Por razões académicas,
embora bolseiro da Fundação Konrad Adenauer, nos anos de 85 a 87,
estive com frequência e em Berlim Ocidental e recordo os Guardas que
atrás do Muro, acompanhavam em especial, os percursos pedestres do lado
ocidental, uns com binóculos, outros com armas apontadas aos transeuntes.
Mesmo sabendo que não iriam disparar nunca me sentia seguro!
A curiosidade de “tuga”
- e os espectáculos de Ópera - levaram-me a fazer várias deslocações
à Berlim Comunista. Ali as “óperas” mudavam quase que quinzenalmente, enquanto
na Berlim Livre estavam meses em cartaz, o que me permitiu ver em duas épocas o
que no ocidente levaria mais de uma dezena de anos.
A sequência das
viagens à Berlim Oriental era sempre a mesma: “Checkpoint Charlie”,
passaporte, troca de, no mínimo, 25 marcos Ocidentais por 25 Orientais,
adaptação nasal ao cheiro do “combustível” dos Trabant, alugar um “táxi ilegal”
porque era mais barato, etc….
Um dia quis conhecer
as estações “fantasmas” do metropolitano onde, em “terra de ninguém”, viviam
aqueles a que por cá chamaríamos de “sem abrigo”. Nunca percebi como é que sobreviviam!
Para tal troquei o “Checkpoint C”
e tomei o Metro para a Estação de Alexanderplatz. Saí, apresentei o
passaporte, troquei os marcos, etc….
(Interessante e
estranha era a troca de condutores do metro: As composições paravam nas
estações do lado comunista, entrava um condutor da Alemanha Oriental, conduzia
a composição uma ou duas estações, parava o comboio e, esperado por militares armados,
saia dando lugar ao condutor da Alemanha Federal que fazia o trajecto em mais
umas estações “ocidentais”, parava na próxima “comunista”, e o
processo ia-se repetindo…
Mas vamos ao que interessa:
Na Praça de Alexandre havia uma
interessante Feira de Brinquedos, na sua maioria de madeira ou de lata, como os
do meu tempo de menino no Portugal dos anos 50.
Perdi algum tempo a visitar a Feira,
comprei um brinquedo e seguí…
No regresso, ao fim da tarde, ia
tomar o Metro na mesma estação quando, quando fui detido. Os guardas da fronteira, soube-o mais
tarde, apenas falavam alemão, língua em que não era, nem sou,
fluente. Fui revistado e despojado dos meus haveres e encerrado num cubículo minúsculo.
Ali passei uma noite.
A meio da manhã, cheio de fome, fui
levado a um Oficial Soviético que falava inglês e, face a minha explicação,
acabámos a tomar um péssimo café e a rir com a situação:
A minha detenção fora
devida a ser considerado “espião industrial”. Isto porque na Feira de Brinquedos tinha
adquirido para oferecer à minha filha um tear de madeira, em miniatura, o
que para os almorávidas era uma inovação tecnológica! Além disso acharam
estranho o elevado número de “visitas” registadas no passaporte…
Não refiro, por vergonha, os “nomes
feios” com que, em altos gritos, o Oficial Soviético brindou, os seus lacaios,
Guardas Alemães Orientais. Alguns gritados em bom inglês para que eu os
entendesse…
…e lá vim directo à Residência
para um reparador banho capitalista!
O tear foi entregue à destinatária,
ainda existe, e, sempre que o olho, lembro-me de que já fui “espião” e desviei
“tecnologia de ponta” da Alemanha comunista…