As sondagens falharam, mais uma vez.
Têm falhado em muito lado, apesar de
feitas com as melhores técnicas disponíveis, pelos melhores centros de
investigação.
Não parece ser, no essencial, um
problema das sondagens, embora nos ajude a relativizá-las saudavelmente.
Talvez o desfasamento muito pronunciado
entre as classes dominantes e as pessoas comuns, de tal maneira que as classes
dominantes impõem um discurso politicamente correcto no espaço público, leve as
pessoas comuns a sentirem-se mais seguras calando o que pensam, guardando as
suas verdadeiras opiniões para o segredo das cabines de voto.
A imprensa está do lado das
classes dominantes, preferindo olhar arrogantemente para os sinais de
preocupação das pessoas comuns como atavismos reaccionários a tentar
compreender o mundo à sua volta.
Temos uma jornalista no Público a
propor esquemas estranhos para financiar os jornais que garantam que pode
escrever livremente sem ter de ter leitores,
temos directores de jornais que se
apresentam como generais prussianos de políticos populistas e continuam a
dirigir jornais,
temos jornalistas que mantêm a sua
posição e influência mesmo depois de até eles reconhecerem ter sido
embarretados por aldrabões de feira, apenas porque a vontade de ouvir o que
queriam foi mais forte que a necessidade de cumprir procedimentos básicos de
verificação dos factos.
Não, meus caros jornalistas, o
problema não é o Correio da Manhã ser o jornal que mais vende e o mais lido, o
problema é que, preguiçosamente, preferem dizer que é por ser um jornal
sensacionalista, esquecendo as dezenas de jornais sensacionalistas que faliram.
Por muito que vos doa, o Correio da
Manhã escreve para as pessoas comuns e, no essencial, tem mais factos que
doutrinação, não pretende ser mais que o que é: um jornal que reflecte o mundo
das pessoas comuns que o pagam.
Ao contrário dos jornais de
referência, cheios de cromos supostamente influentes e bem pensantes, todos
falando e escrevendo do mundo das classes dominantes, em circuito fechado. São
os jornalistas que afastam dos holofotes tudo o que sejam as inquietações
politicamente incorrectas dos matarruanos reaccionários que se interrogam sobre
o efeito dos choques de cultura a que assistem todos os dias. Comunidades que
não se compreendem, apesar de viverem no mesmo espaço, questões de
costumes que abalam convicções profundas, ou simplesmente a perplexidade
pela forma e as razões que fazem com que uma miúda que diz disparates colossais
dia sim, dia não, como Mariana Mortágua, tenha um nível de vida com que a
grande maioria das pessoas comuns não pode sequer sonhar, mesmo trabalhando
duramente em actividades produtivas que todos os dias são escrutinadas pelos
seus clientes.
Estão incomodados com o BREXIT, com
a vitória do PP em Espanha, com o resultado as eleições americanas, com o risco
de Le Pen ser a próxima presidente de França, ou mesmo com o facto da PAF ter
ganho as últimas eleições em Portugal?
Também eu, também a mim me incomodam
muitas destas coisas, mas talvez seja altura de pensarem um bocadinho sobre a
vossa responsabilidade na transformação do debate público naquilo que hoje é e
pensarem nos que excluem desse debate em função da vossa visão do mundo.
Não querem experimentar saltar
do mundo das classes dominantes em que se instalaram e voltarem para o mundo
das pessoas comuns de onde vieram? (por Henrique Pereira dos Santos no Corta
Fitas)