quinta-feira, 25 de abril de 2019

25 de Abril: O terror do batalhão em cuecas

Às 5 horas da madrugada do dia 1 de Agosto de 1974 a Frelimo capturou a guarnição de Omar sem disparar um tiro. A 2 de Agosto em Dar-se-Salam a Frelimo começou a ganhar a guerra sem ter sequer necessidade de travar a batalha da negociação: consegue ser reconhecida como interlocutor único no processo de transição para a independência de Moçambique.

...entende-se melhor a forma como a companhia estacionada em Omar explica ter reagido quando, na madrugada do dia 1 de Agosto de 1974, ouviu, provenientes da orla da mata, vozes ampliadas por megafone, dizendo:
“Atenção aquartelamento de Omar, nós não estamos contra vocês, lutamos contra o fascismo e o colonialismo, e esses terminaram no dia 25 de Abril. Queremos falar com vocês. Mandem um mensageiro à pista, pois nós estamos sem armas. Queremos apenas falar convosco, não queremos mais derramamento de sangue.” – recorda José Carlos da Silva e Costa Monteiro, então comandante interino da Base de Omar, no testemunho que deu em Agosto de 2014 ao Jornal dos Combatentes do Ultramar.
Perante esta declaração, explica José Carlos da Silva e Costa Monteiro , um soldado ofereceu-se  para ir à pista como mensageiro: “todo o restante pessoal continuou nas valas e em diversas posições de fogo. Quando o referido mensageiro ia a chegar à pista, novas vozes de megafone se ouviram, pedindo para que o Comandante viesse também à pista. Perante isto, o comandante do aquartelamento, alferes miliciano José Carlos da Silva e Costa Monteiro, acedeu em ir também à pista juntamente com o referido soldado Piedade.
Surgiram então cerca de 8 a 10 indivíduos desarmados, munidos com gravadores portáteis, máquinas de filmar e máquinas fotográficas. Quando o alferes Monteiro se encontrava a falar com o comandante deste pequena força ele repetiu as palavras já ditas pelo megafone e pedia para falar com os soldados da Companhia na pista. Perante esta insistência, o comandante do aquartelamento de Omar alvitrou que poderia entrar e falar com a Companhia dentro do aquartelamento, o que lhe foi contestado, alegando medo de qualquer reacção das nossas tropas ou da força aérea.
Perante isto, e como não se notava qualquer presença de indivíduos armados, foi aceite que parte da Companhia fosse para a pista. Ficaram nas posições as secções de obuses 8,8 morteiros e postos de sentinela.
Quando se encontravam na pista, houve uma força de cerca de 100 indivíduos, que pela porta de armas traseira, que dava saída para a lixeira, entraram de assalto, tomando as nossas posições dentro do quartel. A reacção das secções de obus não era possível, e como tal, a força que entrou obrigou o pessoal das restantes posições a abandonar e sair. No mesmo momento em que a força toma o quartel, há uma outra força emboscada na orla da mata da pista que cerca todo o pessoal que nela se encontrava.
A partir daí não foi possível qualquer reacção.”
Dos 140 homens estacionados em Omar, apenas três conseguem fugir. Os restantes foram aprisionados.
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Mas a captura de Omar estava longe de esgotada como elemento de estratégia política. Enquanto os homens da Companhia de Omar são levados em direcção à Tanzânia, o registo sonoro e fotográfico da sua captura faz também o seu caminho. Material de propaganda da Frelimo sob o título “The battle that was won without a shot” mostra nos dias seguintes fotografias de alguns dos militares capturados. Sob as fotos vem a respectiva identificação, a patente e extensas declarações de apoio desses mesmos militares à Frelimo.
Jornalistas e fotógrafos internacionais são convidados a ir à Tanzânia ver os militares portugueses capturados em Omar. O alferes miliciano José Carlos da Silva e Costa Monteiro declarará anos mais tarde que nem ele nem os seus homens foram maltratados. Confirma que, a meio da viagem entre Moçambique e a Tanzânia, as fardas do exército português que envergavam foram despidas para darem lugar às da Frelimo. Terá sido aliás com essas fardas que desfilaram em Dar-es-Salam em meados de Agosto diante dos chefes da Frelimo que terão convidado vários representantes da imprensa internacional para assistirem a esse momento simbólico da derrota de Portugal.

Os militares capturados em Omar permaneceram na Tanzânia até 19 de Setembro de 1974. Ou seja, até doze dias após Portugal ter celebrado o Acordo de Lusaka, que no seu primeiro ponto estabelece que o Estado Português aceitava transferir progressivamente para a Frelimo os poderes que detinha sobre o território moçambicano.
Nenhum dos militares capturados em Omar foi oficial ou institucionalmente ouvido.
Para descanso de todos os protagonistas, os jornalistas esses fizeram o que se esperava: não se dedicaram a especulações reaccionárias e não escreveram sobre Omar.