A direita cresce em toda a parte. O fenómeno não parece conjuntural, como se vê em França, e Portugal não é excepção. A esquerda nacional já percebeu e não sabe bem como lidar com a evidência. Para alguns, mais primitivos, é tudo resultado de um punhado de fascistas netos que ainda por aí andam e levam alguns incautos atrás com um discurso de «ódio». Para outros, mais avisados, o fenómeno é mais complexo. É que existem «insatisfeitos» e «descontentes» com a gloriosa vida política nacional e é preciso «compreendê-los» para melhor os combater e neutralizar; andam fora do bom caminho e com algum jeito e paciência lá voltarão ao bom redil. Certa direita alinha também nesta última explicação por simples incapacidade de pensar e colonização ideológica.
As explicações são ambas estúpidas, o que não admira. Uma baseia-se no ódio à direita outra no paternalismo «democrático». Ambas falham o essencial. Saudosistas do antigo regime já não há e os poucos que existiam já estão no cemitério. Querer ressuscitá-los é de tal modo estulto que nem merece um minuto de atenção. Por sua vez, a segunda tese não consegue perceber que não é de descontentamento que se trata nem de insatisfação e que por muito que a esquerda tente, eles não voltam ao redil. O que se passa é profundo demais para a esquerda perceber.
A esquerda portuguesa esquece-se que é portadora de uma visão redentora da sociedade civil ancorada num projecto ideológico totalitário. Na verdade, a esquerda julga-se o sal da terra. A sociedade civil não passa de um rebanho de ignorantes que tem de ser ensinado e cultivado nos doutíssimos dogmas da economia dirigida pelo Estado, da educação estatizada, da igualdade de género, da idolatria homossexual e transsexual, dos subsídios aos que não trabalham nem querem trabalhar, do facilitismo no ensino, do abastardamento da cultura, da menorização dos cidadãos, etc…
Se a esquerda quer perceber porque é que a direita cresce tem de começar por aqui. Tem de começar por se interrogar a si própria em vez de em vão tentar perceber as motivações da direita. Tem de entender os limites e os defeitos da ideologia que transporta e tenta inocular. Tem de começar por perguntar-se se o que defende é razoável e racional. Tem de perceber que os portugueses fazem parte de um povo muito antigo e mais instruído do que a esquerda pensa e que tem boas razões para não confiar no poder do Estado mais a mais se monopolizado por um partido que dele vive e que com ele cresceu. Os portugueses desconfiam da proliferação de políticas públicas de eficácia mais que discutível e que querem conduzir a sociedade civil à custa dela, evidentemente, para becos sem saída. A vitória eleitoral não pode ser o pretexto para mais programas de realizações. A direita não vive do protesto; vive é da incapacidade e do preconceito da esquerda.
A razão de ser da insatisfação dos portugueses é o crescimento exponencial do sector público a gastar o dinheiro deles sem limites e com poucos resultados visíveis, alimentado a impostos esmagadores em benefício de um sector público que se confunde com um partido e que mede a eficiência das políticas públicas pelo reforço do mesmo partido. A monopolização do poder nunca deu bons resultados porque os resultados eleitorais por si sós não fazem a democracia.
Claro está que a democracia política funciona, os tribunais são independentes e os direitos dos cidadãos estão vivos. Mas não é disso que se trata.
O que a direita portuguesa quer é uma democracia política mais transparente, menos partidarizada, uma sociedade civil mais liberta, menos ideologia no ensino e na saúde, mais contratos e menos funcionários públicos numa palavra; mais liberdade e menos Estado. A miragem da terra prometida pelo Estado partidarizado não compensa o preço a pagar.
A esquerda afirma que a direita não tem programa. É falso. Tem mas não é o da esquerda. O programa da direita é simplesmente deixar a sociedade civil entregue a si própria confiada no bem senso e suficientemente liberta para se promover e desenvolver de acordo com critérios há muito testados e que sempre deram bons resultados. Hoje em dia no nosso país defender isto é ser de direita. Mas não; a esquerda julga que tem qualquer coisa a ensinar-nos e que se não alinharmos nos disparates que nos quer impingir é porque somos fascistas e reaccionários. Coitados; um dia alguns deles compreenderão que a sociedade civil portuguesa já existia muito antes deles e existirá muito depois. Concluirão os mais espertos que a sociedade civil é uma realidade muito complexa, diversificada e elaborada e que não cabe dentro dos raciocínios escassos em que a esquerda a quer encerrar.
É por isso que a esquerda portuguesa odeia o pluralismo. Este é um resultado directo do livre desenvolvimento da sociedade civil que é como quem diz, do exercício activo dos direitos individuais dos cidadãos, a começar pela iniciativa privada. Imagine-se as consequências que isto teria para a esquerda nacional; deixava de poder condicionar a economia, o ensino, a saúde e a cultura. Que pesadelo. O seu objectivo é o mesmo de sempre; uma sociedade civil empobrecida, esmagada pelos impostos, condicionada pela dependência, embrutecida pelo ensino partidarizado, educada num falso e estúpido igualitarismo e no culto da irresponsabilidade, cada vez mais longe dos parceiros europeus. Enquanto assim for a esquerda será rainha em Portugal.
O principal rival da esquerda portuguesa é a sociedade civil. E atrás dela está a direita liberal e conservadora que a sempre reconheceu e defendeu. É que a direita, tal como a entendo, não é o resultado da criação de mais um partido político ao lado de outros a querer cavalgar as forças da sociedade civil. É o fruto do livre desenvolvimento desta. É o seu prolongamento natural. O crescimento da direita em Portugal é o da sociedade civil portuguesa.
Luiz Cabral de Moncada
Professor de Direito