Antes do Costa cair, hão-de cair a
economia e a sociedade portuguesas. Não teremos apenas um país com dificuldades
de se financiar. Teremos uma economia mais estagnada e uma sociedade
mais dividida.
De repente, há agitação sobre o
futuro do governo. Por mim, não tentarei adivinhar quando António Costa vai
cair. Inicialmente, muita gente cometeu o erro de esperar uma implosão rápida
da maioria de enjeitados que ele improvisou com o PCP e o BE depois da derrota
eleitoral de 2015. Cada um iria puxar para o seu lado, o PCP e o BE revoltar-se-iam
ao primeiro rigor europeu. Ilusão.
Os sócios da maioria precisavam
todos do governo, e ninguém está a fazer sacrifícios, ao contrário do que
pensam aqueles que levaram a sério as suas objecções à “austeridade” [mas] a
única coisa de que a maioria social-comunista não gostava na “austeridade” era
de Passos Coelho [e, principalmente, de Portas]. De resto, estão condenados a
ficar juntos:
o primeiro a abandonar, carregaria
as culpas pelo fiasco da “unidade de esquerda”. Esta é uma maioria sem portas
de saída.
Quando isso se tornou claro, houve
quem se tivesse virado para Bruxelas, (…). Um dia, a UE ia acabar com isto.
Outra ilusão. (…) Afinal, esta é a mesma UE que aceitou durante anos jogar ao
gato e ao rato com a Grécia, e que o ano passado suportou durante meses o
carnaval do Syriza.
Que há mais?
O presidente da república? Mas Costa
sabe que a lendária “popularidade” presidencial não aguentaria uma semana a uma
daquelas campanhas que a esquerda moveu contra Cavaco Silva.
Quanto à opinião pública, estará
estática até dois minutos antes do fim, e as sondagens nunca nos deixarão ver
nada, a não ser o que cada um quiser. Já foi assim em 2011: a umas semanas das
eleições, ainda Sócrates andava a ultrapassar Passos Coelho.
A conclusão não é animadora:
basicamente, o país vai estourar antes do governo. Não me refiro a um estouro
financeiro: enquanto o BCE impedir os mercados de registar dúvidas e o governo
não romper com a UE, o financiamento será talvez possível, como foi entre 2001
e 2010. …
No fim, não vamos ter apenas um país
com dificuldades de se financiar. Vamos ter uma economia mais estagnada e uma
sociedade mais dividida. Reverter as “reversões” de Costa, voltar a 2015, ou
mesmo a 2011, já não será possível ou suficiente.
O passado terminou.
(Rui Ramos no Observador)