“Senhor
João Vieira Pereira. Saberá que, em tempos, o jornalismo foi uma profissão de
gente séria, informada, que informava, culta, que comentava. Hoje, a coberto da
confusão entre liberdade de opinar e a imunidade de insultar, essa profissão
respeitável é degradada por desqualificados, incapazes de terem uma opinião e
discutirem as dos outros, que têm de recorrer ao insulto reles e cobarde para
preencher as colunas que lhes estão reservadas. Quem se julga para se arrogar a
legitimidade de julgar o carácter de quem nem conhece? Como não vale a pena
processá-lo, envio-lhe este SMS para que não tenha a ilusão que lhe admito
julgamentos de carácter, nem tenha dúvidas sobre o que penso a seu respeito.
António Costa”
Num país com uma real
cultura de liberdade,os insultos via SMS que António Costa dirigiu ao
jornalista João Vieira Pereira, director-adjunto do jornal Expresso,
teriam merecido reprovação generalizada e embaraçado o líder socialista. Mas,
como estamos em Portugal e como se trata de António Costa, foi apenas nota de
rodapé durante um feriado. Imagine o que seria se o mesmo tivesse acontecido
nos EUA, no Reino Unido ou em França. Ou, tão simplesmente, o que se diria caso
o autor do SMS fosse Passos Coelho ou Miguel Relvas, em vez de António Costa.
Quando a nossa disponibilidade para condenar ataques à liberdade de imprensa é
selectiva, algo está mal. E é por isso que não é fácil desempatar e decidir o
que é mais grave neste episódio: se o próprio SMS de António Costa ou se o
facto de ninguém se ter realmente importado.
…
É, no entanto,
inquietante que quase toda a gente tenha preferido olhar para o lado,
enterrando o episódio no baú dos fait-divers. Na comunicação social, por
exemplo, o caso despertou apenas breves referências, o que é difícil de
compreender num sector como o jornalístico, que sempre interpretou intimidações
a um dos seus como um ataque generalizado ao jornalismo e à liberdade de
imprensa – nomeadamente quando os ataques vêm de figuras políticas. Mais
incompreensível ainda é a ausência de reacção oficial do Expresso, que optou
por deixar ao seu director-adjunto o ónus de denunciar o caso na sua coluna de
opinião, sem o apoio institucional de uma tomada de posição do jornal. (artigo de Opinião de Alexandre Homem Cristo
no Observador.pt
)