terça-feira, 22 de julho de 2025

Entender Torre Pacheco

1 Um grupo de jovens de origem magrebina agrediu com inusitada brutalidade um homem de 68 anos de idade em Torre Pacheco, região de Múrcia, no sul de Espanha. Não houve roubo. Nem haverá historial de animosidade entre agredido e agressores. A violência terá tido um só propósito: gravar o ataque e partilhá-lo nas redes sociais.
2 Fartos de estarem fartos, os moradores saíram à rua. Contaram com o apoio da comunidade cigana local. Nas palavras de um membro desta comunidade, o idoso agredido podia ser o pai ou o avô de qualquer residente, donde, perante o sucedido, não há diferenças entre ciganos e payos.
3 Depois então chegou a extrema-direita, que parasitou a batalha campal em curso.
Esta simples cronologia dos factos revela que, ao contrário do que foi noticiado pela comunicação social portuguesa, a realidade é muito mais complexa do que uma ‘caça ao imigrante’ promovida por turbas ultramontanas. Quem veja as nossas televisões, por muito boa vontade que tenha, jamais entenderá o que aconteceu em Torre Pacheco.

Agora afastemos o ruído quotidiano e olhemos para factores estruturais. 
Primeiro, os MENA, acrónimo de menores estrangeiros não acompanhados, um tema recorrente no debate público espanhol.
Falamos de jovens até aos 18 anos que chegam a Espanha sem pais ou tutores legais. São mais de 15.000, todos extracomunitários, a maioria marroquinos (68%) e do sexo masculino (96%). Juntam-se a estes outros tantos que ao atingir a maioridade mantêm a autorização de residência ou adquirem até a nacionalidade espanhola.
Boa parte chegou à costa mediterrânica de Espanha e aos arquipélagos das Baleares e das Canárias. Para que os custos financeiros e materiais do acolhimento não recaiam apenas sobre estas regiões, algumas sob elevada pressão migratória, o governo propôs que fossem distribuídos por todo o território, convocando os vários governos locais para um esforço que deve ser conjunto. Em surdina, outro argumento: a aglomeração destes jovens, muitos sem ocupação, parece favorecer comportamentos delitivos, ou pelo menos incivis.

Fazendo jus a uma longa tradição de xenofobia, os nacionalismos catalão e basco rejeitaram a proposta. Pedro Sánchez, dependente que está da Catalunha e do País Basco para governar, aceitou a falta de solidariedade.
Ou seja, duas das regiões mais ricas de Espanha põem-se fora. Como é fácil de entender, as restantes, entre as quais as mais pobres do país, não ficaram satisfeitas.
A xenofobia explica a postura catalã, mas, sendo justo, os números dão algum conforto ao sectarismo: dados da Dirección General de la Policía do governo autonómico da Catalunha, citados pelo El Mundo, revelam que, em 2024, 83% dos detidos por roubo e 91% dos detidos por furto em Barcelona são estrangeiros. Também aqui, em surdina: os MENA representarão uma fatia importante desta realidade.
Diga-se que a Catalunha é vítima de si própria. A princípios deste século, os nacionalistas da Convergència i Unió empenharam-se em receber imigração não falante de espanhol, em particular do Magrebe. O objectivo era cumprir uma tara identitária: se os imigrantes se aculturassem em língua catalã, sem nunca aprenderem castelhano, não só se avançaria na construção da nação, como, em teoria, se ganharia uma legião de votantes. Correu mal. Por isso, é irónico - e revoltante para o resto de Espanha - que, agora, a Catalunha se desentenda do assunto.
O segundo factor estrutural está nas relações bilaterais entre Madrid e Rabat. Eis o segredo mais mal guardado da política externa espanhola: Marrocos usa a imigração ilegal para pressionar Espanha - e, através desta, a União Europeia.
Viu-se bem em 2021, quando Marrocos abriu a fronteira em Ceuta, instigando a passagem descontrolada de milhares de pessoas, entre as quais muitas crianças, o que criou uma seríssima crise humanitária e diplomática. A razão? Uma represália por Espanha ter prestado cuidados hospitalares a Brahim Ghali, velho líder da Frente Polisário.

Mas Marrocos reservará um papel ainda mais pernicioso à imigração. 
Nas páginas do ABC, Taleb Alisalem, jovem escritor sarauí, defendeu que Espanha não tem problemas com a imigração; o problema está na forma como Marrocos a usa. Segundo Alisalem, Marrocos desenvolveu uma rede de controlo sobre a sua comunidade na Europa: associações culturais, mesquitas e redes de vigilância social e ideológica. O motivo será simples: “Marrocos infiltra a sua agenda usando parte da diáspora como arma de influência.” “Marrocos não imigra; Marrocos expande-se”, afirma. Para que esta projecção de poder externo funcione, há que impedir a integração dos imigrantes.
O escritor insta Espanha a agir: “Não podemos continuar a viver entre a chantagem diplomática e o complexo ideológico. Precisamos de proteger os bairros. Precisamos de monitorizar o que acontece dentro de certas mesquitas. Precisamos de exigir responsabilização. É preciso parar de confundir tolerância com submissão.”
É verdade que Taleb Alisalem é um activista sarauí. Deve ser lido com prudência. Contudo, a experiência dos últimos anos, bem como factos recentes em Torre Pacheco, recomenda que os seus argumentos não sejam descartados como o produto de um delírio faccioso.
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Retratar o sucedido em Múrcia como um combate entre nacionais e estrangeiros favorece duas agendas políticas. Primeiro, a de Sánchez, cujo partido e governo estão imersos em ilegalidades várias e escândalos maiores. A ameaça da extrema-direita é a única bóia disponível para manter o governo à tona e ambicionar um resultado razoável nas próximas legislativas. As esquerdas radical e extrema aplaudem a estratégia. E claro, a nada disto é alheio o facto de Múrcia ser governada pelo Partido Popular, a principal força da oposição.

A segunda agenda beneficiada é a do VOX, a direita radical populista que vê com preocupação eleições no horizonte, já que não cresce de forma significativa nas sondagens. O relato de uma invasão de estrangeiros criminosos galvaniza as bases.
Em resumo, a esquerda e a direita radical apostam que fogo nas ruas dê votos nas urnas.

Por preguiça, ignorância ou militância, a imprensa portuguesa propagou uma versão politizada da realidade. A forma como se noticiou o caso não é fiel aos factos, além de ignorar por completo o contexto político e social que os condiciona.
É um erro pensar que os problemas começam e acabam na extrema-direita. Neste e noutros casos, mesmo que a retiremos da equação, os problemas continuarão todos no mesmo sítio.(Diogo Noivo)

o caso Miguel Arruda, deputado do CHEGA!

Furto de malas. Defesa de deputado do Chega garante inocência e diz que malas apreendidas só tinham "tralha"
José Manuel Castro indicou que o deputado do Chega confirmou que as três malas apreendidas pela PSP eram dele e que tinham roupas e garrafas no seu interior.
(João Paulo Godinho em 22 jan. 2025, 12:44)
O advogado do deputado do Chega Miguel Arruda, que foi constituído arguido por suspeitas de furto qualificado de malas no aeroporto, assegurou a inocência do cliente e frisou esta quarta-feira que a PSP apenas levou “três malas carregadas de tralha” e que continham “roupa e umas garrafas de vinho e rum”.
Em declarações ao Observador, José Manuel Castro frisou que Miguel Arruda “está inocente” e apontou para “uma precipitação dos órgãos de polícia criminal” na diligência de terça-feira. “Houve uma busca em que ele colaborou e levaram três malas. O deputado confirmou que as malas eram dele”, explicou.
Deputado do Chega alvo de buscas e constituído arguido. É suspeito de furtar malas nos tapetes de aeroportos
Miguel Arruda, deputado do Chega eleito pelo círculo dos Açores, é suspeito de vários crimes de furto qualificado. André Ventura assume que partido estará ao lado do levantamento da imunidade.
(João Paulo Godinho e Joana Moreira)
Marcelo (que alertou para a direção executiva do SNS), o BE (que tem um problema laboral) e o Chega (que tem um problema criminal) são o Bom, o Mau e o Vilão.
Dizia o Chega: furto no aeroporto é "duty free"
Longe, mas perto: BE e Chega mordem a língua. O partido de Ventura quer combater o crime, menos quando é praticado em part-time; já o BE diz-se inclusivo, mas não com os próprios trabalhadores.
22 jan. 2025, 09:07

segunda-feira, 21 de julho de 2025

Proposta de Orçamento da UE 2028-2034

A Comissão Europeia apresentou a sua proposta para um orçamento de longo prazo da UE ambicioso e dinâmico, o chamado Quadro Financeiro Plurianual (QFP), que terá uma duração de sete anos, com início em 2028.
Quase 2 biliões de euros, ou 1,26% do rendimento nacional bruto médio da UE entre 2028 e 2034, apoiarão a ambição da Europa de ser independente, segura e próspera ao longo da próxima década.
Os desafios crescentes da Europa em matéria de segurança, defesa, competitividade, migração, energia e resiliência às alterações climáticas exigem uma resposta forte e virada para o futuro. Por conseguinte, a Comissão propôs uma reformulação fundamental do orçamento da UE.
Reforçará significativamente a capacidade da UE para concretizar políticas fundamentais, dar resposta a novas e emergentes prioridades e continuar a apoiar as pessoas, as empresas, os países, as regiões e os parceiros da UE e, acima de tudo, o futuro coletivo da UE.
Principais características do novo orçamento da UE
- maior flexibilidade em todo o orçamento, para que a Europa possa agir e reagir rapidamente quando necessário,
- programas financeiros mais simples, simplificados e harmonizados para facilitar o acesso ao financiamento,
- um orçamento adaptado às necessidades locais, com planos de parceria nacionais e regionais para um impacto específico onde é mais importante,
- um impulso à competitividade para que a Europa garanta cadeias de abastecimento, intensifique a inovação e assuma a liderança no domínio das tecnologias limpas e inteligentes,
- novos recursos próprios equilibrados que proporcionem receitas adequadas às nossas prioridades, minimizando simultaneamente a pressão sobre as finanças públicas nacionais.
O orçamento de longo prazo foi concebido para assegurar que o financiamento da UE é orientado pelas suas prioridades políticas, produzindo resultados que os Estados membros não conseguem alcançar sozinhos. Centra-se nos seguintes aspetos:
- investir nas pessoas, nos países e nas regiões da UE
- promover a educação e os valores democráticos
- impulsionar a prosperidade através da competitividade, da investigação e da inovação
- proteger as pessoas e reforçar a preparação e a resiliência para enfrentar novos desafios
proteger a Europa
- construir parcerias para uma Europa mais forte no mundo
- introduzir novos recursos próprios para corresponder à nossa ambição comum.
A proposta será negociada com o Parlamento Europeu, eleito pelos cidadãos da UE, e com o Conselho da UE, em representação dos países da UE, antes da adoção final. Deverá entrar em vigor em Janeiro de 2028.

Uma falsa memória e a perigosa ignorância histórica!

O incidente ocorrido no inicio do mês no Cacém, durante uma acção de campanha do CHEGA, em que André Ventura foi confrontado por um cidadão africano visivelmente exaltado, é revelador de algo mais profundo do que uma simples altercação verbal. O discurso inflamado deste homem – acusando os portugueses de terem ido a África apenas para “roubar ouro, diamantes e escravizar” – não brota do acaso. É fruto de uma narrativa histórica simplificada, enviesada e, sobretudo, perigosa.
Não está em causa a liberdade de opinião ou de protesto. O problema reside na origem e na disseminação desta visão unilateral e moralista da História. A ideia de que África era um paraíso intocado antes da chegada dos europeus, e de que os portugueses inauguraram a violência, a escravidão ou o saque, é profundamente errada — mas, infelizmente, ensinada e difundida por muitos com responsabilidades educativas e culturais. A ignorância não é desculpa quando se transforma em arma.
A velha tradição ocidental, desde os gregos, lembra-nos que o ser humano não nasce bom por natureza. A virtude adquire-se — e educa-se. É precisamente essa a função civilizadora da escola e da cultura: formar o espírito crítico, combater os mitos ideológicos e não substituir a realidade histórica por fábulas sentimentais. Mas nas nossas escolas, demasiadas vezes, inculca-se nos alunos a ideia da inigualável perversidade do “homem branco”, como se este fosse um predador universal e o resto do mundo um inocente Éden.

O ensino da História, tanto cá como em muitas ex-provincias ultramarinas, tem sido colonizado por uma visão marxista ou racialista da realidade, que reduz séculos de interacção, troca, conflito e civilização a uma caricatura de opressores e oprimidos. África, antes dos portugueses, conhecia a guerra, a escravatura e o comércio de pessoas. Negar isso é não só falso, mas desonesto.
Portugal teve, sim, uma presença controversa e imperfeita em África — como qualquer império. Mas foi também um dos poucos que deixou estruturas, escolas, línguas e pontes humanas e culturais. É legítimo criticar o passado. É legítimo exigir justiça. Mas não é legítimo usar uma ignorância grosseira e militante como forma de atacar os portugueses de hoje por actos que não cometeram, ou insultar os seus representantes eleitos num espaço público.
Este tipo de episódios deve servir de alerta. Não só para o risco crescente de tensões identitárias num país que sempre prezou pela convivência, mas sobretudo para a urgência de restaurar um ensino da História baseado em factos, não em ressentimentos.
Se o homem do incidente foi mal ensinado em África, não é culpa nossa. Mas se há jovens em Portugal a pensar o mesmo, aí sim, a responsabilidade é nossa. 
E a factura pode ser alta...

domingo, 20 de julho de 2025

Mariana Leitão (IL) Confesso que gostei!

Uma liderança com clareza e propósito
Mariana Leitão traçou uma linha clara e firme entre o que considera a direita do caos e o liberalismo moderno. Ao afirmar que “o Chega é um novo socialismo à direita” – coletivista, estatista e paternalista – Mariana promoveu uma distinção fundamental: o liberalismo que ela defende protege a liberdade individual sem ceder ao populismo da Direita actual (AD incluída). O seu discurso assertivo dá, ou quer dar, ao eleitorado liberal uma identidade forte e coerente no tabuleiro político atual.
Coragem no discurso e compromisso com reformar
Mariana não se limitou a denunciar, foi além: prometeu um partido “mais ideológico e até radical”, assinalando que a IL deverá ser a “consciência liberal” do sistema político. A coragem de assumir esse compromisso – em contraposição ao imobilismo que critica – reforça o apelo de renovação e ambição que muitos liberais procuram.
Foco nas autarquias como laboratório do liberalismo
Ao afirmar que “nas autarquias se pode provar que uma gestão liberal faz a diferença”, Leitão demonstra visão estratégica e realismo político. Apostar em resultados práticos no terreno, em vez de meras ideias abstractas, é ao mesmo tempo ambicioso e pragmático.
Coerência ideológica sem renunciar a alianças
Mariana Leitão reforçou que, seja em coligações ou sozinha, a IL não diluirá a sua exigência liberal: "a exigência liberal nunca entra em silêncio – entra para mudar". Este equilíbrio entre convicção e realismo político transmite um forte sentido de integridade, sem fechar as portas ao diálogo.

A intervenção de Mariana Leitão foi uma brisa fresca no verão quente do panorama político português: foi clara, combativa e, acima de tudo, coerente com os valores que propõe. Ao erguer barreiras firmes contra populismos de direita (e de esquerda), ao mesmo tempo que reforça o compromisso com reformas concretas e com gestão liberal local, A nova líder da IL transmite sobriedade e ambição.

Destaco-lhe o estilo de quem quer uma política liberal menos comodista, mais radical – no sentido da liberdade – e orientada para resultados reais.
Contudo faltou-lhe a resposta às duas perguntas essenciais de Carlos Guimarães Pinto:
- Porque é difícil haver um partido verdadeiramente liberal em Portugal.
- Se defendem a igualdade de oportunidades, porque é que os liberais falam tão pouco de desigualdade económica?

sexta-feira, 18 de julho de 2025

Struggling to Stay Afloat: The Portuguese Left’s Metaphorical Drowning in 2025

In Observador, political analysts Rui Ramos and João Marques de Almeida paint a stark metaphorical picture of Portugal’s mainstream left and far-left: both are like swimmers in a pool on the verge of drowning, frantically splashing about in a desperate bid to avoid sinking. This imagery encapsulates their analyses of the Socialist Party (PS) and the radical left parties (PCP and BE), suggesting that both factions are fighting against a tide of political change that threatens to engulf them.
The Socialist Party’s Desperate Tread Water Tactics
Rui Ramos’s analysis of the center-left Partido Socialista (PS) argues that the ruling party is struggling to stay afloat by narrowing the national political debate to one issue: whether the center-right will ally with Chega, a far-right populist party. According to Ramos, the PS harps on the specter of an understanding with Chega as a distraction, an attempt to grab a life preserver amid turbulent waters. This tactic conveniently diverts attention from what Ramos describes as a “grande viragem” (major turnaround) in the country’s mood and the outright failure and rejection of left-wing policies by the public. In essence, rather than addressing the broad discontent with its governance, the PS is flailing by pointing at the far-right – a move likened to a swimmer obsessing over a distant threat instead of confronting their immediate struggle to keep their head above water.
The Radical Left’s Disconnect and Decline
Similarly, João Marques de Almeida’s commentary on the far-left parties – principally the Partido Comunista Português (PCP) and the Bloco de Esquerda (BE) – describes a political camp in danger of going under. He contends that these radical left groups have ceased speaking to the majority of Portuguese people, choosing instead to talk only to their own ideological circle and to focus on “winning” debates in television studios. This insular approach is portrayed as desperate thrashing: the PCP and BE appear more concerned with scoring rhetorical points among themselves than with understanding or addressing the real concerns of ordinary citizens. In Marques de Almeida’s view, the far-left has essentially given up on comprehending the Portuguese electorate, a fatal mistake that leaves them politically adrift and gasping for relevance. Their ideological echo chamber acts like an enclosed pool – safe in appearance, yet cut off from the ocean of voter sentiment where they are steadily losing buoyancy.
A Left on the Brink of Political Drowning
Both analyses converge on a sobering conclusion: Portugal’s left and far-left in 2025 are barely keeping their heads above water. The PS is clinging to the strategy of demonizing a far-right alliance as a last resort to stay afloat, while the radical left flounders by ignoring the public and retreating into insular debates. This shared metaphor of a pool-side near-drowning underscores the academics’ agreement that the left’s traditional tactics and narratives are failing. In academic terms, the metaphor highlights a crisis of political adaptation – a failure to swim with the changing currents of public opinion. By wholeheartedly supporting the assessments of Ramos and Marques de Almeida, we acknowledge that unless the left finds a way to reconnect with voters and address the country’s real “waters” of discontent, it risks sinking beneath the waves of Portugal’s shifting political tides.
Sources: Rui Ramos, Observador (18 Jul. 2025); João Marques de Almeida, Observador (18 Jul. 2025)

A Esquerda Que Se Afoga na Piscina da História

Ao lermos as análises de Rui Ramos e de João Marques de Almeida sobre a actual situação do Partido Socialista e da extrema-esquerda em Portugal, torna-se quase inevitável a metáfora que ambos sugerem — a de uma esquerda desesperada, lançada à água, debatendo-se para não afundar. Mas não porque a maré esteja especialmente forte. Afunda-se porque já não sabe nadar no tempo em que vive.
Rui Ramos, com a sua habitual precisão histórica, retrata o PS como um partido que, tendo perdido o rumo e a ligação ao país real, já só sabe fazer política de sobrevivência — não com ideias, mas com jogos parlamentares. Como um náufrago, tenta agarrar-se a qualquer bóia que encontre: ora ao Livre, ora ao Bloco de Esquerda, ora a uma suposta “defesa da democracia” contra os perigos que projecta no CHEGA. Mas quem observa de fora percebe o desespero: o PS de 2025 já não nada, apenas se debate. E quanto mais se agita, mais se afunda na irrelevância de um passado que não quer largar. Como nota Rui Ramos, se o país estivesse verdadeiramente nas mãos do PS, estaríamos de facto em piores lençóis. 
João Marques de Almeida, por sua vez, foca-se na extrema-esquerda — essa que já nem se lembra de sair da piscina. Insiste em slogans vazios, em causas que não mobilizam mais do que uma minoria ruidosa e urbana, e ignora o essencial: as pessoas comuns deixaram de a ouvir porque deixaram de a compreender. Ou melhor, porque perceberam que ela deixou de as representar. O autor descreve uma esquerda radical que fala sozinha, sem consciência de que a água lhe sobe até ao pescoço, sem perceber que o seu discurso é uma linguagem morta para quem procura segurança, trabalho e dignidade.

Ambas as análises convergem na constatação de que a esquerda portuguesa — tanto a dita moderada como a radical — está prisioneira de um tempo político ultrapassado. Incapaz de renovar ideias, alianças ou lideranças, mergulha cada vez mais fundo no vazio político e moral. Como um nadador que já não sabe qual a margem da piscina, debatem-se, agarram-se uns aos outros, e acabam por arrastar-se mutuamente.
Entretanto, cá fora, o país observa. Muitos já abandonaram as bancadas da velha piscina partidária. Alguns procuram novas margens. Outros, simplesmente, seguem em frente, conscientes de que não vale a pena tentar salvar quem insiste em não querer ser salvo — porque prefere a fidelidade a dogmas caducos à coragem de enfrentar o mundo como ele é.

O afogamento não é apenas uma metáfora do presente. É, cada vez mais, o destino inevitável de quem insiste em nadar contra o sentido da História.

quinta-feira, 17 de julho de 2025

Lucia

 



Teu FALO

Um menhir
Descomunal e intrépido
Teu falo!
Ereto, direto ao “assunto”
Só de pensá-lo me besunto…
Descomunal e ereto
Teu falo!
Sei bem do que falo…

Lucibei@poems
Lúcia Ribeiro
In “ Muita Poesia e Pouca Prosa”

domingo, 13 de julho de 2025

O CHEGA: Muito para além da caricatura de liberais e social-fascistas

O Partido CHEGA veio provocar uma grave perturbação nas cabeças que apenas conseguem pensar em aritmética binária — 0 ou 1, sim ou não — e não concebem a existência de um terceiro dígito, um terceiro vector político, que poderíamos chamar de “nim” ou “talvez”.

Na realidade, o partido de André Ventura veio romper com a estrutura conservadora da alternância a dois, entre PSD e PS, expondo os limites de um sistema político que se tornou viciado na rotatividade e incapaz de responder a exigências de renovação real.
O CHEGA é de Direita Conservadora nas políticas de identidade, mas assume posições socialistas ou social-democratas em muitas matérias económicas. Se aplicarmos o verdadeiro sentido da expressão social-democracia segundo a ciência política — e não o uso adulterado a que estamos habituados — encontraremos no CHEGA muitas propostas que recordam a encíclica "Das Coisas Novas", texto fundador da doutrina social da Igreja.
A emergência do CHEGA representa, pois, não uma simples cópia da direita populista europeia, mas uma originalidade portuguesa com traços distintos. O país percebeu esta novidade e confiou nela, mas os “influencers” e os influenciáveis — em muitos casos profundamente ligados às estruturas montadas após a revolução de Abril — continuam presos à velha grelha de leitura ideológica, onde tudo deve caber entre o bem e o mal, entre fascistas e democratas, entre esquerda “progressista” e direita “reacionária”.
Este novo realinhamento político e cultural está em marcha e, embora a comunicação social tradicional o tente caricaturar, a clarificação está em curso. Aos poucos, vai-se percebendo que o CHEGA força os restantes partidos a posicionarem-se de modo mais honesto: o PS como partido social-democrata da Segunda Internacional; o PSD como partido democrata cristão, hoje perdido entre a nostalgia cavaquista e a hesitação liberal.

Mas vejamos exemplos concretos da componente social do CHEGA, frequentemente ignorada ou deturpada:
- Propõe um salário mínimo superior ao do PS;
- Recomenda um aumento da carga fiscal sobre a banca, algo que aproxima as suas propostas às do BE e do PCP;
- Apresenta uma proposta de aumento de pensões mais ambiciosa do que a dos socialistas, tendo-se mesmo abstido na votação parlamentar para permitir a sua aprovação.
Ou seja, a “direita radical” que muitos se apressam a demonizar apresenta em certas áreas, propostas que estão à esquerda do PS.

Tal como sucede em vários países europeus, também em Portugal a clivagem não é entre “extrema-direita” e “direita moderada”, mas sim entre quem quer manter o regime tal como está e quem quer verdadeiramente mudá-lo — com voz, identidade e autoridade política.