domingo, 3 de dezembro de 2017

O Natal ficou sem Menino Jesus e tornou-se a festa do cone iluminado...

De repente no meio da rua lá está aquela tranquitana metalico-luminosa a que chamamos árvore de Natal. E foi perante aquele cone iluminado, artefacto que nos sobrou devidamente expurgado de tudo o que possa identificar aquilo que somos, o que sentimos, o donde vimos, que me dei conta de como em nome da segurança, da tolerância, da saúde e de sei lá mais o quê estamos a criar um mundo faz de conta. Um mundo em que:
A Bela Adormecida ficou sem beijo porque o príncipe foi acusado de abuso.
A Capuchinho Vermelho já não é salva pelo caçador que também deixou de caçar e o lobo ficou vegetariano.
A culpa é alegada.
A fruta não tem bicho.
A humanidade ficou sem sexos e dizem que está perder o interesse pelo sexo.
A má educação tornou-se bullying.
A manteiga ficou magra.
A mentira tornou-se inverdade.
A verdade inconveniente.
As crianças não têm tempo para não fazer nada.
As feiras não têm graça.
As gaiolas ficaram sem grilos.
As natas perderam a gordura.
Chama-se a televisão em vez da polícia.
O artesanato é certificado.
O atirei o pau ao gato ficou sem letra.
O bolo rei já não tem brinde.
O café perdeu a cafeína.
O circo ficou sem leões, depois sem elefantes e agora sem animais.
O iogurte ficou sem lactose.
O leite vem da soja e não das vacas.
O namoro ficou sem palavras por causa do assédio.
O pão não tem glúten.
Os bolos não têm farinha.
Os brinquedos ficaram sem graça mas estão cheios de didatismo.
Os doces ficaram sem açúcar.
Os filhos não têm pai nem mãe mas sim progenitores.
Os maridos e as mulheres passaram a cônjuges.
Os parques infantis ficaram sem escorregas de verdade. E alguns sem baloiços.
Os pátios das escolas já não têm árvores nem terra.
Brincar é uma actividade devidamente monitorizada.
Os filmes não contam histórias, ilustram teses.
As universidades tornaram-se uma liga de costumes.
As coisas deixaram de ser o que são para se tornarem num dado a avaliar consoante o seu enquadramento numa perspectiva condicionada por diversas valências.
Tudo é relativo.
O Natal ficou sem Menino Jesus e tornou-se a festa do cone iluminado.