelas com a Europa de hoje perante o Islão de hoje. Até porque, hoje, a grande ameaça à civilização não vem de fora, vem de dentro; não vem das armas, vem do irrealismo e do simplismo das ideias que alguns nos querem autocraticamente impor. E vem também da apatia dos que já não defendem nada nem ninguém e da desistência e da falta de comparência dos muitos que, discordando e dissidindo, se calam, se rendem, se conformam. 
São estes os novos Lepantos. Os nossos Lepantos. Os que nos devem convocar para o combate. (in " Lepanto " por Jaime Nogueira Pinto)

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Portugal, oito séculos depois, diz-me qual é agora o teu objectivo?

No inicio a reconquista foi o objectivo seguida da independência. 
Depois tomou lugar a expansão, as descobertas, a consolidação e a globalização.
E agora? 


dos idos tempos do "Minho a Timor"

isto é difícil de entender para os "portugueses de secretaria"
  • Carta recebida pelo adido militar na Embaixada de Portugal em Díli, Cor. Carlos Aguiar. (o português foi ligeiramente corrigido para melhor inteligibilidade do texto)

"EX. EXCELENCIA SENHOR CHEFE DE ACAIT QUE ESTÁ EM DILI TIMOR- LESTE
1. O meu Pai, Marcelino Babo, foi Soldado de Segunda Linha no Ano de 1973 até 1975, ou seja, trabalhou cerca de 3 anos como Soldado de Segunda Linha.
2. O meu Pai Marcelino Babo, em 1975, recebeu ordem de Estado Português no Posto de Lete-Foho para fazer Segurança na Fronteira em Maliana, no Quartel Segunda Linha de Tunu-Bibi.
3. Numa manhã cedinho, mais ou menos às 5 horas, eles fizeram patrulha na Fronteira. De repente apareceram os Tropas da Indonésia de arma na mão. Dali eles voltaram para quartel, arrumaram as coisas deles e fugiram, cada qual seguindo o seu rumo, menos o meu Pai Marcelino Babo que não fugiu ainda, por razão de a Bandeira Nacionalidade Portuguesa ainda esta no ar. Dali ele desceu a Bandeira Nacionalidade Portuguesa, embrulhou muito bem e fugiu para Posto Lete-Foho, e seguiu para casa onde ele morava.
4. Em 1978 os Tropas da Indonésia foram a nossa casa, a fazer inquérito ao meu Pai Marcelino Babo, sobre a sua arma bem como a bandeira, negou que tanto a arma como a Bandeira de Nacionalidade Portuguesa, não estava na mão dele. Por isso os Tropas de Indonésia ficaram furiosos e deram pancadas, coronhadas com arma até meu Pai Marcelino Babo ficar aleijado. O meu Pai Marcelino Babo, entregou então a arma para as Tropas da Indonésia, menos a Bandeira Nacionalidade Portuguesa é que ele não entrega. Com o sofrimento provocado pela agressão, ele veio a morrer no ano de 1982.
5. Antes de o meu Pai Marcelino Babo morrer, o meu Pai ainda me chamou e como eu sou a filha mais velha, o velhote disse para mim: "que essa Bandeira de Nacionalidade Portuguesa, e você como minha filha mais velha, você tem de guardar muito bem, e um dia mais tarde, quando chegar o Dono dessa Bandeira , você tem de entregar outra vez ao Dono. Porque eu sei muito bem que o Dono dessa Bandeira, cedo ou tarde há-de chegar, há-de voltar".

...e a Bandeira Nacional foi entregue na Embaixada de Portugal, pela filha do Marcelino Babo que não quis que a mesma fosse apoderada pelos invasores. Durante esse tempo, ficou escondida em vários locais, servindo de travesseira, colchão ou mesmo enterrada: - O pedido foi cumprido!

sábado, 1 de outubro de 2022

o dia em que acabou a Primeira Republica...

Uma camioneta fantasma batalhava a cidade de Lisboa, naquela que viria a ser uma noite verdadeiramente sangrenta. Numa longa lista de nomes a abater, adivinhava-se o fim da República e escancarava-se a porta para a ditadura militar de 1926.
Em 19 de Outubro de 1921 Lisboa acordou com tiros de mais uma revolução. As tropas da Guarda Nacional Republicana (GNR) começaram cedo a ocupar pontos estratégicos da capital e, na Rotunda, instalaram artilharia pesada e obuses. Concentraram-se aqui 7000 homens.
Após apresentar demissão do seu cargo e de esta ser aceite, Granjo voltou a Lisboa da parte da tarde. Já a cidade estava no poder dos revoltosos e acabou por se refugiar na casa de Cunha Leal, seu amigo e vizinho, Ministro das Finanças.
A que ficou conhecida como camioneta fantasma iniciou a sua tarefa nessa noite sangrenta, começando por transportar António Granjo e Cunha Leal para o Arsenal, junto ao Terreiro do Paço.
Conhecido na história apenas por conduzir a camioneta fantasma, o Dente de Ouro fazia questão de lembrar o papel desdenhoso de José Carlos da Maia, aos que lhe acompanhavam na caixa da camioneta fantasma, instigando o ódio. Carlos da Maia é alvejado. As tropas aplaudem mais este feito da noite sangrenta.
Seriam ainda assassinados o motorista Carlos Gentil, por ter criticado a onda de mortes, e o capitão-de-fragata Carlos Freitas da Silva, aparentemente em substituição do seu antigo chefe, Ricardo Pais Gomes, que estaria em Viseu na noite fatídica.

A camioneta fantasma tinha ainda no trajecto cumprir o atentado contra o aclamado pai da República, António Machado Santos. Interrompidos no caminho por uma avaria na camioneta fantasma, foi fuzilado no Largo do Intendente.
Os revolucionários deixaram ainda às portas da morte o coronel de Cavalaria Carlos Botelho de Vasconcelos.        
Apesar de todo o caos provocado na cidade, cumpria-se o quotidiano na capital, uma vez que esta já era a 25ª revolta da República. Assim, era possível ver as lojas abertas, os elétricos a circular, e os bombeiros, Cruz Vermelha e hospitais, que se tinham organizado para responder às urgências, acabaram por não ser necessários.