O Bloco da Esquerda avisou que ia avançar com uma Moção de Censura ao governo e muitos comentadeiros passaram ao entretenimento nacionalento da crítica aos bloqueiros.
Ora bem. Lá pelo final dos anos 50 do Século passado era o tempo em que os putos jogavam à bola, nas ruas de Lisboa sem automóveis. Os miúdos eram todos iguais e as botas cardadas mostravam-no. Mas havia alguns, poucos, mais iguais que os outros e entre estes emergiam ainda uns mais iguais: os das botas sem cardos.
Naquele tempo, aqueles mais iguais que os mais iguais, eram os chamados "ricos", os que além das criadas, de dentro e de fora, eram presenteados com um bem precioso: uma bola de couro. Eram também por isso "os donos da bola".
Os outros eram os putos das "bolas de trapos" feitas de meias, quantas vezes propositadamente esburacadas, que embrulhavam, com elevada tecnologia de manufactura, outras meias, encorpadas com jornais amachucados e mais tarde eram recicladas após uma gloriosa partida (às vezes só meia), em bola de trapos, conjuntamente com o recardar das botas de cabedal no sapateiro remendão.
Quando, no jogo, aparecia um “dono da bola” era a alegria total a acompanhar os gritos e o sonho de se poder jogar como um Espirito Santo ou um dos “Violinos”.
Gooolo! Gritavam uns! Pénalti, “offside”! Berravam os outros! E surgiam umas palmadas, encontrões e alguns mais ou menos inofensivos murros…
Lembrei-me disto porque cavaquinhos e acordeãos me tem enchido os olhos e os ouvidos com os comentários de inoportunidade, quando não traição, da acção politica avançada pela nossa "esquerda chique".
É que, o “dono da bola” quando estava a perder, parava o jogo, agarrava a bola de coiro e, com ela, fugia para o colo da criada gorda que lhe limpava olhos e mazelas. “Os maltrapilhos da bola de trapos são maus”. “Então o menino leva-lhes uma boa bola de couro e eles atrevem-se a ganhar-lhe? ”dizia-lhe a Maria.
Portugal está hoje cheio de “donos da bola”. Só eles, e apenas eles, é que podem jogar, ou porque são o “governo” ou porque são o “maior partido da oposição” e, por isso, não podem deixar que os “maltrapilhos” lhes estraguem o jogo. Mas tal como nos jogos de rua do Século passado, o problema é que os “meninos ricos” da bola de couro não a sabem jogar…
... e estão esquecidos que já não há a gorda "Maria" para lhes limpar os olhos todos e lhes pincelar as mazelas com os novos mercurocromos !