17 DE JUNHO DE 1665
Fogo a 50 metros
Como o general alemão Schomberg nos
salvou, em definitivo, a pele
Na derradeira tentativa que fez para
subjugar Portugal pela força, Filipe IV colocou à frente do seu exército
invasor um dos melhores generais que tinha – o marquês de Caracena. Nesta
última batalha, travada perto de Borba, Schomberg escolheu o terreno de combate
que mais lhe convinha, após efetuar um reconhecimento. Tinha alguma na manga,
claro.
E a surpresa que reservou para
Caracena foi a de lhe colocar a apenas 50 metros de distância seis peças de
artilharia, de quatro e seis libras de calibre (uma libra corresponde a quase
meio quilo). Mas, para o coronel Luís Albuquerque, “o grande segredo, e génio, de
Schomberg está no emprego daquilo a que, modernamente, chamamos ‘armas
combinadas’”. Ou seja, a utilização articulada de infantaria, cavalaria e
artilharia. “Enquanto os espanhóis pensavam em romper o flanco direito
português com um ataque de cavalaria, colocando-a toda no seu flanco esquerdo –
e separando a cavalaria, à esquerda, da infantaria, à direita –, Schomberg
respondeu posicionando a cavalaria intercalada com a infantaria e com as peças
de artilharia pelo meio”, explica o diretor do Museu do Exército. “Foi a ação
conjugada da infantaria e da cavalaria, com o apoio dos fogos de artilharia a
curta distância, que quebrou o ímpeto do ataque espanhol por duas vezes. Mais:
permitiu aos portugueses contra-atacar eficazmente e vencer a batalha.” Não se
julgue, porém, que foi tiro e queda. O confronto prolongou-se por dez horas,
com o envolvimento de grandes efetivos. Do lado espanhol encontravam-se 15 mil
homens de infantaria e 7 500 de cavalaria. O lado português estava, claro, em
inferioridade numérica – 15 mil homens de infantaria e 5 500 de cavalaria.
No palco político, o conde de Castelo
Melhor seria traído pela sua ambição. Em 1666, com 23 anos, Afonso VI casou-se
com Maria Francisca Isabel de Saboia, neta do antigo rei Henrique IV de França
e, portanto, aparentada com o “Rei-Sol” Luís XIV. A união fora negociada por
Castelo Melhor, que perseguia a ideia de, após a derrota de Espanha, ver França
anexar os Países Baixos espanhóis (a Flandres) e reservar a Galiza para
Portugal. No entanto, Afonso VI não conseguiu consumar o ato sexual durante os
15 meses que durou o casamento, deixando o trono sem herdeiro. A rainha
envolveu-se então com o cunhado, D. Pedro, e ambos iniciaram uma conspiração
para destituir D. Afonso VI, através da abertura de um processo sobre a sua
virilidade. Acusado, julgado e condenado pelo “crime” de impotência sexual, D.
Afonso VI seria deportado para Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, nos Açores,
onde ficou preso numa sala de um quartel militar. Depois recambiaram-no para o Continente
e fecharam-no numa outra sala, no Palácio da Vila, em Sintra. Assim “viveu”,
enlouquecido, entre 1667 e 1683, ano em que morreu de uma suposta crise
cardíaca.
Por isso, é mentiroso o frontispício
do Tratado de Paz de Lisboa, assinado a 13 de Fevereiro de 1668, fez agora 350
anos, pelo qual Espanha renuncia, em definitivo, à conquista de Portugal. Ali,
em letras garrafais, lê-se que Afonso VI foi o soberano português que
subscreveu o documento. No interior, a assinatura é a do irmão D. Pedro, na
qualidade de “regente”. Desfecho mais do que previsível: após a morte de Afonso
VI, o irmão conspirador subiu então ao trono, com o nome de D. Pedro II, e
casou-se com a ex-cunhada, Maria Francisca – que foi assim duas vezes rainha de
Portugal. E tudo voltou a ficar bem...