quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Partido CHEGA e André Ventura - Entrevista com o professor universitário Riccardo Marchi (ISCTE)

Enquanto especialista em direita radical portuguesa, Riccardo Marchi, justifica a estratégia de André Ventura — que considera “muito hábil” — com argumentos de eficácia.

Riccardo Marchi, após fazer o seu doutoramento sobre as fações extremas do regime do Estado Novo e de prolongar essa investigação estudando os movimentos na fase de transição democrática, a partir de 1980 a matéria-prima, se não desapareceu completamente, reduziu-se bastante. Com o advento do Chega, surge uma nova direita, populista e com escassa filiação nas direitas tradicionais. Para este professor italiano que vive em Portugal há décadas (a ligação original remonta a 1998, quando fez cá o Erasmus; atualmente está no ISCTE), a oportunidade materializou-se num livro intitulado “A Nova Direita Anti-Sistema — O Caso do Chega” (Edições 70), que já deu origem a uma polémica, com 67 intelectuais a criticarem publicamente a alegada “higienização académica do racismo e do fascismo do Chega” feita por Marchi. 
Para muita gente, André Ventura tornou-se conhecido originalmente como comentador televisivo, especificamente de futebol e enquanto benfiquista. Ao mesmo tempo, escrevia sobre assuntos criminais. Desporto e crime são temas clássicos dos tabloides em todo o mundo. Isso diz-nos alguma coisa sobre uma certa maneira de fazer política? Ele estava interessado na televisão principalmente para se tornar uma figura mediática, para transmitir determinadas ideias. Paralelamente, tentou fazer uma carreira no PSD, mas não acredito que tenha entrado na televisão só para fazer uma carreira política. 
Naqueles anos, entre 2003 e 2016, Ventura começa a operar em várias frentes, e em todas quer ser o melhor: como professor universitário, como escritor de livros, como comentador na televisão, como político... A propósito, acho que lhe caiu bastante mal ser despedido da CMTV. Ele gosta de comunicação. Era uma vertente que não queria largar. O que acha dessa intersecção entre política e futebol, que não se vê noutros países com a mesma intensidade? Com a mesma intensidade, não. Faz parte da cultura política portuguesa. O futebol, o Benfica e o Sporting, as redes de interesses, sempre foram muito fortes em Portugal, mesmo durante o Estado Novo... Isso não pode conduzir a deformações num sistema democrático? Bom, as coisas que me inquietam relativamente ao regime democrático em Portugal são muitas. Por exemplo, o facto de políticos importantes serem os principais comentadores políticos das televisões tem que se lhe diga. Ou um sistema eleitoral que protege os grandes partidos que estão aí desde 1974 e dificulta a entrada de outros no Parlamento. Nas últimas eleições, pela primeira vez, passámos a três deputados únicos, mas na história democrática foi difícil novos desafiadores entrarem. Houve o PRD, mas foi uma coisa rápida, e o Bloco de Esquerda, que conseguiu agregar partidos de esquerda radical que já existiam. Mas o sistema português é muito blindado, devido à lei eleitoral e do modo como são configurados os círculos eleitorais.

https://youtu.be/mwAYG9I1yjI?si=QWOiNkwTIlS1Gfns